|incêndios florestais

Territórios que ardem

O problema dos incêndios rurais tem as suas raízes no facto de sucessivos governos terem abandonado o território à sua sorte, resultando na fuga de populações de muitas freguesias do continente.

Habitação e veículo atingidos pelo incêndio que deflagrou em Castro Marim e alargou aos concelhos limítrofes, destruiu milhares de hectares de matos e florestas e várias habitações, causou ferimentos em três bombeiros, a morte de inúmeros animais e deslocou dezenas de pessoas, além de prejuízos diversos que estão ainda por calcular. Algarve, 17 de Agosto de 2021
CréditosLuís Forra / LUSA

Os incêndios rurais que assolaram o país nos passados meses de Julho e Agosto, trouxeram de novo para a atualidade este problema de segurança interna, que os mais distraídos pensaram ter sido resolvido, após os incêndios de Junho e Outubro de 2017, de tão trágica memória.

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Pinhal de Leiria: da mata se fez deserto

Cinco anos após o incêndio no Pinhal de Leiria, que destruiu 86% da área total, o PCP alerta para a estratégia em curso de «perversão da matriz, natureza e funções do pinhal».

 Zona ardida no Pinhal de Leiria, causada pelo incêndio na Marinha Grande, 16 de Outubro de 2017 
CréditosPaulo Cunha / Agência Lusa

Foi um dos mais brutais incêndios no annus horribilis de 2017. No distrito de Leiria, o concelho da Marinha Grande viu a quase totalidade do seu território arder numa questão de dias, culminando na destruição de 9 500 hectares do histórico pinhal, cerca de 86% da área total.

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Incêndios: municípios são obrigados a pagar para cumprir as funções do Estado

Durante o período de contingência, decretado por causa da onda de calor, as autarquias vêem-se obrigadas a pagar serviços gratificados às forças de segurança para garantir a vigilância nos seus territórios.

CréditosMiguel A. Lopes / Agência Lusa

A denúncia parte da vereadora Carla Guerreiro, vice-presidente da Câmara Municipal de Setúbal (CMS), concelho que chegou a ser ameaçado pelo grande incêndio que deflagrou, há poucos dias, no concelho vizinho de Palmela.

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Greve dos guardas-florestais ajuda a perceber o que Costa tem tentado explicar

Os guardas-florestais vão estar em greve, esta sexta-feira, contra a falta de efectivos. Primeiro-ministro vem apontando «razões» para os incêndios, sem nunca falar da ausência de investimento público.

Rescaldo de incêndio florestal. Foto de arquivo (2017)
CréditosManuel de Almeida / Agência Lusa

O silêncio do Governo levou a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais (FNSTFPS/CGTP-IN) a convocar uma greve dos guardas-florestais do Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da Guarda Nacional Republicana (GNR). Além da paralisação, está também marcada para amanhã uma concentração, às 12h, em frente ao Ministério da Administração Interna, em Lisboa, com o objectivo de exigir ao Governo o arranque das medidas reivindicadas pelo sector. 

Em Maio, a estrutura sindical reuniu-se com o ministro da Administração Interna, que se comprometeu a realizar nova reunião no espaço de três semanas, mas o encontro nunca aconteceu. Perante a ausência de resposta às reivindicações, como a aprovação da tabela remuneratória específica para a carreira, a atribuição dos suplementos remuneratórios de função e de escala de serviço e a definição da autonomia funcional do corpo de guardas-florestais do SEPNA/GNR, foi marcada nova acção de luta, numa altura em que os incêndios florestais que devastam o País evidenciam décadas de desinvestimento no ordenamento e protecção da floresta, abandono do Interior e negligência da pequena agricultura

Razões há muitas

Desde o início da semana que o primeiro-ministro vem procurando passar a responsabilidade da prevenção (à semelhança do que se verificou na pandemia de covid-19) para os cidadãos, depois de anos a culpabilizar e perseguir os pequenos proprietários, tentando assim encontrar «razões» para o deflagrar dos incêndios, sem nunca assumir o que verdadeiramente tem faltado para os evitar. 

Depois de, no início da semana, ter afirmado que os incêndios «só ocorrem se uma mão humana, voluntariamente ou por distracção, os tiver provocado», António Costa assumiu esta quarta-feira que a causa estrutural dos incêndios é afinal a «floresta desordenada», evidenciando a questão do cadastro florestal, onde a actuação do Estado não tem sido exemplo. 

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Capoulas Santos e a inevitabilidade da seca

O homem que durante anos teve responsabilidades no Ministério da Agricultura fala sobre a seca como um problema a «relativizar», admitindo não haver «grande capacidade de inovação» nesta matéria. 

CréditosAntónio Pedro Santos / Agência Lusa

De forma intermitente, Capoulas Santos (PS) acumula responsabilidades na condução das políticas do Ministério da Agricultura desde a década de 90. Numa entrevista ao Jornal de Negócios e à Antena 1, publicada esta segunda-feira, o novamente eleito nas listas do PS pelo círculo de Évora fala da seca, mas diz que é um problema a «relativizar» por ser um «fenómeno com o qual os portugueses e os agricultores estão confrontados desde sempre». 

Ao mesmo tempo, defende que «não há medidas estruturais» que se possam adoptar para o armazenamento da água, a não ser construir barragens e usar de forma «mais eficiente e parcimoniosa» a água das mesmas.

Capoulas Santos dá o exemplo do Alqueva, no Alentejo. Uma infra-estrutura a que o PS ofereceu resistência e que, sendo essencial no quadro da gestão dos recursos hídricos, está desvirtuada, beneficiando sobretudo os grandes agrários e as suas culturas superintensivas. E foi certamente com este público na ideia que Capoulas Santos afirmou que «os agricultores estão preparados» para viver uma situação «que acontece com regularidade», admitindo ainda que os governos «têm sabido sempre responder com as medidas adequadas».

Como a realidade demonstra, a afirmação não faz eco. E não é preciso recuar muito para perceber que já podia haver medidas implementadas. Em Setembro de 2020, o PS, mas também o PSD e a IL, com a abstenção do BE e do PAN, rejeitaram um projecto de lei com vista a implementar um plano nacional de combate e prevenção aos efeitos da seca.

