Mensagem de erro

User warning: The following module is missing from the file system: standard. For information about how to fix this, see the documentation page. in _drupal_trigger_error_with_delayed_logging() (line 1143 of /home/abrilabril/public_html/includes/bootstrap.inc).

|Índia

Vendedores ambulantes resistem em Calcutá e na Índia

Em plena onda de neoliberalização do espaço público e de «ambientalismo burguês», os vendedores ambulantes são expulsos do centro, para que a elite se aproprie do espaço. Mas a «fealdade» da produção resiste.

Vendedor ambulante Créditos / Newsclick

Num artigo publicado esta segunda-feira no portal Newsclick, intitulado «Kolkata Hawkers: Politics of 'Illegality' and Urban Poor» (Vendedores ambulantes de Calcutá: Política de "ilegalidade" e pobreza urbana», Ankush Pal afirma que as cidades indianas se têm estado a tentar colocar a um nível de «classe mundial», com recurso «ao emprego da retórica do "desenvolvimento" para garantir que têm uma aparência estética».

Isso traduz-se na «remoção de sinais de atraso e pobreza», explica, acrescentando que, em muitos casos, se passou a usar o termo «invasores» contra «intervenientes informais urbanos», entre os quais se incluem mendigos, ocupas e vendedores ambulantes, que são deslocados para que «a elite» se consiga apropriar do espaço público, estacionando carros e aumentando as suas casas em vias pedonais, sem grandes objecções.

«A neoliberalização dos espaços públicos levou a um aumento da necessidade de regular a utilização do espaço público», algo a que se pôde assistir no período que antecedeu a Cimeira do G20 em Nova Déli, «quando a lei atingiu de forma desproporcional os mais desfavorecidos, à custa de embelezar a cidade».

Em Calcutá, os vendedores ambulantes representam um dos sectores mais amplos e mais organizados da economia informal e têm enfrentado, ao longo dos anos, a ameaça constante de serem deslocados, ao mesmo tempo que resistem a ela, lembra o autor.

Em simultâneo, apela ao conceito de «ambientalismo burguês» por via da socióloga Amita Baviskar, que explica como «um sentido de moralidade e estética da classe alta» domina o discurso do espaço público, que pede a remoção da «fealdade» da produção para fora da vista, empurrando-a para fora da cidade.

Numa cidade, Calcutá, em que sempre se encarou os vendedores ambulantes como destruidores da estética – «construída e enraizada numa ideia de glória colonial» –, no final de Junho, a ministra-chefe de Bengala Ocidental, Mamata Banerjee, levantou preocupações sobre «invasões» dos passeios e extorsão, ao discursar numa reunião com várias autoridades civis e altos funcionários da Polícia.

No dia seguinte, Polícia e outras autoridades entraram em acção, removendo bancas de vendedores ambulantes em Calcutá e noutros pontos do estado, deixando os vendedores preocupados com as perdas que iriam sofrer e algumas das zonas mais movimentadas de Calcutá com um ar deserto.

«A venda ambulante tem sido vista como um obstáculo e uma obstrução à imagem de "classe mundial" que as cidades de todo o país perseguem há já algum tempo», afirma Ankush Pal, sublinhando que isto ocorre num contexto em que académicos e activistas se posicionam a favor dos vendedores, mostrando «como são parte integrante da economia informal que contribui para a riqueza do país».

«A venda ambulante evoluiu como um meio de sobrevivência para os marginalizados, adoptado principalmente pelos que foram afectados pelas crises económicas e pela migração em grande escala induzida pela Partição [de Bengala, em 1947]».

Na obra Streets in Motion. The Making of Infrastructure, Property, and Political Culture in Twentieth-century Calcutta, o historiador Ritajyoti Bandopadhyay mostra como os grupos sociais que se envolveram na venda ambulante foram mudando com o tempo, e como «a profissão sobreviveu e foi útil para quem dela necessitava».

Um «espectáculo planeado»

Bandopadhyay – refere o autor – acha que a campanha de despejos levada a cabo pelo executivo de Bengala Ocidental é «um espectáculo planeado e um acto de equilíbrio» por parte do governo liderado por Mamata Banerjee, para poder «dar à classe média uma sensação de segurança», de que também liga aos seus interesses.

Trata-se de uma nova classe média e que «tem encorajado políticas de transformação das metrópoles em cidades de classe mundial». Tal como eles, também os que vivem nos condomínios fechados pedem que «as cidades sejam limpas e postas na ordem».

No entanto, o historiador lembra que é a própria classe trabalhadora que vai trabalhar nas limpezas desses condomínios que depende dos vendedores ambulantes, que lhes fornecem as suas refeições diárias – seja porque transportar alimentos é pouco viável, seja porque alguns acham mais conveniente comer num vendedor do que cozinhar de madrugada, antes de saírem para trabalhar todo o dia.

Uma parte integrante da vida de Calcutá

Apesar da repressão, das tentativas de despejo e recolocação sucessivas que têm sofrido, os vendedores ambulantes têm resistido ao longo dos anos, junto a mercados, escritórios ou universidades, sobretudo porque um grande número de pessoas prefere comprar a preços mais baixos do que no comércio estabelecido.

É disso que fala Sukriti, uma estudante de Direito, que lembra que os vendedores não trabalham numa lógica de «lucros abissais» mas são capazes de se sustentar ao apresentarem uma alternativa a quem não tem possibilidade de comer em complexos comerciais.

Os preços nos cafés e restaurantes são no mínimo cinco vezes superiores, aponta, ao mesmo tempo que justifica o facto de tantos estudantes e trabalhadores recorrerem aos vendedores de rua: «Nem toda a gente pode gastar mais de 500 rupias [5,5 euros] por dia em comida.»

Por seu lado, Rounak, membro da organização Jatiyo Bangla Sammelan (JaBaS), que também coordena um sindicato de vendedores ambulantes, defende de modo enfático que estes «sempre existirão» e que, «por mais que os super-ricos argumentem, a ausência dos vendedores de rua seria preocupante, com as grandes corporações a ganharem o monopólio».

Nabarun, um vendedor ambulante de comida chinesa na zona de Rabindra Sadan, acredita que o governo não os pode manter afastados, a ele e aos outros vendedores, e chama a atenção para outras questões.

«Os do partido e da Polícia extorquem-nos dinheiro com regularidade, e nós podemos pagar-lhes porque as pessoas compram na minha banca e noutras por aqui», afirma.

«Sabes, as outras grandes lojas aqui não são acessíveis à maioria das pessoas que vão para a faculdade ou trabalham nos escritórios das redondezas, e eu estou aqui para elas. Claro que ganho o meu e sustento a minha família, mas também sirvo as pessoas, disponibilizando-lhes alimentos a preços acessíveis», declarou.

Tópico

Contribui para uma boa ideia

Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.

O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.

Contribui aqui