|Reino Unido

O Labour encostado à direita, a esquerda britânica na encruzilhada

Jeremy Corbyn foi impedido de se candidatar pelos trabalhistas nas próximas eleições. Com o Labour cada vez mais encostado à direita, e milhões de trabalhadores nas ruas, o que é que a esquerda britânica vai fazer?

Jeremy Corbyn participa numa manifestação com centenas de milhares de docentes em dia de greve dos professores em Londres, Inglaterra, a 1 de Fevereiro de 2023. A actual direcção do Labour (que impediu Corbyn de concorrer às próximas eleições), liderada por Keir Stammer, tem assumido uma postura abertamente anti-sindical, criticando as greves e proibindo os seus dirigentes de participarem em piquetes (ou de participarem em manifestações pela paz na Ucrânia, contra o armamento). 
CréditosJordan Pettit / PA

As sondagens não deixam mentir: a vitória do Labour nas próximas eleições legislativas no Reino Unido (antecipadas ou, se de prazo cumprido, em Janeiro de 2025) está praticamente garantida, com uma (aparente) maioria absoluta.

Ainda falta muito tempo e há que encarar estes inquéritos com «uma pitada  de sal», como dizem os ingleses. Mas a Yougov reportava em meados de Fevereiro que o Labour venceria 543 lugares na Câmara dos Comuns (mais 341 dos que hoje tem e 217 acima do limite da maioria). Há muitos, muitos anos que não se via o mapa assim pintado de vermelho, incluindo partes da Escócia, onde a saída de Nicola Sturgeon da liderança do SNP irá, certamente, transferir muitos votos para os Trabalhistas.

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Caldinho de oligarcas, uma «esquerda» ajoelhada ao capital: retrato dos trabalhistas

Uma onda de greves, protestos e lutas no Reino Unido veio pôr a nu o que separa os trabalhadores de um partido tomado pelo neoliberalismo como o Labour.

Trabalhador em greve num piquete, em Junho de 2022, segura um cartaz em que se lê «Cortem nos lucros, não nos empregos e nos serviços» 
Créditos / PBS

Há muito que o Labour não é o partido dos trabalhadores britânicos. É verdade que a direita (lá como cá) continua a idolatrar saudosamente as máximas de Margaret Thatcher de que «não há alternativa» ao sistema capitalista. Para a discussão que nos importa, e que não comece necessariamente com as sucessivas traições do Labour aos trabalhadores desde tempos remotos, podemos afirmar com segurança que, desde o governo de Tony Blair, é no mínimo irónico chamar trabalhista a um partido que, chegado ao poder em 1997 nos escombros do thatcherismo, que levou à fragilização da esquerda britânica e à fragmentação do movimento sindical, já não tinha nada a perder em adoptar o neoliberalismo «com rosto humano».

Com a criação do New Labour, Blair montou ardilosamente uma Terceira Via (cruxis) para os trabalhadores: com a paulatina privatização de serviços públicos12 e desmantelamento do Estado Social, a acumulação de riqueza dos mais poderosos, o embrião das parcerias público-privadas, o mercado «evangelizado» dos empreendedores, a demonização da classe trabalhadora (os «chavs»), a diabolização dos funcionários públicos tornados precários e subcontratados. Uma (terceira) via enfim aberta, aproveitada a toda a velocidade pelos governos conservadores que lhe seguiram, desde 2010. Como dizia Peter Mandelson, político, barão e Lord (estas coisas no Reino Unido nunca se excluem), braço direito e «spin doctor» de Blair (e de Gordon Brown) nos seus governos trabalhistas: «Estamos imensamente relaxados se as pessoas se tornarem absurdamente ricas, desde que paguem os seus impostos.»

Os ricos tornaram-se absurdamente ricos. A classe média, entrincheirada no elevador social e nas suas ilusões de classe (aquelas férias anuais, ou até uma segunda casa, no Algarve ou na Costa del Sol, com as recém-criadas companhias aéreas low-cost), deixou para trás a classe trabalhadora nas cinturas urbanas das cidades pós-industriais e no rescaldo do desmantelamento de grande parte do sector produtivo do Reino Unido. Mas eram os anos 90: a «história» tinha finalmente «acabado», e o crescimento económico, a integração europeia «plena» e prosperidade eram uma larga autoestrada rumo à aparente «conciliação» das classes.