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Agricultura familiar sem voz na gestão de resíduos

Associação que representa pequenos e médios agricultores considera uma discriminação a sua ausência no órgão consultivo que acompanha a gestão de resíduos em Portugal.

Remoção de resíduos florestais
Créditos / O Instalador

A participação da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) na consulta pública do Plano Nacional de Gestão de Resíduos (PNGR 2030) foi aproveitada para repudiar a discriminação de que é alvo, ao ser excluída do Conselho Consultivo da Comissão de Acompanhamento da Gestão de Resíduos (CAGER), organismo público que acompanha acompanhamento e avaliação de políticas de gestão de resíduos, no âmbito da Agência Portuguesa do Ambiente (APA).

Em comunicado emitido ontem, a CNA realça a importância que reveste a melhor gestão dos resíduos, incluindo os provenientes das actividades agrícolas, e mostra a sua disponibilidade para apontar soluções e ajudar a construir orientações estratégicas nacionais, em conjunto com as diversas entidades (do sector agrícola, do ambiente e outras).

A CNA afirma a sua vontade de contribuir para a melhor prevenção, produção e gestão de resíduos, em conjugação com a manutenção da actividade dos pequenos e médios agricultores e a protecção do ambiente, pelo desenvolvimento do País.

A associação que representa pequenos e médios agricultores lembra que, de acordo com os Dados do Recenseamento Agrícola 2019, a agricultura familiar representa mais de 90% das explorações agrícolas e cerca de 68% da mão-de-obra agrícola em Portugal, estando disseminada por todo o território, com particular incidência nas zonas rurais mais desfavorecidas.

Em portaria governamental publicada em 2016 (Portaria 306/2016, de 7 de Dezembro) o Governo definiu um Conselho Consultivo em que, além de diversos organismos públicos, participam a Associação para a Gestão de Resíduos (ESGRA), a Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente (CPADA), «cada uma das entidades gestoras de fluxos específicos de resíduos», «associações dos operadores de tratamento de resíduos» e «associações de produtores e distribuidores de produtos abrangidos por fluxos específicos de resíduos», mas onde primam pela ausência os representantes dos pequenos e médios agricultores.

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Entre as várias propostas avançadas então pelos comunistas previa-se a implementação de programas de reforço da capacidade de armazenamento de recursos hídricos, mas também de adaptação para as actividades agrícolas e agro-pecuárias, com medidas de apoio específicas para os produtores de raças autóctones, destinadas a salvaguardar a produção em situações de seca e carência hídrica.

Questionado sobre o facto de a agricultura e a pecuária estarem «praticamente ausentes» do programa do PS, Capoulas Santos responde com a preparação de um novo ciclo de fundos comunitários e com a conclusão da última reforma da Política Agrícola Comum (PAC) na vigência da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia. 

Reforma que, recorde-se, mereceu críticas por parte da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), desde logo por manter o incentivo ao agro-negócio e um sistema de mercado «muito desregulado», com a grande maioria dos agricultores portugueses a ter dificuldades para vender as suas produções a preços justos.  

O entrevistado regozijou-se ainda com a criação do Estatuto da Agricultura Familiar, uma reivindicação da CNA desde há várias décadas, como o próprio reconhece, mas omitindo que está por cumprir

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Um ponto que tem escapado à retórica do primeiro-ministro, e que motiva também a paralisação de amanhã, é a falta de guardas-florestais do SEPNA/GNR. Em Maio de 2021, o então ministro da Administração Interna assumiu que Portugal deveria ter mais de 500 guardas-florestais da GNR em 2022, o que não se verificou. Segundo dados do Governo, a GNR conta actualmente com cerca de 400 efectivos, que têm a missão de fiscalizar e investigar «ilícitos nos domínios florestal, caça e pesca». 

A Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais lembra, a este propósito, que em 2006, com a pasta da Administração Interna tutelada por António Costa, o Corpo Nacional da Guarda Florestal foi extinto e os guardas-florestais transferidos «arbitrariamente» para o SEPNA/GNR, assumindo várias competências. Desde então, denuncia a Federação, estes trabalhadores continuam a aguardar um estatuto profissional equivalente aos de outros profissionais. 

Após os incêndios de 2017, o Governo ficou com a incumbência de, na lei de defesa da floresta contra incêndios, reconstituir o Corpo de Escutas Florestais, o que ainda não aconteceu. 

Não obstante as condições climatéricas, cinco anos após os trágicos incêndios de Pedrógão Grande, que devoraram vidas humanas e mais de 80% do Pinhal de Leiria, o País continua a padecer do desinvestimento em política florestal e da exiguidade do financiamento dos bombeiros e da Protecção Civil. 

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Ao impor a proibição de circulação em zonas florestais (medida indispensável no combate aos incêndios), o Governo não se devia, considera a vice-presidente do concelho sadino, esquivar a «garantir dos necessários meios para fiscalizar essa proibição». Isto «sem colocar as câmaras municipais perante a obrigação de pagamento de serviços gratificados» para cumprir uma responsabilidade que deve caber ao Estado central.

Sobre este assunto, e perante as informações que pôde recolher, a CMS realizou, com carácter de urgência, uma reunião do Conselho Municipal de Segurança para discutir esta situação, solicitando, em simultâneo, «uma reunião ao ministro da Administração Interna para procurar soluções para a escassez de recursos humanos das forças da autoridade no concelho».

A autarquia transmitiu, aos representantes da GNR, PSP e Capitania do Porto de Setúbal, a sua preocupação com a escassez de recursos humanos nas forças da autoridade. Esta lacuna resulta na necessidade de pagar por serviços gratificados (para cumprir o despacho do Governo em que se declara a situação de contingência), que já deviam ser assegurados pelo Estado.

Esta «é, inequivocamente, uma função central do Estado e que, no caso do período de contingência, resulta de uma obrigação imposta pelo Governo», defende a autarquia.

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A floresta de pinheiro bravo foi mandada plantar por D. Afonso III, para conter o avanço das dunas e proteger as culturas agrícolas das areias do litoral. O grande impulso para a expansão do pinhal foi dado anos mais tarde, por D. Dinis.

