O acto de terrorismo mediático praticado por José Rodrigues dos Santos contra o Partido Comunista Português na pessoa do seu secretário-geral, Paulo Raimundo, marca uma subida qualitativa na campanha geral contra a liberdade ideológica, de pensamento e de opinião; e, distorcendo as temáticas das próximas eleições legislativas, define o tom a adoptar na viciação da escolha dos eleitores através do objectivo de marginalizar, até à exclusão, o partido que se opõe à opinião única militarista numa sociedade que entrou em estado de guerra.
Neste quadro, o pivot do Telejornal da estação pública que desempenha o cargo de propagandista e inquisidor-mor, ocupando o cargo há quase tanto tempo quanto Salazar esteve na sua cadeira, é, apesar disso, apenas um peão, uma árvore podre no meio de uma floresta infestada por uma praga sem antídoto suficiente.
E, apesar da degradação generalizada do jornalismo e da profissão de jornalista, a arruaça protagonizada por JRS não mancha mais esta actividade porque o indivíduo nada tem a ver com ela.
O comportamento pidesco do energúmeno aparentado com o Chega, usando o falso engodo da discussão política sobre as eleições para disparar em defesa do nazi-banderismo de Kiev, é uma amostra do ambiente que está a ser imposto em toda a União Europeia desde que esta entidade, numa desesperada fuga para a frente e para uma guerra suicida, se encerrou num manicómio.
JRS não é mais nem menos terrorista de opinião do que os lunáticos Rogeiro&Milhazes mais toda a cáfila dos «comentadores» dominantes na SIC, na TVI/CNN e na própria RTP.
As suas presenças nesses lugares não resultam de qualquer iniciativa voluntarista deles próprios. Não seria o que é sem o aval e a decisão dos respectivos directores de informação e dos directores das próprias empresas, pelo que não é difícil deduzir que estamos numa nova e agravada fase de uma política de propaganda administrada como informação, dirigida contra uma opinião pública cada vez mais vulnerável, indefesa perante a mentira e a manipulação, à qual o contraditório é sonegado; e que está sequestrada no interior de uma realidade paralela em aperfeiçoamento constante. A intoxicação é reforçada pela alienação perpetrada pela indústria de imbecilidade do entretenimento mais consumido, complementar da informação viciada e distorcida.
O ambiente mediático dominante caminha a passos largos para a propaganda de guerra. Os esgares e a face ensanguentada de JRS tentando intimidar Paulo Raimundo, usando e abusando da sua prolongada e manhosa experiência perante as câmaras, assinala um momento de agravamento da perseguição e controlo de opinião, mas longe de ser um caso isolado – em Portugal como em toda a União Europeia, mergulhada criminosamente em clima de guerra.
O PCP e Paulo Raimundo simbolizaram, neste caso, todos os alvos a abater através dos 27 – ou dos 28, porque o Reino Unido parece ter assumido o papel de comando militar em todo o espaço europeu, substituindo a aparentemente tresmalhada vertente imperial do lado de lá do Atlântico.
Esses alvos são fáceis de definir, que não de derrotar, desenganem-se os que julgam ser capazes de o fazer através da perseguição e da repressão, do terror verbal, político ou mesmo físico. Para ficarem sob fogo basta que defendam a paz em vez da guerra, o diálogo em vez do paleio entre surdos, a democracia em vez da via para o autoritarismo como antecâmara do fascismo, do investimento no desenvolvimento social e não na indústria da morte.
«O ambiente mediático dominante caminha a passos largos para a propaganda de guerra. Os esgares e a face ensanguentada de JRS tentando intimidar Paulo Raimundo, usando e abusando da sua prolongada e manhosa experiência perante as câmaras, assinala um momento de agravamento da perseguição e controlo de opinião, mas longe de ser um caso isolado – em Portugal como em toda a União Europeia, mergulhada criminosamente em clima de guerra.»
A RTP montou um banco dos réus para o secretário-geral do PCP porque este partido tem sido o único em Portugal – o único, leram bem – que defende e sempre defendeu as soluções de paz para os conflitos, os caminhos do diálogo para as atingir e que nunca deixou de proclamar o que todos os outros escondem (assumindo a cumplicidade) sobre o cariz do regime antidemocrático e putrefacto de Kiev. Além disso, é um partido que não contorna a realidade histórica determinante em toda a actual situação ucraniana: o golpe de Estado de 2014 contra o sistema de democracia liberal através do recurso a venerados grupos nazis saudosos de Hitler, cometido pelos Estados Unidos e a União Europeia.