«as Ilhas Britânicas continuam a ser, pelo menos na Europa, palco privilegiado das tensões entre trabalhadores e capital: entre acumulação da riqueza e a sua desigual distribuição, caldinho de oligarquias no poder económico, financeiro e político, mas também mobilizadora dos movimentos sindicais, comunistas ou trabalhistas»

Para os portugueses, este retrato não é muito diferente do que aconteceu no nosso País com os governos do PS, pelo menos desde António Guterres (que era, aliás, fã de Anthony Giddens, pai da «terceira via»), com a gradual «direitização» do Partido Socialista até à intervenção da troika, e as subsequentes opções de classe – dominante – que o PS continua a ter, mais e mais próximo do capital, cada vez mais distante dos trabalhadores, de que aliás esta maioria absoluta está a ser a todos os títulos exemplar.

Não foi por acaso que, já no século XIX, Marx e Engels usaram o Reino Unido como laboratório da sua análise do capital. Ontem (século XIX), como no final dos anos 90 e, novamente, hoje, as Ilhas Britânicas continuam a ser, pelo menos na Europa, palco privilegiado das tensões entre trabalhadores e capital: entre acumulação da riqueza e a sua desigual distribuição, caldinho de oligarquias no poder económico, financeiro e político, mas também mobilizadora dos movimentos sindicais, comunistas ou trabalhistas, de resistência da classe trabalhadora, e na luta por muitas conquistas que (ainda) hoje são nossas – do direito à greve, à jornada de trabalho.

No rescaldo da derrota do Labour em 2010 e da sua completa desorganização (apenas interrompida pelo curto mandato de Jeremy Corbyn, aniquilado pela campanha mediática dos «moderados de esquerda» levada a cabo pelo The Guardian34, por ser demasiado «militante» e «radical»); de uma série alterações à lei eleitoral (que favoreceram e continuarão a favorecer o partido Conservador); após três PM dos Tories (David Cameron, Theresa May, Boris Johnson), a caminho do quarto (só em Setembro saberemos quem); após a caótica posta em prática do Brexit – o Reino Unido continua a ser o espaço por excelência das mais modernas «experimentações» do capital.

Trabalho escravo de apanhadores de fruta e simultânea criminalização da imigração, importação de mão-de-obra para o SNS (enfermeiros e médicos) sem reforço de investimento na formação nacional e progressão nas carreiras, sub-orçamentação e investimento em PPP, progressiva privatização do SNS (recentemente, com a entrada de seguradoras e farmacêuticas norte-americanas no negócio da Saúde); neoliberalização do Ensino Superior e subida exponencial de propinas; privatização dos Correios (Royal Mail) e das empresas ainda públicas de energia (água, gás, electricidade); privatizações ou concessões de PPP nos transportes públicos (o que restava da aviação pública, mais linhas de comboio, companhias ferroviárias, transportes urbanos), subfinanciamento e subcontratações a privados em todos os serviços públicos (do SEF à recolha do lixo à cobrança de impostos).

Colhendo os frutos dos alicerces lançados pelo neoliberalismo de Margaret Thatcher, que o Labour de Tony Blair tão bem aproveitou para alimentar a sua rede de poder, privilégios e amigos, os Tories da última década só tiveram de assinar de cruz o processo de destruição em curso do que resta do Estado Social britânico.

«Colhendo os frutos dos alicerces lançados pelo neoliberalismo de Margaret Thatcher, que o Labour de Tony Blair tão bem aproveitou para alimentar a sua rede de poder, privilégios e amigos, os Tories da última década só tiveram de assinar de cruz o processo de destruição em curso do que resta do Estado Social britânico.»

A pandemia, acelerando a concentração de capital e a destruição de milhares de postos de trabalho, a par do Brexit, da guerra na Ucrânia e da hiper-inflação, pôs a nu mais do que nunca a necessidade de organização dos trabalhadores. Este «Verão quente do descontentamento» no Reino Unido com greves, lutas e paralisações em sectores estratégicos como a ferrovia, transportes urbanos, correios, bombeiros, tribunais e, a preparar-se no Outono, professores e o SNS, está a mostrar que, ao contrário do que nos disseram, o movimento sindical britânico não está, de facto, morto e até parece ter uma força que não se via em anos. Mas está sozinho, porque o Labour o abandonou.

A onda de greves

O afastamento do ministro-sombra dos trabalhistas no sector dos Transportes, Sam Tarry, após este se juntar ao piquete de greve dos trabalhadores da ferrovia (do sindicato RMT, dos transportes urbanos, marítimos e ferroviários), na semana passada, mostra bem a que ponto chegou o Labour de Keir Starmer na defesa dos direitos dos trabalhadores.

Já na primeira onda de greves da RMT, em Junho, vozes à esquerda dentro do Labour instigaram Keir Starmer a posicionar-se politicamente ao lado da luta e dos sindicatos, e a participar nos piquetes. Do líder do Labour só houve silêncio – em contrapartida, Jeremy Corbyn e os corbynistas lá estiveram nos piquetes, um pouco por todo o país.

