Para a Comissão para a Igualdade entre Mulheres e Homens (CIMH/CGTP-IN) a análise dos dados do Instituto Nacional de Estatísticas (INE) não deixa margem para muitas dúvidas: «Pese embora o discurso oficial sobre os efeitos da crise, minimizando-os com o argumento da eficácia das medidas de combate aos efeitos económicos, sociais e laborais da pandemia», a pobreza agravou-se nos últimos anos.
«Conjugando o risco de pobreza com outros dois indicadores (a privação material e social severa e uma intensidade laboral per capita muito reduzida), verifica-se que, em 2021, eram perto de dois milhões e 32 mil as pessoas residentes em Portugal que se encontravam em situação de pobreza ou exclusão social, mesmo após transferências sociais».
Na pronúncia sobre a Estratégia Nacional de Combate à Pobreza 2021-2030, o Movimento Democrático de Mulheres (MDM) afirma que não existem no documento instrumentos «significativos e duradouros». Reconhecendo o diagnóstico realizado no documento submetido a consulta pública até ao passado dia 25 de Outubro, o MDM entende, todavia, que as medidas apontadas não constituem instrumentos «significativos e duradouros de combate à pobreza», não sendo igualmente «susceptíveis de provocar a ruptura de ciclos de pobreza e de exclusão». Segundo o movimento, faltam «propostas de políticas públicas articuladas e fundamentais para o combate, prevenção e erradicação da pobreza». Neste sentido, defende que uma estratégia nacional de combate à pobreza deve ir «ao cerne das razões geradoras das desigualdades sociais e encarar de frente as suas causas», equacionando mecanismos eficazes para as combater e prevenir. Para o MDM, a estratégia não pode desligar-se do impacto do aumento de exploração laboral, da precariedade laboral, da desvalorização dos salários, da falta de eficácia na prevenção e combate às violências contra as mulheres, concretamente da violência doméstica, da prostituição e da exploração sexual. Tal como não pode ignorar, entre outros aspectos, a insuficiente rede pública de equipamentos de apoio à família e o desinvestimento na Educação Pública ou no Serviço Nacional de Saúde (SNS), «sendo Portugal o país onde as famílias mais pagam a educação e a saúde, desinvestimento bem sentido durante a crise pandémica». «As mulheres trabalhadoras constituem mais de metade dos desempregados e são a maioria das famílias monoparentais e dos pobres em Portugal», alerta a central sindical. Em vésperas do Dia Internacional da Erradicação da Pobreza, celebrado a 17 de Outubro de 2021, a CGTP-IN relembra que, só «em 2020, existiam dois milhões e 37 mil pessoas, residentes no nosso país, que se encontravam em situação de pobreza ou exclusão social. Dessas, cerca de um milhão e 100 mil eram mulheres, ou seja, 20,2% do total de mulheres residentes em Portugal, um valor superior ao dos homens». A luta por «trabalho de igual valor, salário igual» mantém-se tão actual como no passado e é indissociável das reivindicações pelo direito à contratação colectiva. 1 de Março. Para que no final do ano as mulheres a trabalhar em Portugal recebessem o mesmo do que os homens, estes podiam começar a trabalhar apenas a 1 de Março. De acordo com os dados mais recentes sobre as diferenças salariais entre homens e mulheres (2018), estas recebem menos 16,2% de salário por hora – o equivalente a 52 dias de trabalho – e esta diferença tem sido persistente nos anos mais recentes1. «Uma análise mais detalhada das diferenças salariais implica comparar os salários de mulheres e homens com características semelhantes, nomeadamente em termos de qualificações. Quando o fazemos, então concluímos que não há melhorias significativas na redução das assimetrias salariais nos últimos 30 anos» A olho nu, numa análise de mais longo prazo, pode dizer-se que a redução das diferenças salariais entre homens e mulheres em Portugal foi significativa – se hoje a diferença é de cerca de 16%, no início dos anos 90 era de quase 25%. Por detrás deste decréscimo aparentemente significativo está o aumento das qualificações das mulheres, pelo que esta análise mais generalista não é suficiente para analisar a existência da elevada assimetria salarial ainda existente. Uma análise mais detalhada das diferenças salariais implica comparar os salários de mulheres e homens com características semelhantes, nomeadamente em termos de qualificações. Quando o fazemos, então