A história já é conhecida, mas desta vez temos uma testemunha na primeira pessoa. Falámos com Frederico Bártolo, jornalista do jornal O JOGO e delegado sindical do Sindicato dos Jornalista, que nos explicou detalhadamente o que se passa na Global Media Group e o que sente quem lá trabalha e vê-se na iminência de ser despedido.
A entrevista foi realizada ontem, segunda-feira, dia 11 de Dezembro. Isto surge para contexto porque ao final do dia o Frederico Bártolo enviou-me uma mensagem com um comunicado que circulou nas redações. O comunicado dizia que «a Comissão Executiva do GMG decidiu tomar um conjunto de medidas urgentes que visam estancar o crescimento dos prejuízos, salvaguardar o número possível de postos de trabalho e evitar a falência do Grupo e das suas empresas».
A preocupação é tanta que, mais uma vez, surgem os avisos. «O momento terá de passar pela contenção de despesas, aumento de receitas, e racionalização de meios e recursos pelo que se torna imperativa também uma nova reorganização empresarial», pode ler-se no mesmo.
A administração diz ter criado um «programa» para «conjugar os interesses do Grupo e dos trabalhadores». Mas que programa é esse? «Um programa de rescisões por mútuo acordo», ao qual «podem candidatar-se ao programa os trabalhadores com idade até 61 anos» e onde «para além dos chamados acertos de saída, um valor correspondente à indemnização legal em caso de despedimento, de acordo com as regras legais em vigor (cálculo da compensação disponível no site da ACT), acrescido de 10% para valores de compensação apurados de até 30.000 euros acrescido de 5% para valores de compensação apurados superiores a 30.000 euros. O total apurado será disponibilizado, de forma repartida, em 18 prestações mensais iguais».
Foi definido que o «programa termina a 20 de dezembro de 2023» e que «as saídas dos trabalhadores, cujo pedido de adesão seja aceite pela Administração, ocorrerão até 31 de janeiro de 2024».
Começava por te perguntar como estás a assistir a toda esta história com o tal Fundo estranho que comprou a Global Media Group? Apesar de achar, até com elementos que vão chegando, que os problemas não começaram com este Fundo. Parece que os problemas já vêm de trás e há agora, se calhar, a consolidação dos tais problemas estruturais que já existiam no grupo. Consegues traçar-me mais ou menos este percurso até ao dia de hoje?
Eu estou há sete anos no Jornal O JOGO, por isso posso falar da experiência que tenho, mas também de acordo com a experiência enquanto delegado sindical. Mais recentemente têm-me sido relatados os vários despedimentos colectivos que têm acontecido no grupo. São quatro desde 2003, o último deles em 2020 que foi declarado como sendo uma «reestruturação» porque as pessoas acabaram por se colocar na possibilidade de saírem pelo próprio pé, mediante acordos. Chamaram «reestruturação» e não «despedimento colectivo» porque as pessoas não foram chamadas ao gabinete e decidido de forma avulsa no fundo, nominal quase, que deveriam sair.
Os problemas no grupo são graves. Já são graves há muito tempo porque tem havido uma precarização total na lógica laboral. Todas as publicações dos meios em questão, e falado das que nós conhecemos: O JOGO, Diário de Notícias, TSF e Jornal de Notícias e as restantes, debatem-se todos os dias com uma lógica de falta de pessoas suficientes para conseguirem entregar o projecto que têm em mãos que é um produto diário.
Temos uma grande dificuldade porque não existe avaliação desde 2016 ou 2017. Logo à partida, não havendo avaliação, como sabes, de dois em dois o trabalhador devia ser promovido com uma subida de escalão e isso não acontece. As pessoas continuam a receber o mesmo que recebiam há dez anos.
O Contrato Colectivo de Trabalho não foi aprovado. A direcção entendeu que não fazia sentido e que não se reviam no Contrato. No caso da TSF é diferente porque é uma questão radiofónica que não está ligada ao mesmo processo dos meios de imprensa escrita. De qualquer das formas, a empresa recusou esse acordo de Contrato Colectivo de Trabalho. Era uma negociação que estávamos a colocar em marcha desde Novembro, que não víamos com solução a bom porto, percebendo que eles tinham uma dificuldade em dar-nos um acréscimo no salário.