A maior parte do que era o grande Pinhal de Leiria não passa, hoje em dia, de mato desgovernado. A agonia a que o pinhal foi remetido não é novidade, mas a situação persiste mesmo após a brutalidade do incêndio: «a gestão da Mata Nacional, com uma área maior que a do município de Lisboa, é assegurada apenas por uma técnica superior e 11 assistentes operacionais», denuncia, em comunicado, a direcção da Organização Regional de Leiria do PCP.

Uma área com a importância do pinhal exigia o investimento de mais recursos, defendem os comunistas. A sua destruição «significou a perda de importantíssimos recursos para o País», mas é no «plano social (acesso a áreas de lazer, convívio e desporto), ambiental e de qualidade de vida destas populações que se fazem sentir as mais dolorosas consequências», como se verifica na alteração do clima, em resultado da inexistência do efeito barreira e regulador que o pinhal desempenhava.

As soluções exigem vontade política, e a vontade política tem de dar resposta às necessidades das pessoas

O Plano de Gestão da Mata Nacional de Leiria foi aprovado cinco anos após do incêndio, um documento que ignora todas as propostas e recomendações aprovadas na Assembleia da República e cujo período de consulta pública esteve aberto por apenas 18 dias.

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A realidade impõe-se sempre à ficção

A realidade, que nos quiseram fazer crer que se tinha alterado após o verão de 2017, não se alterou na sua substância. É certo que se constatam algumas melhorias. Porém, não haja ilusões.

Imagem de zona atingida pelo grande incêndio florestal de meados de Junho de 2017 na freguesia de Alvares, concelho de Góis (distrito de Coimbra)
Créditos

Durante vários meses vimos, ouvimos e lemos, não podendo ignorar, as sucessivas mensagens veiculadas por governantes e responsáveis de múltiplos serviços do Estado, no âmbito das suas áreas de competência, proclamando os excelentes resultados verificados nos últimos anos, pós- junho e outubro de 2017, no domínio da redução das ocorrências de incêndios rurais no país e dos correspondentes valores de área ardida.

Na mesma linha de mensagem, evocava-se como justificação para tanto sucesso a «reforma» decidida pelo Governo com a criação do designado Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais, elaborado pela também criada Agência de Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF), diretamente dependente da Presidência do Conselho de Ministros.

Entretanto, o mês de julho deste ano chegou, e com ele chegaram também as ondas de calor, o agravamento da situação de seca vivida no território do Continente e, por consequência, os incêndios rurais (que antes se designavam como incêndios florestais). Contrariamente ao que acontecera nos três anos anteriores, o quadro meteorológico gerou dias sucessivos de grande severidade, potenciador da deflagração de violentos incêndios, com particular gravidade em múltiplas zonas do Centro e Norte do Continente.

As mensagens de triunfalismo foram rapidamente substituídas pelas declarações dos mesmos protagonistas, mas desta vez insistindo nas alterações climáticas e nos seus efeitos, bem como nos comportamentos negligentes dos cidadãos e nos incêndios análogos a ocorrer em vários países da Europa, para justificar a gravidade da situação que o país tem vivido desde o início do passado mês de julho, quanto à sucessão de incêndios e às consequências destes no território, no ambiente e na economia do já depauperado mundo rural e das suas populações.

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A oportunidade de ter ardido um quarto da Serra da Estrela

O fogo que devastou a Serra da Estrela durante quase duas semanas consumiu mais de 26 mil hectares e provocou prejuízos, no mínimo, de 300 milhões de euros. Governo diz que «vai ficar melhor do que estava». 

CréditosMiguel Pereira da Silva / Agência Lusa

Desvalorizar começa a ser a tónica da comunicação do Governo perante problemas que resultam de opções políticas erradas. «Os sistemas de saúde têm problemas, a vida tem problemas – a questão é como é que nos posicionamos relativamente aos problemas», argumentava Marta Temido em Julho. 

Esta segunda-feira, foi a vez de Mariana Vieira da Silva relativizar o drama de agricultores e pastores que ficaram só com o negro da paisagem que levará várias gerações a limpar. Após o encontro com os autarcas das localidades afectadas, tentando passar uma mensagem de optimismo, mas, sobretudo, alijando responsabilidades, a ministra falou de um «plano de revitalização» para, segundo a própria, «deixar este Parque Natural melhor do que estava».

«Mais capaz», adiantou Mariana, de atrair pessoas, visitantes e a economia, «porque essa, sabemos bem, é uma das melhores formas de prevenir incêndios». A afirmação pode encher de esperança quem não conheça nada sobre o que têm sido as políticas nacionais de protecção civil, com décadas de responsabilização e destruição de organismos vitais para a conservação da natureza, mas também para a gestão e planeamento da floresta.

E para quem não conheça também a história do próprio Parque Natural da Serra da Estrela, que tinha ardido em 2017. De lá para cá, o Governo, que «sabe bem» prevenir incêndios, não foi capaz de evitar novas tragédias, ou dotar o País de meios suficientes e eficientes (veja-se o caso do SIRESP) para impedir a destruição do património natural, nem que mais pessoas fiquem sem meios de sustento.

O piscar de olho aos empresários do turismo, que se percebe das palavras da ministra da Presidência, de nada servirá para revitalizar a Estrela se lá não existirem agricultores e pastores todo o ano para a trabalhar e cuidar, ajudando assim a vigiá-la. Por outro lado, se se deixar consumir de cinco em cinco anos, dificilmente haverá mais do que mato para queimar. 

A realidade da seca e das alterações climáticas não pode escamotear a evidente escassez de financiamento, com muitas associações de bombeiros a sobreviver de donativos da população e do apoio das autarquias, e a dificuldade de coordenação gerada pela nova orgânica da Protecção Civil, que desviou a GNR da sua missão de segurança interna e colocou os bombeiros em segundo plano. 

«Há rios na Beira? Descem da Estrela. Há queijo na Beira? Faz-se na Estrela. Há roupa na Beira? Tece-se na Estrela. Há vento na Beira? Sopra-o a Estrela. Há energia eléctrica na Beira? Gera-se na Estrela.», assim constatou Miguel Torga. Que o Governo se inteire disso também. 