concluímos que não há melhorias significativas na redução das assimetrias salariais nos últimos 30 anos. Apesar da legislação que impede a discriminação salarial entre mulheres e homens, a realidade em diversos países aponta para a persistência de diversas fontes de discriminação, mais ou menos explícita, nas mais variadas actividades – desde as investigadoras na área da economia serem confrontadas mais frequentemente com comentários paternalistas ou hostis durante seminários do que os seus pares do sexo masculino2, a professoras receberem sistematicamente avaliações pedagógicas inferiores que os seus pares do sexo masculino3, ou mulheres a sofrerem sanções mais graves no emprego do que os seus pares do sexo masculino perante atitudes semelhantes4. Independentemente da especificidade dos exemplos dados, a apologia das longas jornadas de trabalho, conjugado com uma desequilibrada distribuição do trabalho doméstico e apoio aos filhos, continua a ser uma das principais razões para que mulheres e homens que partilham as mesmas qualificações e ocupações, tenham folhas salariais com valores substancialmente diferentes5 6. As últimas décadas de desenvolvimento tecnológico têm significado alterações no mercado de trabalho. Em específico, tem-se assistido a uma redução do peso relativo das ocupações ditas «rotineiras» – ocupações que implicam a repetição de processos, e em que uma parte ou o todo dos conteúdos funcionais podem ser integrados/desempenhados por uma tecnologia digital –, em oposição ao aumento da relevância das ocupações «não-rotineiras» – que cobrem um espectro tão diverso como a advocacia, a programação informática ou o apoio social a idosos, e por isso estão em extremos opostos da distribuição salarial. Dadas estas alterações, importa perguntar quais as suas implicações nas assimetrias salariais entre mulheres e homens. Foquemo-nos no sector privado, para o qual os dados disponíveis remontam a um período mais longo e permitem um nível de análise que dá suporte aos argumentos desenvolvidos de seguida. «Em conclusão, as alterações na estrutura do mercado de trabalho causadas pelo desenvolvimento tecnológico não trazem qualquer automatismo na redução das diferenças salariais entre mulheres e homens» Podendo haver a expectativa de que o aumento impressionante de qualificações das mulheres trabalhadoras nos últimos 20 anos – em 1995 apenas 5% das trabalhadoras do sector privado tinham formação superior, e em 2017 eram quase 25% – seria suficiente para reduzir as diferenças salariais, a realidade não vai ao encontro dessas expectativas. Muito embora o aumento do número de anos de educação entre as mulheres tenha acontecido a par do aumento do emprego mais qualificado, o que as tem beneficiado no acesso a ocupações «não-rotineiras» que exijam mais qualificações. Se este efeito – mulheres mais qualificadas a ocupar os novos postos de trabalho mais qualificados – poderia significar a redução automática das diferenças salariais, emergem dois efeitos mais fortes: (1) a segregação nas ocupações é enorme (i.e., subsistem estereótipos relativamente a profissões de «mulher» e profissões de «homem»), e as mulheres estão sobre-representadas em ocupações mais mal pagas; (2) os salários associados a ocupações com grande percentagem de mulheres tem aumentado menos do que os salários pagos em ocupações desempenhadas sobretudo por homens. Ainda que, quer uns, quer outros, tenham visto os seus salários reais praticamente estagnados nos últimos 20 anos. «a História da emancipação das mulheres nunca beneficiou de quaisquer automatismos, e foi por via da sua reivindicação e luta que se operaram mudanças e saltos qualitativos nas suas vidas, e na sua participação na vida política, social e cultural» Em conclusão, as alterações na estrutura do mercado de trabalho causadas pelo desenvolvimento tecnológico não trazem qualquer automatismo na redução das diferenças salariais entre mulheres e homens7. Como, aliás, a História da emancipação das mulheres nunca beneficiou de quaisquer automatismos, e foi por via da sua reivindicação e luta que se operaram mudanças e saltos qualitativos nas suas vidas, e na sua participação na vida política, social e cultural. A luta por «trabalho de igual valor, salário igual» mantém-se tão actual como no passado e é indissociável das reivindicações pelo direito à contratação colectiva. Uma contratação colectiva que garanta tabelas salariais transparentes, justas, e que valorizem os trabalhadores; uma contratação colectiva que garanta que ocupações com conteúdos funcionais semelhantes sejam igualmente pagas, independentemente de serem desempenhadas por mulheres ou por homens; uma contratação colectiva que preveja direitos de parentalidade, que sirva de arma de combate a qualquer tentativa de discriminação das mulheres, nomeadamente quando são mães, e dos homens quando querem exercer os seus direitos enquanto pais. