|Síria

São tendências?

Num cenário político internacional com intervenções contraditórias, distinguir uma linha dominante, uma tendência uniforme, raramente é concretizável. A Síria e a Coreia são de análise obrigatória.

A guerra de agressão à Síria provocou centenas de milhares de mortos e milhões de deslocados e refugiados
Créditosobservadoresxxi

Nas últimas semanas não param de intervir diferentes actores, com influências diversificadas, por vezes contraditórias, nos cenários políticos internacionais, dificultando a identificação de uma linha dominante futura, uma tendência uniforme, aspecto frequentemente desejado por analistas mas raramente verificáveis na realidade.

A confrontação entre diferentes sectores da administração norte-americana e a tentativa do impeachment de Trump por Obama e sectores dos partidos democráticos e republicanos mais belicistas; as relações entre as duas Coreias e da Coreia do Norte com os EUA; a expansão da influência da China na economia e infraestruturas da Ásia, África e América Latina; as tensões e a fragmentação dentro da União Europeia; a campanha dos sectores mais conservadores da Igreja contra o Papa Francisco; o esforço permanente de alguns governos para apoiarem terroristas que fazem tardar o fim da guerra na Síria e as tensões no Médio Oriente; as eleições dentro de dias no Brasil, são alguns dos factores que influenciam tendências de evolução.

Referimo-nos aqui hoje a dois deles.

Com a guerra na Síria com fim à vista, EUA e NATO insistem em escalar tensões

Há cerca de um mês, na parte terminal da guerra contra a Síria, em que os terroristas foram sucessivamente dizimados, fugiram para outros países ou se acantonaram na cidade de Idlib, concertaram-se as vontades de governos de vários países da NATO para fazerem, de novo, a História andar para trás.

Mas em cimeira do passado dia 16 de Setembro, entre Vladimir Putin e o seu homólogo turco, Recep Tayyip Erdogan, ambos concordaram na instauração de uma «zona desmilitarizada» na província síria de Idlib, que será patrulhada pelas polícias militares turca e russa.

A zona desmilitarizada, que deve ser criada antes de 15 de Outubro, vai separar as posições das forças governamentais e das milícias da oposição e terá uma extensão entre 15 a 20 quilómetros.

O MI6 do Reino Unido, sob a direção de Theresa May, começou a encenar a vitimização de crianças num falso ataque químico.

Operacionais da sociedade Olive foram enviados para o local e armas químicas foram encaminhadas para a província de Idlib. Os Capacetes Brancos raptaram 44 crianças. O MI6 previa sacrificá-las e atribuir o seu assassínio a um ataque químico do Exército Árabe Sírio contra os «rebeldes».

O MI6 havia antecipadamente organizado a difusão desta intoxicação a partir do testemunho futuro de uma criança que chamou de Hala. Criou uma conta de Twitter em seu nome, a 29 de Julho, e uns trinta média subscreveram-na de imediato, esperando o seu sinal para começarem a operar Olhos sobre Idlib (Eyes on Idlib). Entre estes conta-se a BBC, a Rádio Europa Livre/Rádio Liberdade, o BuzzFeed et o The Huffington Post. Tudo gente insuspeita…

Simultaneamente, o Pentágono deslocou para o Golfo o contra-torpedeiro The Sullivans, com 56 misseis de cruzeiro a bordo, e enviou um bombardeiro estratégico В-1B equipado com 24 misseis de cruzeiro ar-terra para a base aérea Al-Udeid, no Catar.

Se a responsabilidade da Primeira-ministra britânica Theresa May está clara em relação aos actos do MI6, ignora-se quem ordenou o destacamento militar dos EUA… onde o desrespeito pelas ordens do Presidente é recorrrente nos serviços secretos e na CIA. Emmanuel Macron, sempre a reboque, justificou a retoma da guerra perante os seus embaixadores reunidos em Paris.

Os autores deste plano sabem muito bem que já perderam a guerra se a considerarmos unicamente de um ponto de vista sírio. O seu novo objectivo parece ir bem para além disso. Trata-se para eles de provocar um conflito com a Rússia; isto é, uma guerra que se tornaria rapidamente mundial.

A Síria e a Rússia reagiram revelando os factos porque os seus serviços secretos não andam a brincar… E, por seu lado, a Rússia reforçou a sua presença militar ao largo da Síria, realizando mesmo grandes manobras militares.

O Departamento de Estado acabou por enviar o Embaixador James Jeffrey e um oficial da inteligência militar para acalmar os países da região e garantir a todos os seus interlocutores que Washington não se preparava para bombardear a Síria com um pretexto fabricado.

O parlamento alemão rejeitou a participação de Berlim numa agressão ocidental contra Damasco, contrariando a tendência da Ministra alemã da Defesa. Esta questão causou divisões na coligação que governa a Alemanha, com o SPD a descartar qualquer envolvimento em tal interferência, a menos que fosse aprovada pelas Nações Unidas. A Alemanha está sob pressão dos Estados Unidos para aumentar os seus gastos com a defesa e assumir mais responsabilidades no âmbito da NATO.

