Era uma resposta urgente para milhares e milhares de famílias, sobre as quais paira a ameaça de perderem a habitação, devido aos impactos da pandemia, que agravaram as condições de vida dos mais vulneráveis, e à aplicação, a partir de Janeiro, da famigerada «lei dos despejos» de Assunção Cristas a todos os contratos de arrendamento anteriores a 1990.
Na apresentação do projecto de lei, no debate potestativo desta tarde, agendado pelo PCP, o deputado Bruno Dias realçou que, «se até agora a situação já era e é de uma extrema gravidade, o que pode acontecer se nada for feito é uma verdadeira emergência social».
Um cenário que tanto abrange as famílias, designadamente de pessoas idosas e com baixas reformas, como as pequenas e médias empresas. Mas o apelo não fez eco nas bancadas da direita, nomeadamente na do PSD, que aproveitou para se referir às «dificuldades» que os senhorios têm em despedir.
Reagindo às críticas sobre a manutenção do Balcão Nacional do Arrendamento (BNA), a deputada do PSD Márcia Passos afirmou que ele é «um tormento», mas «para todos que a ele recorrem para efectuar um despejo». Já o deputado da IL aproveitou o tema para pedir uma redução da «carga fiscal» sobre o sector.
A criação da Carta Municipal de Habitação e o direito à protecção em situações de despejo são algumas das medidas previstas na primeira Lei de Bases da Habitação, 45 anos depois da Revolução dos Cravos. Quarenta e três anos após a aprovação da Constituição da República, que consagra o direito à habitação, foi aprovada esta sexta-feira em votação final global, na Assembleia da República, a primeira Lei de Bases da Habitação, com os votos a favor de PS, PCP, BE, PEV e PAN, e os votos contra de PSD e CDS-PP. «O Estado é o garante do direito à habitação», lê-se no diploma da Lei de Bases, indicando que «todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar». Além da «efectiva garantia desse direito a todos os cidadãos», o diploma estabelece a função social da habitação, em que «os imóveis ou fracções habitacionais detidos por entidades públicas ou privadas participam, de acordo com a lei, na prossecução do objectivo nacional de garantir a todos o direito a uma habitação condigna». Entre as medidas que compõem a Lei de Bases destaca-se a criação do Programa Nacional de Habitação e da Carta Municipal de Habitação, permitindo mobilizar solos para programas habitacionais públicos e privados de custos controlados. A integração do direito à habitação nas políticas de erradicação de pessoas em condição de sem-abrigo e o direito à protecção e acompanhamento em situações de despejo são também normas importantes do diploma. Para se ter uma ideia do alcance, basta recordar as recentes demolições na Quinta da Lage, na Amadora, que não teriam ocorrido se a nova lei já estivesse em vigor. Para assegurar o direito à habitação, lê-se na nova lei, «incumbe ao Estado programar e executar uma política de habitação integrada nos instrumentos de gestão territorial que garantam a existência de uma rede adequada de transportes e de equipamento social». O diploma aprovado foi consensualizado entre os deputados do grupo de trabalho parlamentar da Habitação, Reabilitação Urbana e Políticas de Cidades, no âmbito do processo de apreciação dos projectos de lei de PS, PCP e BE para a criação da Lei de Bases da Habitação, e condensa uma boa parte das propostas dos comunistas e do PS, a partir das acções de luta dos moradores. Apesar do travão do PS em medidas como a posse administrativa de habitações devolutas onde estejam identificadas carências habitacionais, e não haja habitações públicas, há aspectos positivos a destacar. Entre os exemplos de propostas que não passaram conta-se a tentativa de sancionar a Nova Geração de Políticas da Habitação do Governo, bem como a intenção de fazer nesta lei a transferência de competências da habitação para as autarquias, no âmbito da Lei-Quadro 50/2018. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Nacional|
Primeira Lei de Bases da Habitação aprovada esta sexta-feira
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Tendo presente o direito constitucional à habitação, e «sem prejuízo de uma proposta mais aprofundada», o diploma dos comunistas estipulava a proibição da cessação de contratos de arrendamento habitacional e não habitacional, até Dezembro do próximo ano. Na prática, prorrogava até Dezembro de 2022 o Regime Extraordinário de Protecção aos Arrendatários, regime especial de regularização de pagamentos em atraso que vigorou até Junho deste ano.
O documento introduzia também alterações específicas ao Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU) para dar mais segurança aos contratos anteriores a 1990, que segundo os comunistas correm o risco de «ficarem liberalizados» e aos contratos com inquilinos com pelo menos 65 anos ou com deficiência com grau de incapacidade superior a 60%, mantendo o valor da renda por um período de 15 anos.
Nos contratos que se enquadram no NRAU «já são incontáveis os casos de inquilinos que tiveram de sair das suas casas – não por se recusarem a pagar a renda, mas porque o senhorio (ou o fundo imobiliário) passou a ter a faca e o queijo na mão para denunciar o contrato e passar a cobrar de renda o dobro ou o triplo», denunciou o deputado Bruno Dias.
O eleito frisou ainda que a discussão sobre a habitação «coloca em evidência» uma realidade «indissociável»: a «extensão do empobrecimento da população e as consequências dos baixos salários».
A proposta de lei foi chumbada pelo PS e pelas bancadas à sua esquerda, salvo o deputado do CH, que participou no debate mas esteve ausente na votação.
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