Temos dificuldade para colocar férias e para colocar folgas. E isto porquê? Porque somos poucos. Logo, nas folgas que derivam dos feriados, houve uma determinação da empresa de colocar a obrigatoriedade de começarmos a gozar a folga até cinco dias depois de termos tido um feriado. Ora, isso numa redação é bastante impactante porque se temos que gozar naqueles cinco dias a folga do feriado, provavelmente haverá dias que os colegas vão ficar de tal forma tão sobrecarregados que a publicação corre o risco de não sair. A partir daí começámos a perceber o que aí vinha.
As primeiras conversas no final de Outubro com o Fundo de Investimento, e percebendo a dificuldade da administração de Marco Galinha e da sua saída de administrador principal (porque ele continua como investidor), foi-nos dito que ia haver um investimento no Grupo, contratação de profissionais para o DN, contratação de profissionais para uma agência que trataria do público da CPLP e para o Brasil. Também nos foi dito que iria haver uma reformulação (a única coisa estratégica que nos foi comunicada), uma espécie de uma agência onde os jornalistas estivessem inseridos, quase a dizerem que a qualquer momento um jornalista do JN pudesse fazer um serviço e nessa cobertura mediática e jornalística, esse jornalista pudesse fazer uma peça para o DN, para o JN, para O JOGO, para o que fosse. O que nos preocupou porque é não preocupar-se minimamente com a especificidade do jornalismo em questão e de cada plataforma, e obviamente, para um jornalista fazer isto significa que tem um acréscimo imenso nas horas de trabalho, como também entendemos imediatamente que se trataria, provavelmente, de uma redução dos recursos humanos em questão, como já tinha acontecido com a fotografia.
Em 2020, para te dar uma ideia, nós, O JOGO, ficámos sem revisores. Nós só temos apenas duas pessoas que colocam fotos, os gráficos diminuíram, a massa salarial não cresceu… é uma situação de grande dificuldade. O DN viveu exactamente isso, pelos vistos, dez pessoas entraram no DN e quase vinte pessoas entraram para fazer um projecto para a tal comunidade de língua oficial portuguesa. Portanto, houve um investimento. Causa-nos imenso espanto que no final do mês de Novembro sejamos confrontados com o não pagamento a tempo dos salários, que entretanto já foram regularizados, mas a comunicação que o subsídio de Natal teria que ser em duodécimos até Dezembro do próximo ano, o que consideramos ilegal e vamos reportar.
Juntando a isto, a informação da «reestruturação» que inicialmente era determinada, ou seja, colocava um determinado número de despedimentos por cada periódico. No caso d’O JOGO o número era indefinido, mas estabelecido para o DN e JN e que agora foi alterado para 150 a 200 trabalhadores. Não só aumentaram o número como deixaram de identificar as publicações em que iam despedir, o que significa um convite claro a quem queira sair para que a empresa não tenha que pagar acordos, porque estão à espera que, obviamente, que as pessoas se ofereçam, se voluntariem, de modo a baixarem o valor ressarcido. Este é o panorama.
Era aqui que queria pegar. Já li comunicados dos sindicatos e nos primeiros que li vinha exactamente esta questão dos 150 a 200 despedimentos como um elemento de chantagem. O retrato que tu também fazes é de um constante ataque e até elementos de pressão para os trabalhadores poderem ir saindo pelo próprio pé, ou seja, salários em atraso e agora este elemento do subsídio de natal ser pago em duodécimos… Tu achas que ameaça de despedimentos é mesmo objectiva, que se vai efectivamente realizar, ou não passa mesmo de um elemento de chantagem e associado a isso é que surgem os elementos de desregulação laboral e ataque a direitos?