A discussão sobre o direito à greve – progressivamente atacado desde os governos de Thatcher, que feriram de morte a organização sindical em alguns sectores, sobretudo na indústria e nos minérios – voltou aos debates, talk shows da manhã ou em horário nobre, mais sérios ou mais entertainment, ao circo dos opinion makers e dos prós-e-contras nos jornais, rádio e televisões.

Mas, subitamente, são os sindicalistas os convidados a explicar, perante as perguntas da praxe sobre «o papão» da greve – «perturbar» as pessoas que já pagaram o passe? Violar o «direito» a viajar? –, como a ferrovia assistiu ao empobrecimento da sua massa trabalhadora, quer através do despedimento ou da extinção de postos de trabalho, da redução de salários e perdas de direitos, de congelamento de carreiras, ao mesmo tempo que as empresas de transportes faziam 500 milhões em lucro, só em 2021, com a subida dos preços dos bilhetes e subsídios do Estado. O que vai acontecer se os salários dos trabalhadores não subirem, explica Mick Lynch, secretário-geral da RMT, «é que os lucros continuarão a ir para as empresas e os trabalhadores a empobrecer».

«O que vai acontecer se os salários dos trabalhadores não subirem, explica Mick Lynch, secretário-geral da RMT, "é que os lucros continuarão a ir para as empresas e os trabalhadores a empobrecer"»

Mas o que estes sindicalistas estão a fazer não é só explicar o bê-á-bá do direito à greve, num momento em que, na disputa pela liderança do Partido Conservador (Boris sairá em Setembro), Liz Truss e Rishi Sunak já vieram dizer que, com a maioria no Parlamento e perante esta onda «desproporcional» e «caótica» de greves, é necessário adoptar leis mais duras contra a organização sindical, fazendo com que seja cada vez mais difícil, senão impossível, trabalhadores organizarem-se de forma legal. Séculos de direitos adquiridos podem estar em risco nos próximos meses.

Perante comentadores e jornalistas incrédulos, a agressividade dos think tanks de direita e o silêncio cúmplice dos trabalhistas, são os sindicalistas que estão nos media a fazer o trabalho de informação contra os economistas e os spins, a dizer o que políticos não têm a intenção de fazer: explicar aos britânicos a hiper-inflação, o aumento do custo de vida, as contas da energia, o aumento das rendas e a falta de habitação, os lucros pornográficos das petrolíferas, para onde vai o dinheiro dos cortes nos salários e pensões, dos subsídios das privatizações e concessões em PPP, quem são os oligarcas britânicos amigos dos ministros e dos empresários protegidos pela roda da alta finança e das offshores que estão realmente a lucrar com os sacrifícios dos trabalhadores britânicos.

Labour contra os trabalhadores

É também com incredulidade que os media têm recebido os resultados de sondagens em que mais de 50% dos britânicos inquiridos apoiam as greves e em que a maioria está de acordo que outros sectores se juntem aos protestos (nos transportes vão-se juntar também os urbanos da Arriva, e o TFL, sistema de transportes de Londres). É na cobertura mediática ao vivo na BBC ou Sky News que vemos jornalistas a perguntar a transeuntes se não estão indignados pela forma como os protestos estão a «afectar a mobilidade dos britânicos», recebendo, pelo contrário, palavras de encorajamento pela luta dos trabalhadores. É também surpreendente perceber como piquetes por todo o país têm sido acompanhados de manifestações espontâneas de cidadãos, de Glasgow a Liverpool, de Birmingham ao País de Gales, em apoio aos grevistas.

Acusados de ambiciosos, manipuladores, militantes, extremistas, gananciosos, sindicalistas como Mick Lynch ou Eddie Dempsey (vice da RMT) estão na televisão de forma ponderada, articulada e didáctica a ganhar os trabalhadores contra os lucros do capital. Subitamente assistimos a estes corpos, vozes, sotaques, e até expressões e linguagem, que sempre estiveram arredadas da imprensa britânica (elitista e classista), invadindo sem pedir licença o espaço polido dos media sempre do lado do poder. À excepção das soap operas (da Coronation Street ao Eastenders), ou dos talk shows da ITV, nas caricaturizações dos dramas ou aspirações da classe trabalhadora, corpos e vozes como os de Lynch e Dempsey raramente são vistos ou escutados sobre temas como economia e política, energia e habitação, na análise sobre o estado do mundo.

«Subitamente assistimos a estes corpos, vozes, sotaques, e até expressões e linguagem, que sempre estiveram arredadas da imprensa britânica (elitista e classista), invadindo sem pedir licença o espaço polido dos media sempre do lado do poder.»