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Editorial
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A situação vivida em julho e agosto deste ano no território do Continente, foi antecipada em múltiplos documentos produzidos pelo Observatório Técnico Independente (criado em outubro de 2018 na Assembleia da República e que funcionou até dezembro de 2020), quando alertou para a necessidade de se ter consciência de que as vulnerabilidades estruturais que provocaram os graves incêndios ocorridos em junto e outubro de 2017, estavam por resolver, podendo por isso voltar a repetir-se grandes incêndios, com gravidade equivalente, nos anos subsequentes.

Como os documentos do Observatório assumiram sempre uma dimensão crítica, mas sustentada no ponto de vista técnico e científico, eles foram considerados como obstáculos para a promoção da tal «reforma» de sucesso, que iria revolucionar a nossa floresta e reforçar a sua defesa contra o risco de incêndio, a continuidade da referida estrutura independente foi considerada dispensável.

No encadeamento dos incêndios que têm flagelado o país há mais de um mês, o Governo anunciou que a avaliação destes vai ser realizada por uma Comissão prevista na orgânica da AGIF, apoiada por um conjunto de peritos. Cabe referir que a mencionada comissão integra 17 elementos, 14 dos quais são os primeiros responsáveis de outros tantos organismos do Estado, para além dos presidentes da Associação Nacional de Municípios Portugueses, Associação Nacional de Freguesias e da Liga dos Bombeiros Portugueses. Quanto aos peritos, ninguém sabe qual será a sua missão, modo de funcionamento e enquadramento.

Estamos então na presença de mais uma crise, que permitiria uma reflexão profunda e não comprometida, sobre as políticas seguidas por sucessivos governos ao longo de décadas, dos quais resultou o país com o perfil de território de risco, onde o fogo manda.

A realidade, que nos quiseram fazer crer que se tinha alterado após o verão de 2017, não se alterou na sua substância. É certo que se constatam algumas melhorias no domínio do combate e da defesa das populações, face à ameaça do fogo. Porém, não haja ilusões.

«Estamos então na presença de mais uma crise, que permitiria uma reflexão profunda e não comprometida, sobre as políticas seguidas por sucessivos governos ao longo de décadas, dos quais resultou o país com o perfil de território de risco, onde o fogo manda.»

O conjunto de informações que alguns dos grandes incêndios ocorridos nestes quase dois meses disponibilizam, através de uma análise serena e rigorosa do observado no terreno, permite concluir que há múltiplas insuficiências e fragilidades no território, que estão muito para além da tradicional discussão centrada nas técnicas e estratégias do combate.

O país hoje tem mais de 60% da população concentrada nos principais centros urbanos do litoral, e milhões de hectares abandonados, com acumulação líquida anual de material combustível, cuja gestão não é economicamente viável.

É imprescindível definir políticas de desenvolvimento e ordenamento do território, coerentes e atrativas, que criem atividades e permitam fixar localmente a população ativa, nomeadamente os mais jovens, bem como conter a desistência dos que desesperam por melhores condições de vida.

Só com a mobilização das populações, das autarquias e da comunidade técnica e científica, durante todo o ano (de muitos anos) será possível contrariar a vontade do FOGO, gerada pela negligência política de sucessivos governos.

Ou seja, só com novas políticas se poderá alterar este gravoso ciclo de incêndios e mitigar os seus efeitos, em múltiplas dimensões.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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A opção por uma consulta da população tão expedita só pode fazer sentido, atendendo a que o projecto em si «deixa de lado toda a vertente de usufruto pelas populações e de valorização das suas funções sociais, de lazer, culturais, desportivas, de educação ambiental e histórica», lamenta o PCP.

São «preocupantes» os sinais demonstrados ao longo dos últimos anos que, «evocando» a recuperação do pinhal, podem, na verdade, «vir a abrir caminho para a perversão da matriz, natureza e funções do Pinhal de Leiria».

Designadamente, os comunistas chamam a atenção para o programa Revive Natura. Este projecto «prevê a utilização, e possível alienação, de imóveis propriedade do ICNF na Mata Nacional de Leiria para instalações turísticas privadas e que tem, entre candidaturas em preparação e em fase de conclusão, oito imóveis, de que se destaca pela sua gravidade o Parque do Engenho, na Marinha Grande».

Um plano que assegure a «predominância do Pinheiro Bravo»

No seu comunicado, a estrutura local do PCP apresenta um conjunto de medidas que têm, forçosamente, de ser integradas em qualquer plano sobre o Pinhal de Leiria, caso este pretenda dar resposta aos interesses das populações que lá vivem e dele usufruem. De qualquer forma, «já foi perdido tempo demais».

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Propostas foram entregues ao primeiro-ministro, esta manhã

PCP apresenta plano de apoio às vítimas e prevenção dos fogos

O PCP entregou hoje ao primeiro-ministro as medidas urgentes e de médio-prazo que entende necessárias em matéria de apoio às vítimas dos incêndios florestais da semana passada e da prevenção dos fogos.

IC8 ladeado por floresta queimada, no concelho de Pedrogão Grande, que ardeu durante cinco dias, no incêndio da última semana. 23 de Junho de 2017
CréditosPaulo Novais / Agência LUSA

As propostas foram divulgadas ao início da tarde pelo dirigente comunista João Frazão, numa conferência de imprensa onde afirmou que «prosseguir os mesmos caminhos dá os mesmos resultados». O desordenamento do território e a submissão perante as imposições europeias e os interesses económicos em torno da floresta foram sublinhados como causas dos acontecimentos trágicos no Centro do País.

João Frazão reafirmou o que já tinha dito em Janeiro, aquando do fim do período de discussão pública da reforma da floresta proposta pelo Governo: este não responde aos problemas que estão identificados há muito.

No imediato, os comunistas consideram que é possível aprovar uma lei na Assembleia da República, a curto prazo, contendo as medidas imediatas que consideram necessárias para o apoio às vítimas dos incêndios florestais, de prevenção dos fogos e de reforço dos meios materiais e humanos de combate aos incêndios, nomeadamente no apoio às corporações de bombeiros.

Serviços públicos de proximidade no apoio às vítimas e desbloqueamento de fundos para a recuperação

No plano do apoio às vítimas, a resposta deve passar pelo reforço dos serviços públicos de proximidade, seja no apoio psicológico e médico, através dos centros de saúde e com isenção de taxas moderadoras, seja na afectação de meios da Segurança Social para garantir «celeridade» na atribuição de prestações sociais e de outros apoios, afirmou João Frazão.