Tudo isto aconteceu em simultâneo com uma grande pressão sobre a Síria e a Rússia para não bombardearem Idlib ou, pelo menos, para evitarem mortes civis, e para abrirem saídas de fuga humanitárias da cidade e da região (Idlib é capital de uma região com o mesmo nome), com apoio aos refugiados de maneira a não deixarem degradar excessivamente as suas condições. Idênticos cuidados foram tomados na reconquista de outras cidades, apesar das encenações dos capacetes brancos da Sra. May.

Por cá os Senas Santos e tantos que tais foram verdadeiras carpideiras por uma causa não verificável no terreno, verdadeiros capacetes brancos ao serviço do MI6.

A Turquia é vizinha de Idlib e quer evitar refugiados. Por outro lado apoiou até agora um dos movimentos de oposição (a que chama moderado mas que se misturou já tanto com os outros que nenhum se distingue…). O PKK já não é um movimento curdo que confira perigosidade para a Turquia desde que se vendeu a serviços secretos ocidentais.

Estes grupos fustigaram, de forma imprudente, as forças sírias, como que a pedir resposta e destruíram mesmo quatro pontes para impedir a população de fugir, acentuando nesse gesto o carácter de refém daquela.

Os presidentes das duas Coreias reuniram-se de novo; e os EUA?

No passado 18 de Setembro, os presidentes das duas Coreias voltaram a reunir-se para implementar a Declaração de Panmunjom para a paz, a prosperidade e a reunificação da península da Coreia. Dois dias depois do fogoso John Bolton ter feito saber que um segundo encontro Donald Trump-Kim Jong-un, desejado pela Coreia do Norte, dependeria do cumprimento por esta da promessa da desnuclearização. Os dois chefes de Estado debateram agora a desnuclearização da península coreana e a possibilidade de retoma do diálogo entre a RPDC e os EUA.

Foi a terceira vez que os dois líderes coreanos se reuniram este ano, depois dos encontros de 27 de Abril e de 26 de Maio.

Na cimeira de Abril passado, Kim e Moon assinaram a Declaração de Panmunjom, visando alcançar a desnuclearização da península da Coreia, pôr fim às ações hostis de parte a parte, recomeçar as reuniões das famílias separadas pela guerra (1950-1953) e melhorar as relações bilaterais entre Pyongyang e Seul.

As imagens históricas do encontro de 13 de Junho entre os presidentes dos EUA e da Coreia do Norte ainda estão vivas na memória do mundo.

Para o presidente Donald Trump a reunião foi perfeitamente positiva, chegando a postar, no seu regresso a Washington, «a ameaça nuclear da Coreia do Norte não existe mais» e «durmam bem esta noite». Mas onde Trump viu apenas vitórias, a generalidade da grande imprensa que se lhe opõe apontou para incertezas e Obama quase lhe chamou traidor. Por outro lado, a imprensa da Coreia do Norte sublinhou que conseguiu importantes concessões dos Estados Unidos, como o fim dos exercícios militares conjuntos com a Coreia do Sul e a eliminação gradual das armas nucleares. E afirmaram que os Estados Unidos poderiam suspender as sanções contra a Coreia do Norte se a relação entre dois países melhorasse. O secretário de Estado, Mike Pompeo reconheceu que ainda há muito trabalho pela frente para acabar com as armas nucleares da Coreia do Norte. Irritado com as críticas da imprensa americana, Trump chegou a afirmar que «o grande inimigo do nosso país são as fake news».

Já antes da primeira cimeira entre as duas Coreias, que se viria a realizar realizar em Panmunjon, na zona desmilitarizada da fronteira comum, o líder de Pyongyang declarou o fim de «todos os ensaios nucleares e do lançamento de mísseis balísticos intercontinentais. A viragem ocorreu no discurso de Ano Novo de Kim, em que este se apresentou disposto ao diálogo com a Coreia do Sul e abriu caminho à participação do seu país nos Jogos Olímpicos de Inverno, realizados em Fevereiro no Sul, o que veio a suceder. Na imediata sequência dos Jogos, nos quais estiveram presente o vice-presidente dos Estados Unidos, Mike Pence, e a filha do presidente Donald Trump, Ivanka, Kim sugeriu a realização de uma cimeira com o dirigente americano.

É conhecido nos meios diplomáticos que a prioridade de Kim não era o desenvolvimento do alcance dos seus mísseis nucleares mas sim o desenvolvimento da economia nacional, o progresso económico, chegar à normalização de relações com outros Estados e o reconhecimento da comunidade internacional.

Com uma economia sujeita a sanções internacionais, dependendo de mercados paralelos e de outros meios para se equipar na maioria dos sectores, a Coreia do Norte sofreu enormes bloqueios económicos que lhe limitaram o seu desenvolvimento.

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