Electricista desde os 16 anos, filho de irlandeses que cresceu num bairro pobre de Londres, Mick Lynch não tem pejo em explicar por que os media britânicos não estão habituados a ouvir a classe operária56: «Temos jornais e meios de comunicação que são propriedade de oligarcas que estão a dizer às pessoas da classe trabalhadora, como eu e outros líderes sindicais, que somos uma espécie de aristocracia de elite ou barões sindicais. Isso é um completo absurdo. Alguns media parecem surpresos que pessoas da classe trabalhadora com sotaque possam articular um caso em defesa de outras, ou tenham ideias sobre a economia, sobre o modo como a política funciona. Eles acham chocante, mas se entrarem nos refeitórios da ferrovia ou forem ao pub local, à igreja ou à mesquita, encontrarão milhões de pessoas articuladas da classe trabalhadora. O facto é que não temos a oportunidade de nos expressar.»

E onde está o líder do Labour, Keir Starmer? Face à onda de greves e protestos em todo o país, completamente mudo. Ninguém sabe o que pensa: sobre a luta, as negociações salariais, os lucros milionários das empresas de energia, ou o que realmente quer para a esquerda e para o país. Mas, em meados de Julho, Starmer deixou cair a promessa de que lutaria por um SNS público, deixando antever que não se opõe ao processo de outsourcing que o SNS tem vindo a sofrer.

Segundo Lynch, a estratégia de «gestão da crise» do líder do Labour tem sido «não dizer nada de controverso» para «apaziguar o Daily Mail e o Telegraph» (jornais de direita). Para Lynch, Starmer tem de «puxar os cordões às botas e liderar o movimento dos trabalhadores», «tem de definir que valores defende e a sua mensagem, e decidir de que lado da luta está», tem de «se juntar à experiência da classe trabalhadora, não apenas na luta e na disputa, mas à sua experiência quotidiana».

E, continua, admitindo que a receita para o Labour parece simples: «A classe trabalhadora precisa de um aumento salarial, e a resposta para a crise do custo de vida é através do pacote salarial, não é através de impostos extraordinários sobre rendimentos [windfall tax] e de resgates ocasionais aos trabalhadores; é um pacote de aumentos permanentes do poder de compra das pessoas através de salários, e Starmer tem que entender isso e tem que prometer, agora, financiar o sector público adequadamente, para dar às pessoas um conjunto de direitos laborais que sejam significativos, diariamente, no local de trabalho; tem que libertar os sindicatos, tem que nos dar a capacidade de negociar livremente o acordo que a classe trabalhadora precisa longe [do poder] das corporações e deste governo.»

A receita pode ser simples, importa é saber se o Labour ainda está disposto a segui-la. Ou se a destruição completa da esquerda parlamentar britânica está por um fio. O Reino Unido continua, afinal, a ser um laboratório, uma lente útil para, desde o continente, podermos continuar a observar como uma esquerda ajoelhada ao capital e aos interesses das corporações se vira contra os trabalhadores.

Em Maio, a Jacobin 7 desmontava o novo think tank apoiado por Tony Blair, The Britain Project, mostrando como o lobby de Blair para destruir Corbyn e expulsar os socialistas do Labour continua a dar frutos. O objectivo do «novo» New Labour é «a última tentativa de criar uma força ultra-neoliberal para destruir qualquer vestígio da social-democracia».

«A receita pode ser simples, importa é saber se o Labour ainda está disposto a segui-la. Ou se a destruição completa da esquerda parlamentar britânica está por um fio. O Reino Unido continua, afinal, a ser um laboratório, uma lente útil para, desde o continente, podermos continuar a observar como uma esquerda ajoelhada ao capital e aos interesses das corporações se vira contra os trabalhadores.»

Até o ministro-sombra da Saúde, Wes Streeting, jovem «blairista» que quer recuperar a narrativa do New Labour e que o Financial Times já anunciou como o «salvador» de que os trabalhistas precisam 8, apoiou as greves num debate na BBC, para logo sentir o «chicote» de Keir Starmer e retratar-se publicamente. O jornal socialista Morning Star conclui que não há solução à esquerda dentro deste partido Trabalhista, capturado por um sentimento anti-sindical, cada vez mais próximo de uma versão neoliberal e corporativista da luta laboral 9. «Se houver um desafio de liderança, a esquerda precisará de um candidato; e a liderança de Starmer tem sido suficientemente catastrófica na sua tentativa de expulsar todos os socialistas, impor apoio obrigatório aos Estados Unidos, à NATO e à guerra e encerrar todas as discussões sobre serviços públicos, para que a esquerda trabalhista esteja alerta às oportunidades de o derrubar. O que os sindicatos devem retirar deste momento é quão no fundo o Labour bateu.»