O PCP considera ainda urgente o recurso aos fundos do Portugal 2020 e do Programa de Desenvolvimento Regional (PDR) 2020, com a criação de um «quadro excepcional», com comparticipação a 100%, dirigido à «recuperação da actividade económica, do emprego e das infraestruturas» nas áreas ardidas. A identificação das perdas sofridas e as indemnizações às vítimas devem ser garantidas de forma «célere».

Verificação da segurança das estradas e do funcionamento do sistema de telecomunicações

No plano da prevenção dos incêndios florestais, os comunistas colocam em cima da mesa a contratação imediata dos 50 vigilantes da natureza, previsto no Orçamento do Estado. Propõem ainda um levantamento do «cumprimento das regras de defesa da floresta contra incêndios, das redes de faixas de combustível e relativas à defesa de pessoas e bens», assim como «um cronograma e calendarização urgente de medidas» para corrigir as falhas detectadas.

O PCP quer ainda a «verificação da segurança das vias rodoviárias e definição de medidas a tomar», nomeadamente naquelas que são «estruturantes para o acesso de meios de combate a incêndios e de socorro às populações».

João Frazão sublinhou ainda a necessidade de medidas imediatas que garantam a «cobertura integral do território» do sistema de telecomunicações da protecção civil, para que este esteja operacional durante este Verão.

Meios humanos e financeiros para a floresta

Relativamente à floresta, o dirigente comunista elencou um conjunto de propostas entregues esta manhã a António Costa pela delegação do PCP, como o reforço dos sapadores florestais, a reconstituição do corpo de guardas florestais ou a recomposição das estruturas descentralizadas do Ministério da Agricultura.

A valorização do preço da madeira (com intervenção dos ministérios da Agricultura e Economia, da ASAE e da Autoridade da Concorrência) é outra proposta que o PCP já vinha colocando em cima da mesa, a par da limitação da plantação do eucalipto, a valorização das espécies autócones, tal como dos baldios, enquanto propriedade comunitária.

Para os comunistas, o cadastro florestal deve estar concretizado até 2020, mas para tal, alertou João Frazão, é necessária a afectação de meios humanos e financeiros.

Na passada sexta-feira, o PCP realizou uma audição parlamentar com corporações de bombeiros, na qual o secretário-geral do PCP avançou com um conjunto de propostas para o sector, que hoje foram transmitidas a António Costa.

O primeiro-ministro convocou os partidos com representação parlamentar para encontros na residência oficial de São Bento, durante o dia de hoje. Até ao momento, apenas o PCP revelou as propostas que transmitiu a António Costa. De acordo com informação prestada à Lusa pelo gabinete do primeiro-ministro, apenas o PSD não respondeu, que, por sua vez, argumentou não ter sido contactado.

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Propostas foram entregues ao primeiro-ministro, esta manhã
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O plano de recuperação tem de se focar no «combate a espécies invasoras, na preservação e fixação de solos,  protecção e preservação de cursos de água, plantação ou replantação de árvores nas áreas onde tal seja aconselhável, mantendo a matriz do pinhal de predominância do Pinheiro Bravo, e a abertura faseada de todas as vias rodoviárias».

Para este propósito, os comunistas defendem a alocação integral das verbas conseguidas através da venda da madeira queimada do pinhal (cerca de 17 milhões de euros) nos esforços de reflorestação e protecção de um dos principais pulmões de Portugal. Os valores investidos são, no projecto do Governo, inferiores a metade do obtido nas vendas (ou seja, cerca de oito milhões).

Entre um conjunto de outras propostas, desde a gestão pública do parque e a criação de uma rede de transportes, é defendida ainda a «suspensão imediata das componentes do projecto Revive Natura» e a criação, «por decisão do Governo e com atribuição das verbas necessárias», do Museu Nacional da Floresta na Marinha Grande.

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Uma vez mais, anunciam-se medidas de avaliação, através da utilização do bizarro modelo de «lições aprendidas tipo NATO», conforme pomposamente o Governo informou.

Assim, aguardam-se as conclusões deste milagroso modelo, que irá determinar porque estamos a perder a guerra contra o fogo, num momento em que o 'inimigo' parece indiciar que continuará cada vez mais forte, elevando-se assim o grau da ameaça.

Considerações bélicas à parte, o problema dos incêndios rurais tem as suas raízes no facto de sucessivos governos terem abandonado o território à sua sorte, resultando na fuga de populações de muitas freguesias do Continente, deixando ficar nas aldeias e nos lugares do interior centro e norte, aqueles cuja idade, condição social e económica não lhes permite delas sair. Este despovoamento tem como consequência direta a acumulação de combustível no espaço rural e o exponencial aumento da sua vulnerabilidade para a ocorrência de incêndios cada vez mais severos.

Entretanto associado a este problema, há alguns outros que podemos resumir em simples perguntas:

- Para quando uma atuação concertada entre a administração central e os órgãos de administração local, para potenciar uma intervenção de proximidade, de modo a envolver nas soluções as populações e os pequenos e médios proprietários florestais em processos de intervenção e ordenamento florestal?

«os incêndios rurais ameaçam uma significativa parte do território, empobrecem milhares de pessoas e fragilizam o tecido económico e social local»

- Que resultados foram até agora avaliados da missão da Agência de Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF) e dos muitos milhões de euros que gere?

- Que resultados foram produzidos pela comunidade científica, no domínio de I&D, de modo que não tenhamos todos a ideia de que se gasta muito dinheiro em projetos, experiências e ensaios, promovidos por grupos diferenciados oriundos de universidades diferentes, numa espécie de competição estranha e sem resultados consequentes, que incorporem as decisões políticas?

- Para quando o cadastro dos prédios rústicos, como instrumento fundamental para suportar a reestruturação fundiária, sabendo-se que esta é condição determinante para dar dimensão económica e viabilidade às explorações e contrariar o processo de abandono das áreas florestais?

Estas são apenas algumas de muitas das perguntas que continua a ser necessário fazer. 

