Numa publicação feita nas redes sociais da empresa luso-palestina é feita uma descrição das frases pintadas no seu espaço da Mercearia de Arroios, com que se depararam ontem, quando acordaram «com o ódio escrito nas nossas janelas».
Em marcador permanente foi escrito, «Fuck Jihad» (que se lixe a Jihad), procurando associar todo e qualquer cidadão religioso muçulmano, ou árabe, a práticas terroristas e violentas, como se fossem todos iguais.
Poderia ser mais uma tirada de Donald Trump. André Levy contextualiza a expressão e retoma o caso exemplar de Eric Garner para nos fazer reflectir sobre qual o país que poderá merecer o qualificativo usado por Trump. Numa reunião bipartidária sobre reforma da política de imigração dos EUA, na semana passada, o Presidente dos EUA ter-se-á referido ao Haiti, El Salvador e nações em África como «países de merda» (shithole countries). Trump sugeriu que os EUA deviam preferir acolher mais pessoas de países como a Noruega ou de países asiáticos, porque podem ajudar os EUA economicamente. Durante dias, políticos e comentadores têm discutido diferentes versões do ocorrido, incluindo a palavra exacta usada por Trump. Questionado por um jornalista sobre se era racista, Trump repetiu uma sua já comum defesa superlativa: «Sou a pessoa menos racista que você já entrevistou». Mas a palavra exacta, mesmo se foi ou não uma palavra vulgar, não esconde o sentimento racista e classista por detrás das afirmações de Trump na reunião, em inúmeros discursos e nas suas acções. Recordem-se as suas repetidas tentativas, congeladas por Tribunais de Apelação, de restringir imigração e refugiados de inúmeros países muçulmanos, assim como da Venezuela e RPD da Coreia. Recordem-se as decisões em Novembro passado de terminar um programa humanitário (Estatuto Protegido Temporário) que permitiu a cerca de 2500 nicaraguenses e quase 60 mil haitianos viverem e trabalharem no EUA, após o terramoto que devastou o seu país em 2010. Ou decisão semelhante este mês, que afectará cerca de 200 mil salvadorenhos, que foram para os EUA após os terramotos que devastaram o seu país em 2001. Este programa, instituído em 1990, protegia mais de 300 mil pessoas que encontraram refúgio nos EUA, aí trabalharam e estabelecerem vida, muitos tendo tido filhos que são considerados cidadãos dos EUA. O fim deste programa vai forçar estas famílias a sair do país. Ou ainda a intenção de Trump de terminar um programa da era Obama (conhecido pelo acrónimo DACA) que protege jovens imigrantes de deportação, cerca de 800 mil jovens (os «sonhadores»,ou &dreamers) que foram trazidos ilegalmente para os EUA enquanto crianças. É redutor, porém, resumir este episódio a mais uma tirada do Trump. Numa tentativa (triste) de defender Trump, o comentador da rede Fox News, Jesse Watters, desvalorizou as palavras insultuosas alegando que «é assim que os homens e mulheres esquecidos da América falam no bar». Mesmo que assim fosse, não justificaria que um Presidente falasse da mesma forma numa reunião de Estado. E certamente, nem todos nos EUA falam nestes termos. Mas seria ingénuo pensar que o racismo nos EUA se resume a Trump, seus acólitos e apoiantes mais «esquecidos». O racismo nos EUA estende-se até a sua pré-história, está enraizado nas suas leis e instituições, e mesmo avanços conseguidos estão sobre constante ameaça: veja-se o retrocesso quanto ao Acto de Direitos de Voto, de 1965, por decisão do Supremo Tribunal, em 2013, que permite a vários estados alterarem as suas leis de voto sem aprovação federal, prejudicando sobretudo a população negra. Poderíamos aqui fundamentar este racismo institucional com números sobre os níveis de pobreza, educação, ganho salarial, encarceramento, etc. Mas desta feita termino com um caso concreto ilustrativo. Em 2014 Eric Garner foi morto por policias que o estrangularam com um chave de braço, prática oficialmente proibida. Antes de morrer repetiu 11 vezes «não consigo respirar». A polícia havia abordado Garner por suspeitarem de estar a vender cigarros individuais. O médico legal concluiu que a morte foi um homicídio. Porém, Daniel Pantaleo – polícia que já em 2013 havia sido acusado de abuso numa tentativa de prender dois homens negros, obrigando-os a despirem-se na rua – não foi sequer indiciado, dando azo a inúmeros protestos por todo o país. Na semana passada, em Nova Iorque, foi o funeral da sua filha, Erica Garner, de 27 anos, activista contra a brutalidade policial. Em Agosto teve o seu segundo filho – Eric em honra do avô – e quatro meses depois, a 30 de Dezembro, faleceu após um ataque cardíaco induzido por um ataque de asma. Erica vinha atribuindo a deterioração da sua sua saúde à injustiça racial. Os números dão-lhe razão. Entre os países desenvolvidos, os EUA têm dos números mais elevados de mortes relacionadas com gravidez e parto: entre 700 e 900 mortes por ano (muitos mais enfrentam complicações severas). Mas os números são particularmente sérios entre os negros (ou, mais genericamente, entre as classes desprivilegiadas): a nível nacional, as mulheres negras morrem de complicações de gravidez a uma taxa três vezes superior às mulheres brancas (uma taxa semelhante às mulheres no México ou Uzbequistão). Em Nova Iorque, esse número eleva-se para 12 vezes mais. É caso para pensar qual é o país de merda. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Opinião|
Donald Trump
Países de merda
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«Desde o primeiro dia que clientes e amigos, de mais de trinta nacionalidades, entraram nesta loja e tornaram-na no que ela é hoje: um lugar de tolerância, diversidade e de laços», afirmam, e por isso mesmo, mesmo que esse ódio procure, por este dias, crescer, «não passará», e «nós não teremos medo dele».