Já se percebeu que este «Verão quente do descontentamento» no Reino Unido é acima de tudo o palco da destruição do que sobra da esquerda britânica pelo Labour. São os sindicatos e os trabalhadores que estão a dar corpo, voz e visibilidade às ansiedades dos britânicos – na saúde, no aumento do custo de vida, na luta pelos direitos, pelo trabalho, pelos salários. Mas se o Labour já não está do lado dos trabalhadores, quem ocupará o seu lugar?

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Isto deveriam ser notícias animadoras para os trabalhadores e para a esquerda britânica. E, até, europeia. Mas não são. O Labour está numa encruzilhada ideológica que é muito sintomática de grande parte dos partidos sociais-democratas europeus – isto para os que ainda vêem no Labour (ou no PS, no PSOE ou PS francês) algum resto de esquerda.

Purgas internas da ala mais à esquerda; hesitações na defesa do direito à greve; ausências conspícuas nos piquetes; silêncios sobre mobilização de milhões de trabalhadores em tantos sectores em todo o país; respostas ambíguas sobre austeridade ou a necessidade de salvar o Serviço Nacional de Saúde (NHS); encolher de ombros sobre o aumento geral dos salários; opiniões dispersas sobre nacionalizações (da ferrovia, da energia); nem uma palavra sobre impostos sobre milionários ou propinas universitárias; aplausos rotundos à NATO; muito uso de retórica de segurança nacional para discutir imigração: eis o retrato do Labour, que em nada parece distinguir-se do partido Conservador, excepto na cor da gravata.

O fantasma do anti-semitismo

A 15 de Fevereiro, o líder do Labour, Keir Starmer, apresentou numa conferência de imprensa os resultados do processo de monitorização da Comissão de Igualdade e Direitos Humanos (EHRC), na sequência do relatório de Outubro de 2020, que denunciava práticas de anti-semitismo durante a liderança de Jeremy Corbyn. Em 2020, após o relatório, o Labour suspendeu Corbyn, tendo-o entretanto reabilitado (é deputado nos Comuns). O partido ficou sob monitorização e a EHRC reconheceu agora que o Labour tinha, de forma satisfatória, passado o seu período de observação.

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Solidariedade massiva com rapper britânico acossado por grupo pró-israelita

Mais de 25 mil pessoas subscreveram a petição on-line em apoio a Lowkey, rapper britânico solidário com a Palestina, depois de um grupo pró-Israel ter solicitado à Spotify que eliminasse as suas canções.

Lowkey ao lado de um cartaz da Palestine Solidarity Campaign 
Créditos / english.almayadeen.net

«A campanha contra Lowkey visa silenciar os palestinianos e os seus apoiantes. A censura anti-Palestina chega agora ao domínio artístico», lê-se na declaração subscrita por personalidades do mundo académico, musical, jornalístico, artístico, cinematográfico, entre outros.

O rapper britânico, conhecido pelo forte apoio à causa da libertação da Palestina, foi alvo das atenções da organização We Believe in Israel (acreditamos em Israel), que na semana passada pediu à Spotify que retirasse as canções de Lowkey da plataforma digital.

De acordo com o portal Electronic Intifada, o lobby pró-israelita referiu-se em particular à canção «Long Live Palestine – Part 2», interpretada por Lowkey com o grupo de hip hop palestiniano DAM, a artista britânico-palestiniana Shadia Mansour e o rapper iraquiano-canadiano Narcy.

​Ken Loach / @Lowkey0nline

O grupo considerou que o material promove sentimentos contra Israel e acusou Lowkey de «incitamento».

Assinada por figuras conhecidas como Roger Waters, Noam Chomsky, Brian Eno, os actores Mark Ruffalo e Liam Cunningham, os realizadores Mike Leigh e Ken Loach, ou o jornalista John Pilger, a declaração de apoio ao músico londrino lembra que esta não é a primeira vez que Lowkey é visado pelo lobby israelita.

«Lowkey tornou-se alvo de uma campanha de difamação coordenada para o demonizar, difamar e desqualificar», lê-se no texto, que lembra que, no início deste mês, grupos organizados obrigaram a Universidade de Cambridge a adiar uma conferência sua e conseguiram impedir que estivesse presente no Sindicato Nacional de Estudantes em Liverpool.

O texto de apoio ao rapper sublinha que a sua música inspirou milhões de pessoas em todo o mundo e fez despertar o interesse em muitas questões que ele aborda no seu trabalho.

Poucas horas depois de a petição ser tornada pública, na quarta-feira, já tinha 4000 assinaturas.

Hoje, o número de subscritores ultrapassou os 25 mil, tal como se pode verificar na plataforma change.org, onde a petição pode ser assinada.