O PCP, em suma, é a única voz incómoda que tenta fazer chegar à opinião pública os riscos potenciais e trágicos que uma aventura de guerra transeuropeia acarreta para os povos do continente, especialmente para as suas camadas médias e as mais desfavorecidas. O PCP é a voz contra a corrente da guerra. Por isso, atendendo às novas circunstâncias de militarização da sociedade a todo o custo e custos, já não é suficiente dissolvê-la através da manipulação e distorção mediática das suas posições, das suas intervenções, das suas mensagens e dos seus programas populares. Parece ter chegado o momento de calar essa voz, de correr com os comunistas de órgãos de soberania, principalmente da Assembleia da República; em suma, é necessário erradicar de vez o contraditório democrático, que é como quem diz, no limite a própria democracia. Acontece em Portugal em relação ao PCP como acontecerá a quaisquer outras vozes pacifistas e dialogantes dentro da União Europeia, precisamente por tentarem ainda impedir a catástrofe. Tal é o objectivo da vertente mediática da propaganda belicista como parte da estratégia para instauração de uma sociedade em que o culto da guerra seja «unânime».
JRS, como outros correligionários da grande burla do «comentariado», apontam o caminho, definem que as entrevistas dialogantes, ainda que possam levantar controvérsia mas sejam abertas e esclarecedoras, já não devem ser permitidas a representantes do PCP e do contraditório em geral. Há que transformar esses episódios em actos inquisitoriais, em julgamentos sumários onde não haja espaço para o acusado se defender. Por este caminho, também é essencial impedir a abordagem de uma vasta panóplia temática esclarecedora, coerente e programática, impondo como único tema em cima da mesa, numa atmosfera agressiva, intimidatória, desrespeitosa, de preferência humilhante, aquele que mais quebra o unanimismo. De maneira a que seja absolutamente descreditado.
Do tumulto às falinhas mansas
Como exercício que contribua para perceber a manobra pode o leitor comparar a acção terrorista contra o PCP com as falinhas mansas, as conversas suaves e até promocionais que JRS mantém com os representantes dos outros partidos, sabendo, à partida, que nenhum deles – nenhum, leram bem – põe em causa a política armamentista e de guerra em sociedade com os carrascos de Kiev, inimigos do povo ucraniano. Talvez nada seja mais esclarecedor do que essa comparação.
JRS engasgou-se e entupiu quando Paulo Raimundo lembrou uma outra realidade simples: a de que a União Europeia, vivendo numa espécie de delírio de destruição, sangue e morte, deixando-se afogar no pântano ucraniano, não mostra a ínfima preocupação com a mortandade genocida praticada pelo regime nazi-sionista de Israel contra o povo palestiniano. Se pensarmos mais maduramente, porém, talvez não estejamos perante um daqueles casos habituais de dois pesos e duas medidas. Existe até uma apreciável coerência nas posições da União Europeia: a insensibilidade em relação aos palestinianos é a mesma em relação à liquidação de um milhão de ucranianos, por culpa do seu governo, e até no que diz respeito aos jovens europeus para quem se planeiam missões de morte.
O feitiço contra o feiticeiro
As reacções ao que se passou no covil inquisitorial de JRS revelam, porém, que este perdeu a batalha e as suas intenções ficaram prosaicamente desmascaradas. O facínora virou-se contra si próprio à medida que percebia a incapacidade para extrair a Paulo Raimundo as respostas que pretendia ouvir. Além disso, o secretário-geral do PCP resistiu à tentação de lhe fazer a vontade, a de que abandonasse o estúdio, carregando o ónus de uma campanha acrescida e previsível contra um «inimigo do diálogo». Mesmo que de diálogo nada tenha havido, esse era um dos objectivos centrais do ressabiado JRS.
Ao invés, o dirigente comunista conseguiu ainda, no meio das rajadas incessantes do seu inquisidor, fazer-lhe alguns dribles e fazer passar mensagens essenciais que incentivam a pensar e demonstram o estado de insanidade a que chegaram a classe política governante portuguesa e os dirigentes da União Europeia.
«Se pensarmos mais maduramente, porém, talvez não estejamos perante um daqueles casos habituais de dois pesos e duas medidas. Existe até uma apreciável coerência nas posições da União Europeia: a insensibilidade em relação aos palestinianos é a mesma em relação à liquidação de um milhão de ucranianos, por culpa do seu governo, e até no que diz respeito aos jovens europeus para quem se planeiam missões de morte.»
As palavras de Paulo Raimundo deixaram claro que os 800 mil milhões de euros que a União Europeia não tem, mas se propõe gastar em armas e no esforço de uma guerra contra a Rússia, representam machadadas violentas em serviços e direitos fundamentais para os povos europeus como a saúde, o ensino, a habitação, criação e manutenção de infraestruturas públicas e o próprio desenvolvimento económico, prejudicando as camadas médias e mais desfavorecidas.