A partir do momento em que a Global Media Grupo anuncia em comunicado interno que «toma um conjunto de medidas urgentes para estancar o crescimento dos prejuízos, salvaguardar o número possível de postos de trabalho, evitar a falência do grupo e das suas empresas», falando em prejuízos na ordem dos 39 milhões de euros, sendo que para isto estava um prejuízo global que ultrapassa os sete milhões de euros, eu tenho que acreditar que isto não é apenas uma ameaça vã, eu quero considerar que não é apenas uma chantagem, que é uma realidade que nos vai assaltar. Daí a importância de nos movimentarmos rapidamente, não só para pedirmos esclarecimentos sobre esta dívida. Eu acabei de ler-te um comunicado da Global Media Group porquê? Porque é a informação que temos, não há um relatório de contas que nos forneça esta informação e estranhamos que um grupo consolidado que tenha bastante consciência do que é trabalhar com finança, prometa investimentos e um mês depois esteja a anunciar despedimentos e despedimentos massivos. Não estamos a falar, sequer, de poucos despedimentos. Considero uma situação gravíssima porque é realmente uma situação de… teria que recuar. Provavelmente é o maior que o grupo já viu, não quero afirmar isso, mas é certamente um dos maiores na comunicação social portuguesa. Em termos recentes tivemos agora o caso d’A BOLA. Por isso eu entendo que sim, é uma tentativa, há um convite para as pessoas meterem a cabeça no cepo, é verdade, mas acho que a ameaça é real e devemos encara-la assim.
Estava a ouvir-te e a pensar que há um elemento comum em toda a história: a total falta de transparência e de comunicação com quem compra o grupo, Administração e depois com os trabalhadores. Mas não é só aí, também no próprio Fundo que compra o grupo que também, ele próprio é pouco transparente. Aliás, nós no AbrilAbril escrevemos sobre isso mesmo e vemos pouco isso escrito. Ou seja, é um Fundo que tem a sua sede num paraíso fiscal nas Bahamas, ninguém sabe bem qual é a sua composição, apenas quem o detém. Quando o Fundo de Investimento comprou a Global Media, qual foi a reação dos trabalhadores? Era expectativa, compreensão pelas justificações dadas pelas empresas de Marco Galinha, ou apreensão pelo que podia aí vir?
Um dos grandes problemas muitas vezes é que nós estamos demasiado focados em dar a notícia e não pensamos no nosso caso enquanto trabalhadores e enquanto protagonistas da notícia. Deixa-me que te diga: a título pessoal, em nome de Frederico Bártolo, eu desconfio sempre e tudo o que não tem cara gera-me alguma apreensão, mas não posso falar por todos e não vou falar por todos. Aquilo que posso dizer é que neste momento gera apreensão a qualquer profissional dos média uma aquisição, uma transformação, uma mudança dos direitos e da administração de qualquer grupo de comunicação social. Posso garantir-te que isto estende-se a todos os grupos e a todos os jornalistas porque temos perfeita noção como é neste momento um mercado frágil, um mercado fácil de se entrar, um mercado que não dá lucro e que por isso mesmo está muito vulnerável a vários poderes. Seja venda, de audiências, seja de critérios editoriais que são alterados consoante os grupos que entram, seja na tentativa constante de se reduzirem equipas de modo a promoverem-se as flexibilizações e as precarizações de modo a combater dívidas… eu não quero entrar nas dívidas, de modo a que quem manda, que as administrações sintam que as publicações são mais sustentáveis.
Eu não tenho informação que exista a dívida, eu tenho informação do comunicado interno. Gosto de me basear pelas contas e causa-me estranheza estas contas. O que também me causa muita estranheza é que o administrador Marco Galinha que esteve no projecto também sabia das contas. Em Agosto, quando há a venda, estavam a contar o tal valor investido porque o Governo estava na altura estudar a aquisição das participações da Global Media, os 23,36% mais 22,35% do Grupo Bel no caso, em relação à Agência Lusa. A partir do momento em que deixasse de ter interesse estratégico criou um fosso gigante no grupo e foi isso que justificou, no fundo, que não existisse capacidade para que o fundo suiço, o Union Capital Group, conseguisse aguentar os trabalhadores e a mesma massa salarial e também o investimento nas várias publicações. Mas ao mesmo tempo o fundo não fala em extinguir meios de comunicação. O fundo ainda não falou sequer em estrategicamente se faz sentido continuar as publicações em papel ou não, se as publicações vão passar a ser bissemanais ou não, se vão passar a ser semanais ou não. Nós não temos qualquer tipo de informação. Por isso o que estranhamos é que, sem saber qualquer estratégia do grupo ou o quererem saber, a primeira missiva seja cortar salários, seja cortar os subsídios de natal, seja colocar em cima da mesa esta questão do despedimento colectivo que na minha opinião é de longe o mais grave.