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Os escândalos de anti-semitismo no Labour explodiram durante a liderança de Corbyn (2015-2020). Como os Labour Files (Ficheiros do Labour), investigação da televisão Al Jazeera, revelaram em Setembro, as denúncias sobre opiniões anti-semitas de militantes do Labour aumentaram após a revelação do manifesto de Corbyn em que afirmava, caso fosse eleito primeiro-ministro, que reconheceria o Estado da Palestina.

Isto aconteceu num momento de crescimento do número de militantes do Labour, sobretudo de jovens, que denunciavam abertamente os crimes de Israel nos territórios ocupados e a expansão dos colonatos, ao ponto de muitas das acusações a militantes do Labour confundirem anti-semitismo com críticas a Israel ou com a defesa da causa palestiniana. Mesmo assim, Corbyn nomeou uma série de organismos para regular e fiscalizar práticas anti-semitas dentro do partido. Não foi suficiente para calar a campanha (grandemente instigada pelos media, mesmo os tendencialmente de esquerda, como o Guardian) que destruiu a sua liderança.

Dentro do Labour, como revela a Al Jazeera, uma série de sabotagens, interferências (da Embaixada de Israel), alianças (até com a extrema-direita) e boatos sobre anti-semitismo em bastiões Labour de classe operária (como Liverpool), ou de esquerda mais liberal (como Brighton and Hove), deram origem a perseguições dentro do partido a militantes pró-Palestina. Estas perseguições e purgas incluíram judeus, como muitos dos membros pró-Corbyn no grupo Jewish Voice for Labour, que contestou os resultados apresentados pela EHRC. A discussão sobre anti-semitismo no Labour não parece estar encerrada, até porque vários membros judeus do partido continuam a ser perseguidos: mais de 60 foram suspensos ou expulsos.

Corbyn bloqueado

Foi nas perguntas com os jornalistas que Keir Starmer anunciou que não permitiria que Jeremy Corbyn concorresse ao seu lugar de deputado nos Comuns por Islington North, um distrito no Norte de Londres, onde Corbyn vence as eleições desde 1983. Há 40 anos que representa aquele distrito: «Dia após dia, estou concentrado nos problemas mais importantes que as pessoas de Islington North sofrem: pobreza, aumento das rendas, a crise na saúde, a segurança dos refugiados e o futuro do nosso planeta”, reagiu Corbyn».

«A actual discussão sobre o Labour parece dizer-nos que a única saída política para a crise económica e social do Reino Unido é a vitória confortável e silenciosa de Keir Starmer. Se ela trai o movimento sindical nas ruas, se ela trai milhões de trabalhadores em luta, se ela trai os britânicos à espera de uma mudança de política face aos Conservadores – é já irrelevante: sabemos que trai»

Devem ser os militantes e os seus eleitores locais a decidir por quem querem ser representados, disse Corbyn, e impedi-lo de se candidatar é um «ataque flagrante» que deverá ser combatido por «qualquer pessoa que acredita no valor da democracia». O Guardian deixou no ar a hipótese de Corbyn se candidatar pelo Labour na pré-selecção em Islington North, o que obrigaria o partido a tomar a decisão, pela Comissão Executiva, de o bloquear ou suspender formalmente.

Mas o Guardian também deixou no ar a hipótese de Corbyn concorrer como independente. Apressando-se a ir a Islington, ouviu Corbynistas convictos dizer que apoiariam um Corbyn independente: «Entrei para o Partido Trabalhista para lutar contra os Conservadores e não importa a cor da roseta que eles usem, fico feliz em lutar contra os Conservadores dentro e fora». E ouviu outros, tristes com «a polarização», que reconhecem Corbyn como um «ícone da comunidade» mas compreendem a decisão de Pago as quotas de militante e quero o Labour no poder».

Um dia depois de boicotar Jeremy Corbyn, Keir Starmer foi pela primeira vez a Kiev visitar o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. No passado fim-de-semana, Corbyn esteve presente, junto com outros militantes do Labour e sindicalistas, na marcha pela paz, contra a NATO, contra o armamento nuclear, contra a guerra na Ucrânia, em Londres. Mais um exemplo da enorme divisão dentro do Labour, entre os que aprovam o envio de armas para a Ucrânia e os que se lhe opõem.

Interessa pouco o caminho tomado por parte da esquerda britânica nas discussões sobre o carácter ou a honestidade de Keir Starmer, se quer trair Corbyn, se tem medo da ala esquerda. Ao assumir a liderança em 2020, parecia óbvio que Starmer quisesse mitigar divisões internas e afirmasse: «A todos os nossos militantes, apoiantes e amigos: digo isto. Quer tenham votado em mim ou não, eu represento-vos». Mas na conferência de imprensa em que bloqueou Corbyn, Starmer ameaçou: «Se não gostam das mudanças que instituí, a porta está aberta e podem ir-se embora».