A Zaytouna dirige-se a «todos e todas os que sofrem de discursos de ódio, de racismo, de xenofobia, de homofobia, transfobia, e a todas as vítimas da Jihad e tantos outros grupos que promovem a violência e a intolerância: não tenham medo». A cada novo assalto «seremos sempre mais, e estaremos juntos, sempre», prometem.
Queixas por discriminação racial continuam a aumentar
A Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR) recebeu, em 2020, 665 queixas de discriminação em função da «origem racial e étnica, cor, nacionalidade, ascendência e território de origem».
É um autêntico quadro de honra da língua portuguesa. Mais de 200 escritores, aos quais se juntou a Fundação José Saramago, já assinaram uma carta aberta contra o racismo, a xenofobia e o populismo. Pertencem a diferentes gerações. Divergem em credos, convicções ou concepções estéticas e políticas. Encontram-se espalhados por vários continentes. São homens e são mulheres. São poetas, prosadores, ensaístas e dramaturgos. Escrevem para adultos e para crianças. Alguns são músicos e compositores de canções. Vários receberam prémios literários, entre eles os mais importantes da língua portuguesa. Há os que dirigem ou representam associações de autores. Todos estão unidos por uma única vontade: não transigir com o racismo, a xenofobia e o populismo em Portugal. Porque, explicam, «como sempre nos mostrou a História, quem adormece em democracia acorda em ditadura». São «escritores portugueses e de língua portuguesa». Estão, «por ofício, cientes do poder da palavra», mas também «do poder da sua omissão». Por isso, «em tempos normais», dizem, não dariam palco a comportamentos racistas, xenófobos e populistas. As «circunstâncias vividas em Portugal» neste domínio, que consideram «graves e inquietantes», levam-nos a «correr esse risco». Até porque «cultura e literatura não florescem» em «tempos sufocantes» em que o «mais repugnante pode emergir de uma sociedade em crise e em estado de medo». «Não podemos olhar para o lado nem continuar calados, sob pena de emudecermos», afirmam. Exigem «compromissos políticos que detenham a escalada do populismo, da violência, da xenofobia». Dão o exemplo: «assumimos o compromisso de jamais participarmos em eventos, conferências e/ou festivais conotados – seja de que maneira for – com ideias que colidam com os princípios da tolerância e da dignidade humana». Porque há valores a defender, «antes que seja tarde». Elencam: democracia, multiculturalismo, justiça social, tolerância, inclusão, igualdade entre géneros, liberdade de expressão e debate aberto. «Tais», afirmam, «são as nossas grandes riquezas: a diversidade e a tolerância», expressas na «língua portuguesa, feita de aglutinação, inclusão e aceitação da diferença». E gritam: «quem gosta de Portugal jamais diz “Vão!”, antes diz “Venham!”». Que cada um cumpra o seu dever, é tudo o que pretendem os signatários da carta aberta. «A todos os cidadãos portugueses, à sociedade civil, aos professores das escolas e das universidades», os escritores apelam «a que se distanciem de projectos e movimentos antidemocráticos e ajudem na consciencialização das novas gerações para a urgência dos valores humanistas e para os riscos das extremas-direitas; aos órgãos de justiça, que investiguem, processem e condenem os interesses económico-financeiros que se servem dos novos populismos; às autoridades policiais e aos seus agentes, que se abstenham de condescender com movimentos e acções promotores da exclusão, da discriminação e da violência; à comunicação social, que assuma com veemência o seu papel de contraditório e de defesa da verdade; aos partidos políticos, que sejam capazes de recuperar os princípios esquecidos no decurso do jogo partidário de vocação eleitoral; ao Presidente da República, à Assembleia da República e ao Governo, que exerçam um escrutínio rigoroso da constitucionalidade e assegurem que o fascismo não passará». A iniciativa partiu dos escritores Joel Neto e Ana Margarida de Carvalho. Ambos os autores prestaram declarações ao Jornal 2 da RTP-2, que podem ser ouvidas aqui. Ao jornal Contacto (Luxemburgo), Ana Margarida de Carvalho, um dos poucos autores a receber por mais de uma vez o Grande Prémio do Romance e da Novela da APE, o maior galardão literário português, explicou que a ‘Carta aberta dos escritores de língua portuguesa contra o racismo, a xenofobia e o populismo e em defesa de uma cultura e de uma sociedade livres, plurais e inclusivas’ «está alojada na página da Fundação José Saramago» e que «continua a recolher assinaturas de várias mulheres e homens da literatura». No primeiro grupo de assinaturas, durante um único fim-de-semana, eram cerca de 150 escritores. Hoje são mais de 200. Representam um autêntico quadro de honra da escrita em língua portuguesa. O texto do manifesto encontra-se integralmente na página da Fundação José Saramago, bem como a lista de escritores – sujeita a actualização – que já o subscreveram. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Cultura|
O punho da escrita contra o racismo, a xenofobia e o populismo
O dever da palavra
A cada um a sua responsabilidade
A origem e o texto completo do carta aberta
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Este número representa um aumento de 50% face a 2019, mas, ainda assim, os números «continuam a não ser representativos», afirmou a secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro. Há sete anos que o número de denúncias vem aumentando, o que em parte demonstra uma maior «literacia de direitos», considerou.
O preconceito pode manifestar-se de várias maneiras, desde o discurso generalizador, que pretende que todo um grupo de pessoas assuma uma característica negativa, à exclusão social, da qual um dos exemplos mais prementes é a recusa do acesso ao mercado de arrendamento em função das origens étnicas.
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