Além da revelação da crua realidade do terreno, a presença dos representantes da Associação de Bolseiros de Investigação Científica (ABIC) na Comissão Parlamentar de Educação e Ciência, por requerimento do PCP, serviu para desmistificar as afirmações do ministro Manuel Heitor, que numa entrevista recente dava a garantia de haver «pleno emprego» entre os doutorados.
Nuno Peixinho, da direcção da ABIC, considera a afirmação uma «afronta», sublinhando que o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior «confunde anúncio com realização», servindo-se dos dados do Observatório do Emprego Científico (que traduziu como «um pobre assessor em frente a um computador a preencher uma folha Excel») para afirmar que só um terço dos contratos para doutorados previsto para esta legislatura foi formalizado.
«A poucos meses do fim da legislatura ainda estão por celebrar mais de 4000 concursos para doutorados», disse, atribuindo esta situação à má gestão do processo por parte da tutela.
Citando o ministro Manuel Heitor, o investigador acrescentou que o «sucesso» do Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração Pública (PREVPAP) para carreiras especiais «devia envergonhar o ministro, que continua a permitir que existam altos níveis de precariedade» na docência e no Ensino Superior.
Se, por um lado, as taxas de aprovação de casos de PREVPAP na docência e na investigação são «demasiado baixas», por outro encontram-se situações de doutorados com bolsas, mas sem perspectivas de passarem a contrato; sem qualquer emprego ou à espera de um contrato que tarda em sair.
«Deixa de ter rendimentos para viver»
No entender de Sandra Pereira, presidente da ABIC, o combate à precariedade faz-se «consolidando a posição de quem já está no sistema», evitando que quem entra agora tenha pela frente um longo percurso de contratos precários, seja através de bolsas ou de contratos a prazo.
Entre as denúncias feitas esta manhã pela dirigente estão os «constantes atrasos» no pagamento das bolsas atribuídas pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Sandra Pereira defende que «alguma coisa tem que mudar na FCT», sendo «inaceitável» que uma pessoa, com bolsa atribuída a partir de Janeiro, não tenha contrato assinado, nem tenha começado a receber a bolsa, passados três ou quatro meses.
A esta questão associa-se a da exclusividade, que Sandra Pereira diz ser melhor deixar cair «para que as pessoas possam manter algum tipo de rendimento» enquanto não começam a receber da FCT. «A pessoa desemprega-se e depois deixa de ter rendimentos para viver», critica a dirigente, acrescentando que, se a FCT não tem meios, cabe ao ministério fazer face às suas carências.
Relativamente ao decreto-lei 57/2016, que tem uma norma transitória para que sejam abertos concursos para 2000 bolseiros, Sandra Pereira defendeu que, «apesar de todas as suas limitações, é um contrato de trabalho», lamentando que, depois de uma legislatura a tentar aplicá-lo, o ministro «venha dizer que vai fazer a revisão do estatuto e aquilo que muda é que as bolsas de pós-doutoramento deixam de ser de seis anos e passam a ser de três».
Contribui para uma boa ideia
Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.
O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.
Contribui aqui