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Ken Loach expulso do Partido Trabalhista Britânico

O cineasta Inglês, que em 2016 venceu a segunda Palma de Ouro no Festival de Cannes por Eu, Daniel Blake, foi notificado da sua expulsão do Labour por se recusar a legitimar a purga «de bons amigos e camaradas».

Ken Loach em frente ao cartaz do filme <em>Eu, Daniel Blake</em>, 2016 
Créditos / ctb.org

Conhecido pela sua intervenção social, empenhado na denúncia do capitalismo, da exploração laboral e da pobreza, Ken Loach é um dos mais importantes cineastas Ingleses. A sua penúltima longa-metragem, Eu, Daniel Blake (2016), expõe, nas suas palavras, «a constante humilhação de sobreviver. Se tu não vives furioso com isso, que raio de pessoa és?».

Em Eu, Daniel Blake, Loach retrata a experiência desumanizante de um homem a quem é recusada uma pensão de invalidez, muito embora tenha sido declarado inapto para trabalhar. Através da sua perspectiva vamos conhecendo a míriade de gente abandonada pelo sistema, que vive nas suas frinjas, sobrevivendo de restos. «É grotesto que aceitemos e achemos normal que alguém possa morrer de fome se não aceitar caridade», afirmou Ken Loach, por alturas do lançamento do filme.

O cineasta anuncioua na sua página de Twitter que «o quartel-general do Partido Trabalhista decidiu finalmente que não sou digno de continuar a ser membro do seu partido, já que me recusei a renegar aqueles que têm vindo a ser expulsos. Tenho orgulho em encontrar-me ao lado de bons amigos e camaradas, vítimas desta purga. É, sem dúvida, uma caça às bruxas... O Starmer e a sua clique nunca dirigirão um partido do povo. Somos muitos, eles são poucos. Solidariedade!».

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Eleições no Reino Unido: duas lições e uma especulação infame

Sair da União Europeia não tem de ser necessariamente um processo de recrudescimento nacionalista com negação de direitos fundamentais.

CréditosFonte: Europarlamento

As eleições no Reino Unido passaram e o resultado foi o que se conhece: os Conservadores de Boris Johnson ganharam e o afamado e estafado Brexit poderá (?), por fim, ver a luz do dia.

Primeira lição que é preciso tirar: por mais esotéricos que nos pareçam os candidatos de alguns partidos, não é por a comunicação social mainstream os diabolizar ou ridicularizar, que eles deixam de vencer. De resto, é bastante provável que uma das causas das suas vitórias seja, justamente, aparecerem nos antípodas do mainstream – afinal de contas, convém lembrar que, na maioria dos casos, foi esse mesmo mainstream que roubou direitos e esvaziou os bolsos da maioria dos eleitores, enquanto enchia os bolsos dos grandes grupos económicos. Não obstante, é útil registar que, ao contrário do que se passava no exterior, uma parte da comunicação social do Reino Unido nunca teve pejo de procurar caluniar o Partido Trabalhista (Labour) e, em particular, o seu mais alto dirigente, Jeremy Corbyn.

Prossigamos.

Os indefectíveis acólitos do projecto da integração capitalista europeia, vulgo, União Europeia (UE), chorarão agora pelos cantos, travestidos de cândidos democratas, alguns deles até «de esquerda», estupidificando o povo do Reino Unido e cantando a miséria e a desgraça para as terras de Sua Majestade, enquanto fazem mais umas profissões de fé sobre o «inabalável» futuro da União.

Segunda lição: o povo nem sempre acerta, é verdade, mas a estratégia de acenar com os espantalhos do cavaleiro do Apocalipse, nem sempre leva a bom porto. Resultou na Irlanda, aquando da repetição do referendo do Tratado de Lisboa, que lá martelou o «Sim», mas como está bom de ver aqui, a hostilidade da cúpula da UE durante este processo só entrincheirou mais o povo britânico na posição que já tinha. Lá diz o nosso povo que «com vinagre não se apanham moscas».

Mas vamos para a frente que, seguindo os ditos populares, atrás vem gente.

Com efeito, a ironia suprema destas eleições que – contra os avisos do próprio Corbyn – muitos venderam como um novo assalto no combate pró e contra o Brexit, o programa do Labour (consultável na íntegra aqui)1 está, possivelmente, mais nos antípodas das orientações da UE, que o dos próprios Conservadores.

