Os CTT obtiveram no ano passado um resultado líquido consolidado de 38,4 milhões de euros, «21,7 milhões de euros acima do obtido em 2020», refere a empresa em comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).
No período em análise, os rendimentos operacionais subiram 13,8% para 847,9 milhões de euros, «reflectindo um consistente processo de transformação do negócio com menor dependência do correio tradicional», sendo que esta tendência «foi sustentada pelo crescimento da área Expresso e Encomendas (+32,5% face a 2020), do Banco CTT (+20,4% face a 2020) e dos serviços financeiros e retalho (+11%)».
Desde a privatização da empresa, que em Janeiro propôs aumentos salariais de 13 cêntimos, que o registo de lucros e distribuição de dividendos tem convivido com o encerramento de estações e a livre degradação do serviço postal.
O Governo assume a submissão total face às reivindicações de Manuel Champalimaud e demais accionistas dos CTT, através da resolução do Conselho de Ministros publicada em Diário da República. A realidade é tramada. Estava o Governo – e os comentadores do costume – tão empolgado em demonstrar que estamos perante o governo mais à esquerda desde o Conselho de Comissários do Povo, e que os Decretos da Paz e da Terra só não iam entrar em vigor por culpa do voto contra do PCP ao Orçamento do Estado, e eis que sai o Diário da República de 3 de Novembro com mais uma dose de realidade pura e dura (como se não chegasse o estado do SNS, os salários congelados, o preço das rendas e da energia, a habitação inacessível, etc.). Veio esta realidade na forma da publicação da resolução do Conselho de Ministros sobre os CTT, aprovada ainda em Setembro, mas que só agora viu a luz do dia (coincidências...). E não é que o Governo ajoelha soezmente aos pés das reivindicações de Manuel Champalimaud e demais accionistas dos CTT? É que a submissão é total. Vejamos alguns exemplos: – Os capitalistas que esmifram a concessão pública vinham-se queixando do facto de a ANACOM não se submeter aos seus ditames (o que de facto é uma raridade, pois os reguladores independentes foram criados para serem independentes do poder político e submissos ao poder económico). E o Governo determina que «os parâmetros de qualidade do Serviço Postal Universal e os objectivos de desempenho passam a ser definidos pelo concedente», deixando de ser fixados pela ANACOM como prevê a Lei Postal! «E o Governo «mais à esquerda» de que alguns têm memória e outros expectativa (o que diz muito dessa memória e dessa expectativa, e pouco deste Governo), decide entregar por «ajuste directo» a um grupo capitalista a concessão do Serviço Postal Universal, passando a pagar por um serviço que sempre foi lucrativo no Estado, e permitindo a continuação da brutal degradação do serviço postal.» – Os capitalistas que esbulham os utentes dos Correios vinham reclamando do facto de a ANACOM não os autorizar a maiores aumentos de preços (apesar de terem desde a privatização já imposto um aumento de 56% na tarifa base). Pois o Governo determina «que os preços são aprovados pelo Governo, sob proposta da concessionária», em vez de serem fixados pela ANACOM como determina a Lei Postal em vigor. O carácter «revolucionário» da resolução só é reflectido pelo facto de a mesma determinar que, como a lei actual não permite ao Governo fazer o que quer, o Governo irá primeiro mudar a lei por decreto e depois fazer o contrato com o privado. Tudo antes de 31 de Dezembro. E o Governo «mais à esquerda» de que alguns têm memória e outros expectativa (o que diz muito dessa memória e dessa expectativa, e pouco deste Governo), decide entregar por «ajuste directo» a um grupo capitalista a concessão do Serviço Postal Universal, passando a pagar por um serviço que sempre foi lucrativo no Estado, e permitindo a continuação da brutal degradação do serviço postal. E, entretanto, ainda se prepara para que todos paguemos uns milhões de euros em «equilíbrio financeiro da concessão». Sobre isso, sobre o escândalo de o contrato de concessão remeter «os litígios» entre o Estado e o privado para os «tribunais» arbitrais, a resolução do Conselho de Ministros nada diz, o que augura que o mesmo mecanismo de transferência de fundos públicos para os bolsos privados está salvaguardado no próximo contrato de concessão. Claro que todo este percurso só é possível porque ele ocorre perante o silêncio cúmplice da comunicação social dominada, fiel intérprete dos desejos e interesses do grande capital. Fidelidade que partilha com um Governo que em seis anos sempre se opôs à renacionalização dos CTT, que seis vezes se aliou a PSD e CDS-PP (e também ao Chega e à IL) para travar projectos de renacionalização, e que apenas aceitou aprovar declarações de intenções que nunca pensou concretizar e criar grupos de trabalho que nada estudaram e se limitaram a ganhar tempo. Como o comportamento presente deixa exposto. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Opinião|
Nos CTT, o Governo cede em tudo ao Grupo Champalimaud
Contribui para uma boa ideia
Apesar disso, o Governo não só tem rejeitado a renacionalização da empresa, reivindicada por trabalhadores e utentes, como decidiu atribuir, em Fevereiro, um novo contrato de concessão por um período de sete anos, que o Tribunal de Contas entendeu por bem dispensar de visto.
No início desta semana, a Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom) divulgou o resultado de 22 acções de fiscalização em 13 centros de distribuição postal, entre Julho de 2021 e Janeiro deste ano. Segundo confirmou então a Anacom, existem «demoras significativas no encaminhamento do correio prioritário e correio normal, assim como a ausência de distribuição postal em certos giros em determinados dias, situações que perduram por períodos de tempo bastante alargados».
Para o regulador, os CTT deviam corrigir as deficiências verificadas «o mais urgentemente possível», pondo termo aos atrasos na distribuição do correio que chega diariamente a cada um dos centros de distribuição.
A degradação do serviço postal não é novidade para os utentes e tampouco para a Anacom, que em 2020 chegou a determinar a descida dos preços devido ao incumprimento de indicadores de qualidade.
Contribui para uma boa ideia
Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.
O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.
Contribui aqui