Esta é a parte em que te pergunto qual é actualmente o ambiente geral da tua redação, d'O JOGO? Têm vindo notícias a público (muitas) sobre o JN, como tu disseste, no mês passado ou há um mês e meio houve notícias sobre a TSF. Pergunto-te também se tens falado com as restantes redações do grupo?
Total tristeza, preocupação, consternação com o ambiente que se vive, até porque como dizia, em 2020 viveu-se uma situação semelhante com saídas de profissionais que acabaram de sair pelo próprio pé por decisão individual, mas que iria ameaçar vários postos de trabalho. E antes disso outros dois despedimentos coletivos desde 2003. Ainda assim, em 2020 houve vários que tiveram que sair porque houve extinção do posto de trabalho, como é o caso da fotografia, na revisão, na colocação de fotos… por isso quando se fala desta lógica da «reestrutuação», eu não gosto. Eu gosto de falar de despedimento porque é o caso, houve extinção do posto de trabalho e é importante referir. Só não existiram mais despedimentos porque houve outros profissionais que se colocaram dispostos a sair.
Em relação à minha redação, posso falar da minha e de todas porque enquanto delegado sindical tenho estado em contacto com todas. Temos uma acção na quarta-feira com o ministro da Cultura e vamos à comissão parlamentar na semana seguinte. Gostaríamos de ter essa oportunidade para explicarmos, não só como está esta situação, mas também a precarização constante.
Acho que é por isso que as pessoas desconfiam imediatamente cada vez que há uma mudança de administração e desconfiam totalmente de que haja uma alteração positiva, uma alteração para crescer, para investir, para dar condições salariais. Por isso vejo tristeza em todas as publicações do grupo. Vejo medo. Pode-se falar disso neste momento. Medo não só dos jornalistas, porque nós só falamos de jornalistas, mas o grupo é muito grande. Estamos a falar de pessoas que não estão tão protegidas do ponto de vista sindical, estamos a falar de representantes comerciais, de pessoas que trabalham directamente com as redes sociais, pessoas que trabalho com o vídeo, pessoas do marketing, da agenda, da secretaria, dos recursos humanos. Não estamos a falar só de jornalistas, as pessoas esquecem-se muitas vezes disto. Uma redação não funciona sem toda esta organização. Neste momento acho que é um estado absolutamente geral comum ao grupo e por isto é daí que o O JOGO, no caso, se tenha associado às manifestações e à greve que inicialmente foi convocada para o JN, mas que se tornou extensível ao grupo dada a comunicação de um despedimento colectivo e em todas as acções vamos estar solidários, e a pensar em acções a título individual que são importantes queremos que as pessoas se juntem a nós.
Li que se vai realizar o 5º Congresso dos Jornalistas e falamos de um congresso que se vai realizar numa altura particularmente e infelizmente interessante. Falaste já d’A BOLA, mas podemos falar de um vasto conjunto de órgãos de comunicação, jornais, rádios e revistas. Tu encaras que a classe dos jornalistas está toda a ver o problema que se está a passar com uma grande desregulação laboral e um grande ataque ao jornalismo? Consideras que há uma noção de que o jornalismo está em perigo?