Outra das mensagens deixadas pelo responsável comunista é talvez ainda mais dramática. Os dirigentes europeus, ensandecidos e movendo-se à deriva no interior de um manicómio, preparam-se para transformar uma geração de jovens europeus em carne para canhão considerada indispensável para reabastecer o talho onde foram sacrificadas as vidas de um milhão de ucranianos; jovens esses que, pela ordem natural das coisas, seguirão o mesmo caminho. Dizer isto, porém, é uma heresia, uma razão suficiente para que o atrevido herege seja reduzido ao silêncio. No entanto, cinco décadas depois da libertação, mais uma geração de portugueses está ameaçada de ter o seu futuro adiado, ou mesmo hipotecado, em uma nova guerra inútil e sem sentido, como afinal são todas.
Uma outra mensagem deixada pelo secretário-geral do PCP, esta implícita mas ainda decorrente do atentado de que foi vítima, é a de que o unanimismo militarista e neoliberal, uma vez que estas correntes desumanas são interdependentes, não pode passar. Se a informação-propaganda regimental silencia o contraditório, este terá de dar a volta por cima, tentar fazer-se ouvir alto e bom som através de todos os meios possíveis. Até porque, pelas reacções que choveram imediatamente a seguir à sessão inquisitorial, certamente oriundas até de muitas pessoas indignadas que não estão, de alguma maneira, associadas ao PCP, revelam que existe uma base de consciências despertas, ou a despertar, para os perigos representados pela ameaça de autoritarismo inerente à instauração do estado de guerra. Essas pessoas sabem que a marginalização dos comunistas seria sempre uma porta aberta para o aparecimento das formas mais negras de poder.
A prestação de JRS, que se denunciou ao ser vítima do próprio comportamento, teve pelo menos uma vantagem: abriu o jogo e permitiu-nos ficar a conhecer, sem qualquer dúvida, o tom persecutório contra o PCP e a democracia da campanha para as eleições de 18 de Maio. Alertou todos quantos continuam a bater-se por uma democracia na qual a vontade do povo seja soberana de que a campanha não vai ser limpa nem democrática. Já não basta que a escolha tenha sido, há muito, restringida a dois partidos; há também o objectivo claro de expulsar o PCP dos espaços de soberania e, para concretizar esse objectivo, vai valer tudo. Mais tarde ou mais cedo, outros partidos que se atrevessem a ter pontos de dissonância seguiriam o mesmo caminho. Nada que, para já, os incomode enquanto aplaudem os nazi-banderistas de Kiev.
«Perante uma campanha como a que se prevê é necessária uma verdadeira contra-campanha através do recurso, pelos democratas, a todas as formas de contacto e esclarecimento, nas redes sociais, actuação directa, imaginativas e inovadoras formas de comunicação tirando proveito de novas tecnologias, enfim tudo o que possa minimizar os efeitos da previsível e despudorada campanha oficial do regime – na comunicação social e em iniciativas públicas.»
Perante uma campanha como a que se prevê é necessária uma verdadeira contra-campanha através do recurso, pelos democratas, a todas as formas de contacto e esclarecimento, nas redes sociais, actuação directa, imaginativas e inovadoras formas de comunicação tirando proveito de novas tecnologias, enfim tudo o que possa minimizar os efeitos da previsível e despudorada campanha oficial do regime – na comunicação social e em iniciativas públicas.
Não será abusivo, nem exagerado, nem alarmista deixar claro que esta campanha é de vida ou de morte, na verdadeira acepção das palavras. Nas mensagens permitidas a Paulo Raimundo, apenas porque este não desistiu do confronto desigual, foi possível perceber que o povo português, numa espécie de dormência induzida pelos mecanismos sórdidos da propaganda, não se apercebeu ainda do alcance do enorme perigo que corre devido à crescente e doentia irresponsabilidade dos nossos dirigentes nacionais e europeus. O perigo de ser atingido por uma guerra real, não como aquelas de faz de conta com que pretendem entreter-nos nas superproduções da Netflix, Hollywood e correlativos, ou mesmo nos telejornais de JRS e respectivos clones.
Em boa verdade, é urgente que as portuguesas e portugueses se apercebam da necessidade de travar o envio dos nossos filhos e netos para um matadouro que nada tem a ver com os nossos interesses, apenas existe por razões que não são as nossas e nenhuma relação tem com a democracia, antes pelo contrário – digam o que disserem as classes políticas e respectivos propagandistas.
É urgente, por isso, que se evite o arrastamento dos nossos jovens para o sacrifício antes de começarem a regressar, em massa, inertes e dentro de sacos de lona. É disto que também trata a campanha eleitoral em curso.
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