É mais fácil afirmar que 'não há bombeiros suficientes', que 'os bombeiros não têm formação para o combate aos incêndios florestais' e que 'a coordenação no combate é deficiente'. Afinal, para afirmar isto, basta consultar os 'especialistas' do costume, que há muitos anos dizem sempre o mesmo, incapazes de reconhecer a evolução verificada nesta matéria, sabe-se lá porquê.

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Serra da Estrela: demasiado pouco, demasiado tarde

Ao sétimo dia, o fogo não deu tréguas. O incêndio que deflagra na Serra da Estrela, que se estende por cinco concelhos e consumiu, pelo menos, 16 mil hectares, é sintoma de uma falta de investimento crónica.

Incêndio perto da aldeia de Sameiro, na encosta norte da Serra da Estrela, Covilhã, 9 de Agosto de 2022. 
CréditosMiguel Pereira da Silva / Agência Lusa

Às 12h de sexta-feira, o «incêndio mantém-se com uma frente activa com maior preocupação, na zona entre Videmonte e Linhares, entre o concelho da Guarda e o de Celorico da Beira», anunciou, em conferência de imprensa, Miguel Cruz, segundo comandante da Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil (ANEPC).

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Incêndios: municípios são obrigados a pagar para cumprir as funções do Estado

Durante o período de contingência, decretado por causa da onda de calor, as autarquias vêem-se obrigadas a pagar serviços gratificados às forças de segurança para garantir a vigilância nos seus territórios.

CréditosMiguel A. Lopes / Agência Lusa

A denúncia parte da vereadora Carla Guerreiro, vice-presidente da Câmara Municipal de Setúbal (CMS), concelho que chegou a ser ameaçado pelo grande incêndio que deflagrou, há poucos dias, no concelho vizinho de Palmela.

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Greve dos guardas-florestais ajuda a perceber o que Costa tem tentado explicar

Os guardas-florestais vão estar em greve, esta sexta-feira, contra a falta de efectivos. Primeiro-ministro vem apontando «razões» para os incêndios, sem nunca falar da ausência de investimento público.

Rescaldo de incêndio florestal. Foto de arquivo (2017)
CréditosManuel de Almeida / Agência Lusa

O silêncio do Governo levou a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais (FNSTFPS/CGTP-IN) a convocar uma greve dos guardas-florestais do Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da Guarda Nacional Republicana (GNR). Além da paralisação, está também marcada para amanhã uma concentração, às 12h, em frente ao Ministério da Administração Interna, em Lisboa, com o objectivo de exigir ao Governo o arranque das medidas reivindicadas pelo sector. 

Em Maio, a estrutura sindical reuniu-se com o ministro da Administração Interna, que se comprometeu a realizar nova reunião no espaço de três semanas, mas o encontro nunca aconteceu. Perante a ausência de resposta às reivindicações, como a aprovação da tabela remuneratória específica para a carreira, a atribuição dos suplementos remuneratórios de função e de escala de serviço e a definição da autonomia funcional do corpo de guardas-florestais do SEPNA/GNR, foi marcada nova acção de luta, numa altura em que os incêndios florestais que devastam o País evidenciam décadas de desinvestimento no ordenamento e protecção da floresta, abandono do Interior e negligência da pequena agricultura

Razões há muitas

Desde o início da semana que o primeiro-ministro vem procurando passar a responsabilidade da prevenção (à semelhança do que se verificou na pandemia de covid-19) para os cidadãos, depois de anos a culpabilizar e perseguir os pequenos proprietários, tentando assim encontrar «razões» para o deflagrar dos incêndios, sem nunca assumir o que verdadeiramente tem faltado para os evitar. 

Depois de, no início da semana, ter afirmado que os incêndios «só ocorrem se uma mão humana, voluntariamente ou por distracção, os tiver provocado», António Costa assumiu esta quarta-feira que a causa estrutural dos incêndios é afinal a «floresta desordenada», evidenciando a questão do cadastro florestal, onde a actuação do Estado não tem sido exemplo. 

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Capoulas Santos e a inevitabilidade da seca

O homem que durante anos teve responsabilidades no Ministério da Agricultura fala sobre a seca como um problema a «relativizar», admitindo não haver «grande capacidade de inovação» nesta matéria. 

CréditosAntónio Pedro Santos / Agência Lusa

De forma intermitente, Capoulas Santos (PS) acumula responsabilidades na condução das políticas do Ministério da Agricultura desde a década de 90. Numa entrevista ao Jornal de Negócios e à Antena 1, publicada esta segunda-feira, o novamente eleito nas listas do PS pelo círculo de Évora fala da seca, mas diz que é um problema a «relativizar» por ser um «fenómeno com o qual os portugueses e os agricultores estão confrontados desde sempre». 

Ao mesmo tempo, defende que «não há medidas estruturais» que se possam adoptar para o armazenamento da água, a não ser construir barragens e usar de forma «mais eficiente e parcimoniosa» a água das mesmas.

Capoulas Santos dá o exemplo do Alqueva, no Alentejo. Uma infra-estrutura a que o PS ofereceu resistência e que, sendo essencial no quadro da gestão dos recursos hídricos, está desvirtuada, beneficiando sobretudo os grandes agrários e as suas culturas superintensivas. E foi certamente com este público na ideia que Capoulas Santos afirmou que «os agricultores estão preparados» para viver uma situação «que acontece com regularidade», admitindo ainda que os governos «têm sabido sempre responder com as medidas adequadas».

Como a realidade demonstra, a afirmação não faz eco. E não é preciso recuar muito para perceber que já podia haver medidas implementadas. Em Setembro de 2020, o PS, mas também o PSD e a IL, com a abstenção do BE e do PAN, rejeitaram um projecto de lei com vista a implementar um plano nacional de combate e prevenção aos efeitos da seca.

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Agricultura familiar sem voz na gestão de resíduos

Associação que representa pequenos e médios agricultores considera uma discriminação a sua ausência no órgão consultivo que acompanha a gestão de resíduos em Portugal.

Remoção de resíduos florestais
Créditos / O Instalador

A participação da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) na consulta pública do Plano Nacional de Gestão de Resíduos (PNGR 2030) foi aproveitada para repudiar a discriminação de que é alvo, ao ser excluída do Conselho Consultivo da Comissão de Acompanhamento da Gestão de Resíduos (CAGER), organismo público que acompanha acompanhamento e avaliação de políticas de gestão de resíduos, no âmbito da Agência Portuguesa do Ambiente (APA).