Sim, o jornalismo está em perigo e de várias formas. Já esteve em outras alturas, mas está claramente em perigo. Está em perigo pela lógica de audiências nas televisões e nas rádios. No caso dos jornais existe um problema económico, estamos cada vez mais dependentes da publicidade e dos interesses económicos para sustentar os conteúdos, para fazermos conteúdos que entendemos que sejam os mais importantes. Estamos muito dependentes do dinheiro que vem da publicidade e estamos muito dependentes daquilo que são as linhas editoriais traçadas pelos administradores, pelos fundos, pelos grupos de administração, pelos consórcios. Enquanto os jornalistas têm uma ética e responsabilidade social e uma necessidade de cumprir o seu código deontológico, quem é a instituição que manda, quem tutela os órgãos de comunicação social, muitas vezes não tem essa preocupação nem essa obrigação. É um problema que se estende aos códigos deontológicos que afectam os jornalistas, os editores, os chefes de redação e até os directores, mas que depois esbarra no problema na ideia de que quem está fora do jornalismo.
Era por aí que queria ir, até porque também falaste do ministro. A compra da Global Media foi aprovada pela ERC após análise. Uma entidade reguladora deu um parecer positivo à compra. Qual é o posicionamento do Governo? Mesmo admitindo que já está em gestão, a compra não é de agora e já tinha conhecimento.
Não temos informação. Se quiseres posso dar-te essa informação na quarta-feira depois da comissão e com base nos colegas que lá vão, mas não sei se irá por aí. O que o ministro nos manifestou foi solidariedade e atenção ao caso, mas não foi uma posição crítica de oposição. Por isso não consigo responder.
Eu pergunto-te isto porque no fundo isto é questão central. Não é só quem detém um grupo de comunicação, é a maneira como quem detém um grupo de comunicação pode condicionar a própria informação e, por sua vez, não só a qualidade da informação, mas também a democracia. No final de contas é isto que está em causa. Uma forma de colocar em causa a democracia é penalizar directamente os trabalhadores que fazem as redações que, como tu disseste, não são só os jornalistas, é toda uma equipa que está a meter jornais a funcionar. Mas para terminar, o que é que achas que daqui sairá? A pergunta pode ser injusta, mas há um problema objectivo e também uma grande capacidade organizativa que vocês trabalhadores têm e vão sempre colocar em marcha. O que esperas e quais os próximos passos a dar?
Deixa-me só voltar um bocadinho atrás do que é o mais importante e aqui, até porque sou representante sindical e tenho que passar esta mensagem. Estou muitas vezes do teu lado, estou a maioria das vezes do teu lado e sei como as coisas funcionam e é importante dizer isto: a coisa mais importante aqui, independentemente de percebermos que o estado do jornalismo não é bom, que temos que lutar contra precariedade, que deveria haver um controlo claro sobre quem pode ou não pode deter grupos de média, pelo menos justificar as linhas estratégicas e dar cara por elas, mas neste momento o mais importante são os 150 a 200 despedimentos que podem haver. É essa a minha preocupação. Quando tens alguém a dizer-te, antes de um plenário, volto a dizer, alguém que não esteja previsto no sindicato como os comerciais ou a fotografia, a dizer-te «luta por nós», tudo o resto deixa de ter impacto.
A partir deste momento, a nossa possível mudança das Torres de Lisboa para o Taguspark que é uma mudança que nos vai afectar a todos deixa-nos enfurecidos pela forma como foi decidida, como vai ser efectuada. Mas de repente todos nos vemos confrontados com a ideia de perder trabalho e perder trabalho é a coisa mais grave que pode existir. Então, nesse sentido, só quero reforçar aqui que a nossa batalha neste momento é essa e que essa é a parte mais importante de todo este processo. Neste momento é um Fundo de Investimento? Certo! Mas em outras alturas foi um grupo de Angola, anteriormente existiram presença da China e da Rússia que nunca se perceberem e com posições minoritárias no grupo, na altura na ControlInveste, e o problema foi o mesmo.
