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Governo quer voltar às PPP na Saúde, o modelo que lesa o Estado e os utentes

«Não tem nada a ver com ideologia», diz Ana Paula Martins, ministra da Saúde, que mais uma vez admite querer entregar unidades do SNS aos grupos privados do negócio da doença.

CréditosFilipe Amorim / Agência LUSA

Em entrevista à Antena 1, a ministra da Saúde, Ana Paula Martins, voltou à carga com a ideia das Parcerias Público-Privadas (PPP). Não que seja uma inovação, até porque o ex-ministro, Manuel Pizarro, e o ex-Governo do PS estavam a trilhar o caminho para o regresso dos modelos de gestão privados. 

Acontece que o actual Governo não tem pejo em admitir os seus reais objectivos e Ana Paula Martins, cada vez mais à vontade, afirmou que está em marcha uma «transformação» do SNS. Diz a responsável da tutela que «em muitas das nossas unidades da saúde, nós devemos retomar o modelo de Parceria Público-Privada», afirmando «se depender de mim, vamos ter».

Para a ministra «não é uma questão ideológica», sendo certo que tal escolha é puramente ideológica, dada a recusa em investir mais dinheiro no SNS, algo garantido na sua última ida à Assembleia da República quando a mesma, quando confrontada com os problemas nas unidades de saúde disse que não se resolvem a «despejar dinheiro».

Apesar de não adiantar quais serão as unidades de saúde que passarão para o regime de PPP, Ana Paula Martins acabou por admitir que o Hospital Beatriz Ângelo será um dos hospitais que voltarão ao regime anterior. Quem sai lesado desta decisão são, mais uma vez, os utentes. 

Entre 2012 e 2022, o Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, foi gerido em regime de parceria público-privado (PPP) com o grupo Luz Saúde. No ano passado, o AbrilAbril falou com Fernanda Santos, da Comissão de Utentes do Hospital Beatriz Ângelo que disse que «desde a abertura que assistimos a picos de urgência e o hospital sempre teve listas de espera muito grandes para cirurgias e consultas».

A visão da utente, que contraria a narrativa da ministra que parece quer ministrar em prol dos grupos privados do negócio da doença, foi também corroborada pelo Tribunal de Contas que, em 2015, com o objectivo de avaliar a sustentabilidade da parceria e o desempenho do estabelecimento hospitalar, concluiu factos nada abonatórios para a gestão privada. «Não resulta evidente, da análise do primeiro ano de actividade completo [2013] do Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, uma maior eficiência decorrente do seu modelo de gestão privada, em PPP, face à gestão de outras unidades com gestão pública empresarial do Serviço Nacional de Saúde», lia-se no relatório.

Sobre o modelo que a ministra da Saúde quer colocar em prática, também o Tribunal de Contas Europeu chegou a concluir, em 2018, que as PPP são modelos ineficientes e desequilibrados. A entidade europeia, apesar de considerar que num curto prazo as PPP podem ajudar a colocar em prática planos governamentais, a longo prazo não se reconhece as mais-valias.

«O Tribunal constatou que, apesar de as PPP terem potencial para acelerar a execução das políticas públicas e assegurar bons níveis de manutenção ao longo do seu tempo de vida, as PPP apoiadas pela UE que foram auditadas nem sempre foram geridas de forma eficaz e não proporcionaram uma otimização dos recursos adequada. Frequentemente, os potenciais benefícios das PPP auditadas não se concretizaram, pois, à semelhança do que acontece com os projetos sujeitos a um procedimento de contratação tradicional, ocorreram atrasos, aumentos de custos e subutilização das realizações dos projetos, o que deu origem a 1,5 mil milhões de euros de despesas ineficientes e ineficazes, das quais 0,4 mil milhões provenientes de fundos da UE», podia-se ler no relatório.

«Além disso, não existiam análises adequadas sobre o potencial das PPP para proporcionarem uma maior otimização dos recursos, estratégias adequadas para a utilização das PPP nem quadros institucionais e jurídicos». Este elemento, nega por completo a ideia que Ana Paula Martins quer fazer passar, a ideia de uma melhor gestão quando essa responsabilidade é deixada para os privados. 

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