Em comunicado emitido ontem, a CNA realça a importância que reveste a melhor gestão dos resíduos, incluindo os provenientes das actividades agrícolas, e mostra a sua disponibilidade para apontar soluções e ajudar a construir orientações estratégicas nacionais, em conjunto com as diversas entidades (do sector agrícola, do ambiente e outras).

A CNA afirma a sua vontade de contribuir para a melhor prevenção, produção e gestão de resíduos, em conjugação com a manutenção da actividade dos pequenos e médios agricultores e a protecção do ambiente, pelo desenvolvimento do País.

A associação que representa pequenos e médios agricultores lembra que, de acordo com os Dados do Recenseamento Agrícola 2019, a agricultura familiar representa mais de 90% das explorações agrícolas e cerca de 68% da mão-de-obra agrícola em Portugal, estando disseminada por todo o território, com particular incidência nas zonas rurais mais desfavorecidas.

Em portaria governamental publicada em 2016 (Portaria 306/2016, de 7 de Dezembro) o Governo definiu um Conselho Consultivo em que, além de diversos organismos públicos, participam a Associação para a Gestão de Resíduos (ESGRA), a Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente (CPADA), «cada uma das entidades gestoras de fluxos específicos de resíduos», «associações dos operadores de tratamento de resíduos» e «associações de produtores e distribuidores de produtos abrangidos por fluxos específicos de resíduos», mas onde primam pela ausência os representantes dos pequenos e médios agricultores.

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Entre as várias propostas avançadas então pelos comunistas previa-se a implementação de programas de reforço da capacidade de armazenamento de recursos hídricos, mas também de adaptação para as actividades agrícolas e agro-pecuárias, com medidas de apoio específicas para os produtores de raças autóctones, destinadas a salvaguardar a produção em situações de seca e carência hídrica.

Questionado sobre o facto de a agricultura e a pecuária estarem «praticamente ausentes» do programa do PS, Capoulas Santos responde com a preparação de um novo ciclo de fundos comunitários e com a conclusão da última reforma da Política Agrícola Comum (PAC) na vigência da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia. 

Reforma que, recorde-se, mereceu críticas por parte da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), desde logo por manter o incentivo ao agro-negócio e um sistema de mercado «muito desregulado», com a grande maioria dos agricultores portugueses a ter dificuldades para vender as suas produções a preços justos.  

O entrevistado regozijou-se ainda com a criação do Estatuto da Agricultura Familiar, uma reivindicação da CNA desde há várias décadas, como o próprio reconhece, mas omitindo que está por cumprir

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Um ponto que tem escapado à retórica do primeiro-ministro, e que motiva também a paralisação de amanhã, é a falta de guardas-florestais do SEPNA/GNR. Em Maio de 2021, o então ministro da Administração Interna assumiu que Portugal deveria ter mais de 500 guardas-florestais da GNR em 2022, o que não se verificou. Segundo dados do Governo, a GNR conta actualmente com cerca de 400 efectivos, que têm a missão de fiscalizar e investigar «ilícitos nos domínios florestal, caça e pesca». 

A Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais lembra, a este propósito, que em 2006, com a pasta da Administração Interna tutelada por António Costa, o Corpo Nacional da Guarda Florestal foi extinto e os guardas-florestais transferidos «arbitrariamente» para o SEPNA/GNR, assumindo várias competências. Desde então, denuncia a Federação, estes trabalhadores continuam a aguardar um estatuto profissional equivalente aos de outros profissionais. 

Após os incêndios de 2017, o Governo ficou com a incumbência de, na lei de defesa da floresta contra incêndios, reconstituir o Corpo de Escutas Florestais, o que ainda não aconteceu. 

Não obstante as condições climatéricas, cinco anos após os trágicos incêndios de Pedrógão Grande, que devoraram vidas humanas e mais de 80% do Pinhal de Leiria, o País continua a padecer do desinvestimento em política florestal e da exiguidade do financiamento dos bombeiros e da Protecção Civil. 

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Ao impor a proibição de circulação em zonas florestais (medida indispensável no combate aos incêndios), o Governo não se devia, considera a vice-presidente do concelho sadino, esquivar a «garantir dos necessários meios para fiscalizar essa proibição». Isto «sem colocar as câmaras municipais perante a obrigação de pagamento de serviços gratificados» para cumprir uma responsabilidade que deve caber ao Estado central.

Sobre este assunto, e perante as informações que pôde recolher, a CMS realizou, com carácter de urgência, uma reunião do Conselho Municipal de Segurança para discutir esta situação, solicitando, em simultâneo, «uma reunião ao ministro da Administração Interna para procurar soluções para a escassez de recursos humanos das forças da autoridade no concelho».

A autarquia transmitiu, aos representantes da GNR, PSP e Capitania do Porto de Setúbal, a sua preocupação com a escassez de recursos humanos nas forças da autoridade. Esta lacuna resulta na necessidade de pagar por serviços gratificados (para cumprir o despacho do Governo em que se declara a situação de contingência), que já deviam ser assegurados pelo Estado.

Esta «é, inequivocamente, uma função central do Estado e que, no caso do período de contingência, resulta de uma obrigação imposta pelo Governo», defende a autarquia.

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Em Gouveia, a frente já se encontra dominada, progredindo apenas no distrito da Guarda.

No terreno, a enfrentar o incêndio que lavra desde a madrugada de dia 6 de Agosto, estão 1 571 operacionais de todo o país, apoiados por 457 veículos e 15 meios aéreos. Os dados mais recentes do Sistema Europeu de Informação de Fogos Florestais (EFFIS), apontam para a destruição de mais de 16 mil hectares.

Com 70 mil hectares de área ardida desde o início do ano, o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros anunciou ontem, quinta-feira, a autorização da aquisição de mais 81 viaturas de combate a incêndios, a poucas mais de um mês do fim do verão.

O mediatismo da contratação do Sérgio Figueiredo brilha mais do que as chamas

Chega, PSD, Iniciativa Liberal, BE. Naquele que é um dos incêndios mais graves deste ano, que terá já destruído uma área muito substancial do parque natural, património da UNESCO, a maior parte dos partidos escolheram focar-se no faits-divers mediático do momento: a contratação de Sérgio Figueiredo, por parte do ministério de Fernando Medina. 