Aqui, o que pedimos é um apoio por parte do Estado porque se há dívida, que haja um trabalho colectivo de forma a que as pessoas não sejam penalizadas. Não são as pessoas que são responsáveis pela dívida, não são os trabalhadores que fazem os jornais são responsáveis pela dívida. Existem responsáveis para trás. As equipas de administração, se são tão competentes para falar em dividendos, também têm que ser competentes para falar em dívidas. É isso que nós exigimos. Exigimos que não exista sempre esta tendência de quando é preciso reduzir que seja por via dos trabalhadores. Por isso é que te digo que neste momento o nosso estado de espírito é de total desânimo porque acreditamos que é uma situação que não tem mudado ao longo dos anos e, é daí que o nosso espírito passa a ser combativo na lógica de tentar evitar qualquer despedimento. Qualquer despedimento é uma derrota para nós. É por aí que nos guiamos nesta fase. Estamos a lutar de modo a que daqui a um mês ou dois meses esta acção possa recuar. Agora, vemos com preocupação e desânimo porque tememos que sem os devidos apoios estatais se venha a confirmar, ou pelo menos alguns despedimentos se venham a confirmar. E reafirmo: qualquer despedimento é uma derrota.
No outro dia, no É ou Não É da RTP discutia-se o jornalismo e um dos temas à discussão era precisamente os apoios públicos ao mesmo. Há muita gente que acha que condiciona. Qual é a tua opinião sobre isso?
Acho que depende do Governo, sinceramente. Pode condicionar, mas também acho que os Governos têm que estabelecer as suas linhas prioritárias e o jornalismo, fazendo parte da democracia, devia ter um apoio muito mais eficaz. Não é só em termos financeiros. Estamos a falar do tal controlo de quem entra para os grupos de mídia, a manutenção de uma linha editorial devidamente definida e deviam zelar-se na minha opinião por marcas… eu nem gosto muito de falar de marcas que é uma linguagem empresarial. A melhor expressão é «símbolos». Estamos a falar do DN, e eu já nem estou a falar do meu jornal em questão que é um desportivo, é especializado, e admito que seja um pouco diferente. Mas no DN estamos a falar de uma marca, uma marca centenária que teve um impacto determinante na democracia e que se regeu em muitos momentos por critérios editoriais apertados de escrever a verdade, mas de saber escrever a verdade. Essa deontologia muitas vezes falta em quem nos obriga a escrever de outra forma, ou em quem nos tenta fazer escrever de outra forma. Então acho que sim.
A partir do momento em que existe a ERC que é um órgão que tem um objectivo de tentar gerir tudo aquilo que se vai passando nos meios de comunicação social, significa que reconhecem que os meios de comunicação têm um impacto decisivo na sociedade e como tal devem ser geridos. Só que depois, parece-me que há uma total permissão em várias coisas que acabam de fazer da própria ERC de um órgão com pouca soberania e pouca decisão, ou extremamente susceptível ao que vai aparecendo. Por isso não falamos só da participação financeira do Governo como estamos de uma Agência Lusa. Estamos a falar por exemplo, no período do lay-off, durante a pandemia, em que existiu um apoio importante do Governo às empresas, nomeadamente o sector da comunicação social recebeu apoios. Podemos depois discutir se os apoios foram justos ou injustos, até porque na minha opinião uma televisão precisa de apoios diferentes do que a imprensa escrita e os dados são muito claros. A publicidade rende mais na televisão, as audiências são maiores na televisão e os custos em termos de produção de um jornal e de uma televisão não são assim tão diferentes. O que se vê, infelizmente, é que os hábitos de leitura diminuíram, logo tudo aquilo que seja o trabalho na imprensa escrita, à partida um jornalista de imprensa escrita será menos remunerado do que será numa televisão. A própria rádio sentiu dificuldades e tem vindo a melhorar ligeiramente, mas é extremamente susceptível à questão da publicidade. Há a coisa do patrocínio, os programas pagos. É certo que informam que são patrocínios, que é melhor que um conteúdo que é disfarçado de entretenimento.
Mas ainda assim é notório que toda a comunicação social precisa de uma ajuda financeira e depois em termos éticos, em termos de conteúdo, precisa de uma regulamentação mais forte que impeça que haja uma promiscuidade entre aquilo que são os fundos de investimento e grupos de administração interferirem na lógica da produção de um jornal.
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