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Vários outros indicadores apontam para a grave situação de desigualdade de rendimentos existente em Portugal: «Em Agosto de 2021, as mulheres eram as principais beneficiárias das prestações de desemprego (59% mulheres e 41% homens)» e «69% dos pensionistas com pensões até 438,81€ - abaixo do limiar da pobreza - são mulheres». Também os indicadores apresentados na segunda-feira pelo Governo, no contexto da proposta de Orçamento do Estado para 2022, salientam a desigualdade de rendimentos entre homens e mulheres, «17,1% nos ganhos salariais e 28,4% nas pensões». Em comunicado enviado ao AbrilAbril, a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses - Intersindical Nacional, CGTP-IN, insiste que «o combate à pobreza passa, necessariamente, pelo aumento geral dos salários e das pensões, pela garantia de emprego estável e pelo fim da caducidade das convenções colectivas de trabalho como instrumentos essenciais para garantir uma melhor e mais justa distribuição da riqueza». «Mais do que discursos politicamente correctos de quem governa, precisamos de políticas que resolvam os problemas do dia-a-dia». Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Por entender que cabe ao Estado assegurar um «património de direitos que visem a igualdade de todos os cidadãos perante a lei, mas sobretudo a concretização dos meios necessários com vista a tornar estes direitos uma realidade vivida para as cidadãs e cidadãos, o MDM propõe que a Estratégia Nacional de Combate à Pobreza inclua um conjunto de medidas que o movimento há muito reclama. O aumento do salário mínimo nacional para 850 euros e a valorização das carreiras e dos salários encabeça a lista de reivindicações, onde as mulheres propõem a existência de um plano de combate à precariedade, a universalidade de acesso ao abono de família, o reforço do investimento humano e tecnológico no SNS e, entre outras medidas, a expansão do sistema público de educação pré-escolar. A criação de uma rede pública de equipamentos sociais de apoio à família, à infância, à deficiência e a idosos, e o aumento das pensões de reforma e de invalidez são também questões que o MDM pretende ver incluídas no documento, a par de medidas como a implementação de um plano de combate à exploração na prostituição com programas de saída para as mulheres prostituídas e que garanta aspectos como o acesso imediato a apoios que lhes permitam a reinserção social, profissional e o acolhimento dos filhos. O movimento salienta que os efeitos da pandemia agravaram as múltiplas formas de violência sobre as mulheres, «em especial a violência estrutural, enquanto motor social de perpetuação e multiplicação das discriminações e desigualdades sociais, económicas, culturais ou políticas». Dados divulgados pelo Observatório Nacional de Luta Contra a Pobreza revelam que existiam em 2020, em Portugal, 2056 mil pessoas em risco de pobreza ou exclusão social e 1665 mil pessoas em risco de pobreza segundo os rendimentos de 2019. Segmentada em percentagens, a análise revela que dos 56% da população com idade entre os 18 e os 64 anos, metade estava inserida no mercado de trabalho (46,5%) ou encontrava-se reformada (3,3%), e que 55% são mulheres. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Nacional|
Estratégia nacional «não» combate a pobreza
Trabalho|
CGTP-IN: Mais de 20% das mulheres portuguesas em situação de pobreza
Opinião|
As diferenças salariais entre mulheres e homens e o desenvolvimento tecnológico
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De entre estes, são hoje um milhão e 274 mil as mulheres portuguesas condenadas a esta condição, perfazendo 23,5% do total das mulheres residentes no país. Desde 2020, mais 138 mil mulheres foram empurradas para a pobreza, vivendo com menos de 554 euros por mês (6 653 euros anuais).