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A Política Agrícola Comum e os incêndios

Apesar das tímidas reprimendas da Comissão Europeia e de algumas medidas de cosmética por parte do Governo, tudo indica que alguma coisa irá mudar para que tudo fique na mesma.

A Política Agrícola Comum (PAC) continua a concentrar a maioria dos apoios dados à floresta. Por outro lado, todos reconhecem que a crise na pequena agricultura e a desertificação do mundo rural propicia a ocorrência de incêndio, conforme tem demonstrado a realidade. O Plano Estratégico para a PAC (PEPAC) estabelece as regras com as quais o Governo português pretende aplicar os fundos agrícolas de 2023 até 2027. A PAC representa um terço do orçamento da União Europeia e uma verdadeira «bazuca agrícola» que tem sido negociada à socapa entre o governo PS e os grandes interesses que parasitam o sistema desde que entrámos na União Europeia. Um primeiro esboço do PEPAC foi entregue à Comissão Europeia em dezembro do ano passado. Apesar das tímidas reprimendas da Comissão Europeia, que já enviou um conjunto de críticas ao PEPAC, e de algumas medidas de cosmética por parte do Governo, tudo indica que alguma coisa irá mudar para que tudo fique na mesma. Vamos continuar a ter uma PAC que dá mais a quem mais tem, deixando uma migalhas para a esmagadora maioria dos agricultores e, sobretudo, deixando uma ampla parte do nosso território abandonado à sua sorte.

Os mapas que apresentamos ilustram este regabofe no qual as ajudas, em vez de serem canalizadas para quem precisa, são concentradas na grande produção intensiva e no agronegócio. Acompanhamos as piedosas declarações da Comissão Europeia com a falta de respostas do PEPAC relativamente à floresta. No entanto, é necessário explicar que a valorização da floresta e a prevenção dos incêndios implica a revitalização dos territórios, apoiando os sistemas agrícolas que lá resistem apesar de estarem, na sua maioria, abandonados à sua sorte. O mapa da direita fala por si quanto à concentração dos apoios nas regiões do Alentejo, Ribatejo e Trás-os-Montes. Os outros dois mostram a localização dos territórios vulneráveis e a incidência dos incêndios entre 2010 e 2019. O contraste não poderia ser mais evidente. Os territórios vulneráveis são aqueles onde há uma maior prevalência de incêndios e onde são distribuídos menos apoios!

«Vamos continuar a ter uma PAC que dá mais a quem mais tem, deixando uma migalhas para a esmagadora maioria dos agricultores e, sobretudo, deixando uma ampla parte do nosso território abandonado à sua sorte.»

Tal como o PCP tem defendido, não são pequenos remendos que irão mudar a natureza de classe desta PAC. O que Portugal necessita é de colocar os seus recursos ao serviço do desenvolvimento do País e da sua soberania alimentar. É necessária uma verdadeira política de esquerda para a agricultura portuguesa que apoie a pequena e média agricultura, onde 40% dos produtores não recebem qualquer apoio (dados do último Recenseamento Agrícola do INE). É necessário recuperar os serviços de extensão do Ministério da Agricultura que foram definhando sob o jugo das políticas de austeridade. Este será ao mesmo tempo um passo decisivo para a coesão territorial e para a defesa e valorização da nossa floresta, onde predomina, à semelhança do restante espaço rural, o minifúndio. Em suma, é necessária uma política patriótica e de esquerda para a nossa agricultura!

O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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Em contra-ciclo, as direcções regionais do PCP de Castelo Branco e da Guarda divulgaram um comunicado em que sublinham a evidente falta de resposta, do Governo PS, às questões estruturais para a prevenção de incêndios: o «abandono do mundo rural, a degradação dos serviços públicos, a destruição da pequena e média agricultura e pecuária, que resultam na desertificação e no despovoamento».

«Este incêndio em particular, que lavra num Parque Natural, onde o Estado tem responsabilidades directas, traz à evidência não apenas a falácia da responsabilização individual em que o Governo assentou toda a sua retórica este verão, mas também a falta de investimento na área da conservação da natureza».

Desde 2017, sucessivos anúncios caíram em saco roto: o «cadastro florestal, a criação das equipas de sapadores florestais, a reconstituição do corpo de guardas florestais e medidas imprescindíveis no sentido de valorização do preço da madeira, o que impede a gestão activa da floresta, a promoção do livre associativismo dos pequenos proprietários e o impulso adequado aos agrupamentos de baldios e aos projectos promovidos por baldios», lamentas a estruturas do PCP.

Perante a dimensão dos prejuízos e dos impactos no território, o PCP informa, no comunicad, que as suas organizações e militantes «estão no terreno em contacto com as populações e vão realizar uma ronda pelos concelhos afectados com a deputada ao Parlamento Europeu, Sandra Pereira», no dia 16 de Agosto.

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Estudem-se os muitos relatórios produzidos ao longo dos últimos dez anos, analisem-se as medidas políticas adotadas pelos sucessivos governos e os seus resultados, identifiquem-se os riscos e as vulnerabilidades que continuam a potenciar situações explosivas quanto à deflagração e progressão de incêndios e chame-se toda a sociedade a participar na solução.

Para esta missão muitos poderão ser chamados a dar o seu contributo, por exemplo, no âmbito de um Observatório Cívico, que faça perguntas e proponha respostas integradas, tecnicamente sustentadas e livres de interesses corporativos, económicos, académicos ou de qualquer outra natureza.

Deste modo, os incêndios rurais passarão a ser assumidos como coisa séria, que ameaçam uma significativa parte do território, empobrecem milhares de pessoas e fragilizam o tecido económico e social local, apesar das narrativas oficiosas que pretendem fazer querer que a mudança desta situação está a chegar. 

Os incêndios dos passados meses de Julho e Agosto, embora não tenham sido um fenómeno específico do nosso país, assumem particularidades relativas às fragilidades do nosso território, cujo argumento das alterações climáticas – que são uma evidência reconhecida – serve para encobrir essa espécie de fogo que arde e não se vê: ou seja, a falta de uma estratégia de desenvolvimento de uma parte significativa do país.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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