Potenciado pelo estado fenológico e carga disponível de combustível e por um fenómeno meteorológico extremo, este incêndio teve como consequência a morte de 64 cidadãos, 254 feridos, elevados danos em habitações, empresas, infraestruturas, culturas e floresta.
Foram muitos os relatórios produzidos, enquanto instrumentos de análise e estudo para identificar as causas, debilidades e responsabilidades que pudessem explicar tão dramática circunstância. Estes documentos disponibilizaram um vasto conjunto de indicadores, tanto do ponto de vista da explicação técnica e científica do ocorrido, como da identificação das lacunas de ação politica de sucessivos governos, que conduziram o território rural à situação de risco em que se encontra.
Muitas das medidas identificadas e propostas pelos mencionados relatórios foram adotadas pelo Governo, tanto impulsionadas por este incêndio como pelos que voltaram a flagelar a região norte e centro do país, de 14 a 16 de outubro do mesmo ano. Porém, foram-no de uma forma desgarrada, nuns casos justificadas pela emergência das situações em causa, mas noutros apenas pela necessidade de preencher a agenda mediática e responder à pressão das oposições parlamentares.
Um ano depois, com seriedade e rigor, ninguém pode garantir a impossibilidade de se repetirem incêndios florestais com as características dos verificados em 2017, potenciados por condições pirometeorológicas propicias, num cenário em que, de acordo com o mais recente relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) se prevê um aumento da temperatura global em cerca de 4,8 graus centígrados e uma diminuição da humidade no ar e nos solos.
Para alem disto, acresce a fragilidade de uma população envelhecida em territórios de baixa densidade, abandonados e sem perspetiva de futuro, circunstancia que aumenta o potencial de risco. Assim, o que importa é criar as efetivas condições para reduzir o risco e aprimorar os sistemas de alerta e socorro, para que as populações possam aumentar a sua resiliência para lidar com tais incêndios.
Mal refeita do choque do incêndio de Pedrógão Grande a sociedade despertou para a problemática dos incêndios florestais e deixou de considera-los como um acontecimento recorrente do verão português, como se de uma fatalidade se tratasse.
Dir-se-á que é preciso renascer das cinzas e não insistir na discussão à volta do que aconteceu há um ano, concentrando esforços e ação para que a tragédia provocada pelos incêndios não se repita, uma vez que temos por adquirido que vamos continuar a enfrentar grandes incêndios. Discordo desta argumentação.
Sim é preciso continuar a analisar, estudar e concluir sobre o que aconteceu em Portugal em 2017. Sim é preciso continuar a debater as vulnerabilidades do território, dos sistemas de proteção e socorro das pessoas, bem como da ação politica – a nível local e central – visando a melhoria da sua qualidade e adequação.
E isto porque não podemos remeter para o arquivo da memória – tantas vezes utilizado como instrumento de desresponsabilização individual e coletiva – o que deve continuar a ser matéria para reflexão e imperativo para a ação.
As 115 vítimas mortais dos incêndios florestais de junho e outubro de 2017, bem como todos os sobreviventes que viram as suas vidas totalmente devastadas em consequência da referida catástrofe, impõem que continuemos a procurar respostas, não numa perspetiva persecutória para pessoas e instituições, mas apenas para que todos ajudemos todos a agir melhor.
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