Ao mesmo passo, a CIMH não deixa de denunciar a progressiva degradação da generalidade dos «indicadores respeitantes à incidência e intensidade da pobreza, ao efeito conjugado da pobreza e da exclusão social, às desigualdades na distribuição do rendimento e às consequências no mercado de trabalho».
Viver para trabalhar sim, mas empobrecendo
A realidade não se alterou: As mulheres enfrentam um risco maior de pobreza face aos homens (19,2% para 17,5%), muito por causa da disparidade salarial de que são vítimas, com salários ainda mais baixos do que aqueles pagos aos homens. Sem a segurança social, e os apoios que esta garante, o nível de pobreza seria ainda mais elevado. As pensões representam o maior contributo na luta contra a pobreza, reduzindo quase para metade o número dos afectados.
Dados relativos a 2017 expõem a discriminação salarial em função do sexo: os homens ganharam mais 150 euros, em média, do que as mulheres. O Barómetro das Diferenças Remuneratórias entre Homens e Mulheres (BDRHM) apresentou ontem, em Lisboa, um conjunto de dados relativos ao ano de 2017, que revelam que, em Portugal, os homens ganharam nesse ano, em média, mais 15% do que as mulheres. Os valores reportam-se à remuneração média mensal base dos homens, sendo que o salário base destes se fixou nos 1008,8 euros mensais e o das mulheres se estabeleceu nos 859,1 euros mensais. No entanto, os mesmos dados revelam que, se se considerar os salários efectivamento ganhos, as diferenças salariais sobem para 18,2%. Segundo o BDRHM, a análise feita procurou minimizar o efeito de algumas variáveis que podem ajudar a explicar as diferenças salariais entre homens e mulheres, como o nível de qualificação profissional, a habilitação literária ou a antiguidade no emprego, entre outros. E, nesses casos, a diferença percentual entre sexos baixa para 11,2%. Ainda assim, o Ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social confima que mesmo «depois de corrigir tudo isso permanece uma diferença inexplicável, que por vezes poderá ser até explicada por actos de discriminação salarial». Constata-se que são as actividades artísticas e desportivas onde o fosso salarial é maior, fixando-se nos 57,1%. E, mesmo com variáveis atenuantes, a diferença nestes sectores regista-se nos 19,6%. Os distritos onde se verificam maiores diferenças entre salários base médios entre sexos são Setúbal, Leiria, Lisboa e Aveiro, verificando-se neste último distrito uma diferença de 20% em desfavor das mulheres. O BDRHM foi elaborado pelo Gabinete de Estratégia e Planeamento, o qual é dependente do ministério tutelado por Vieira da Silva. Conta-se que venham a ser disponbilizados até ao final do ano os dados relativos a 2018. Com Agência Lusa Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Nacional|
Homens ganham, em média, mais 15% do que as mulheres
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«Também as restantes prestações sociais (como o subsídio de desemprego, doença, a parentalidade, o abono de família, o RSI, entre outras) são importantes nessa redução».
O risco de pobreza mesmo após transferências sociais é particularmente elevado entre as trabalhadoras desempregadas, atingindo 43,2% em 2020, «devido à fraca cobertura e baixo valor das prestações de desemprego», situação que se vem agravando desde 2019.
Mesmo no caso dos trabalhadores, o cenário só se vem degradando desde 2020: o valor atingido é um dos mais altos desde o início da série estatística do INE (2003), afectando 525 mil trabalhadores, 240 mil dos quais mulheres (10,3% do total das mulheres trabalhadoras).
Para a CGTP-IN, os dados expõe o grave problema de baixos salários que assola o País, expondo as centenas de milhares de «trabalhadores que empobrecem a trabalhar», condenados à pobreza, mais fragilizados pela pandemia, enquanto os lucros das maiores empresas não pararam de bater novos recordes.
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