Na realidade, ao propor a renacionalização de um conjunto de serviços públicos, aumentos significativos nos salários, redução do horário de trabalho, aposta no transporte público, investimento público em larga escala para resolver na esfera pública problemas da habitação e da saúde, entre outras medidas verdadeiramente progressistas, a mensagem subliminar que, de algum modo, o Labour estava a enviar à cúpula ao leme da UE era: «nós não queremos sair, queremos mesmo é que nos expulsem».

É verdade que nem o Reino Unido é a Grécia (geopoliticamente falando), nem o estar ou não amarrado aos compromissos do Euro é indiferente. É igualmente verdade que a História da social-democracia já nos mostrou que espinha dorsal é coisa que não abunda para aqueles lados (veja-se como agora a oposição interna a Corbyn dentro do próprio Partido Trabalhista o vai tentar destruir). Por isso, é avisado não entrar em grandes especulações ou euforias.

Pese embora tudo isto, é realmente lamentável que o Labour tenha perdido estas eleições, muito menos pelo que venha a ser o desenvolvimento do Brexit, e muito mais pelo que teria de desafiante implementar uma política que – a cumprirem-se as promessas feitas – iria largamente contra os pergaminhos do ideário neo-liberal, algo que teria impacto muito para lá das fronteiras do Reino Unido.

Nessa medida temos que nos ficar pela especulação e não chegar ainda à terceira lição: sair da UE não tem de ser necessariamente um processo de recrudescimento nacionalista com negação de direitos fundamentais, a saída pode corresponder precisamente à constatação da incompatibilidade entre o desenvolvimento económico e social soberanos e o projecto de integração capitalista, militarista e anti-democrático, que é a UE.

Como nota final, convém registar que, em nenhum momento, o Labour disse que iria ignorar o resultado do referendo que levou ao Brexit, mas antes reformular todo o plano para conduzir a uma saída suave e, antes de a concretizar, referendá-la novamente. Dirão alguns que, se os trabalhistas tivessem ganho, provavelmente um novo referendo teria como resultado que, afinal, não havia Brexit nenhum.

Mas esta nem é a linha especulativa mais interessante, porque o que ficaremos todos sem saber é se, estando a ser implementado este programa, a UE não preferiria, afinal, apressar a saída que sempre tentou inviabilizar, até que se tornasse um exercício de humilhação. No fim de contas, se há coisa de que Bruxelas não gosta é de vozes realmente dissonantes.

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O cineasta era membro do Partido Trabalhista desde os anos 60, com alguns interregnos, tendo retomado recentemente a participação activa no partido por causa da liderança de Jeremy Corbyn.

A dedicação de Corbyn, Loach e de muitos outros membros do Labour à causa Palestiniana, contra as agressões do estado Israelita, motivaram uma campanha de difamação das alas mais conservadoras do Partido, com relações próxims com Israel, acusando-os de antisemitismo. Largas dezenas de militantes do Partido Trabalhista foram suspensas ou expulsas, ao mesmo tempo que dezenas de milhar rescindiram a sua militância, em resposta à perseguição, liderada por Keir Starmer, actual líder dos Trabalhistas, a figuras ligadas ao movimento sindical e de boicote a Israel.

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É bastante claro que o objectivo de Starmer é purgar o que resta da tendência Momentum no Labour, um movimento de base popular que nasceu na altura da liderança de Jeremy Corbyn, e através do qual o Labour conseguiu entre 20 a 30 mil novos militantes. Em Novembro, o Guardian noticiava que o Momentum estava em enormes dificuldades financeiras. Ser membro do Labour é um requisito para se pertencer ao Momentum, que depende de contribuições individuais, e que viu «milhares de militantes de esquerda abandonarem o movimento, sob a liderança de Keir Starmer». Para onde foram, não sabemos. A purga de militantes está a acontecer um pouco por todo o país a potenciais candidatos que sejam apoiados por sindicatos ou que tenham proximidade com Corbyn.

Em simultâneo, Financial Times recomenda a Starmer que não seja «audaz» nas suas políticas: «Os eleitores querem que um líder tenha resoluções, sim, mas principalmente negativas. Não vou aumentar impostos sobre o rendimento. Não vou pedir emprestado para gastar. Não vou reabrir o processo do Brexit. (…) Uma visão positiva não é o que garante eleições. É a ausência de um susto. Em 1997, Blair era considerado vago e hesitante. Teve que se contentar com apenas a maioria de 179 lugares no parlamento. Seja menos corajoso, Starmer. Limite a sua imaginação política».

Se até o Financial Times dá Starmer garantido como primeiro-ministro mas recomenda-lhe comedimento nas políticas (que não seja demasiado radical, portanto), está aberta a frente organizada do capital britânico para que os Trabalhistas sucedam aos Conservadores sem grandes convulsões, sem grande ruído, com a naturalidade da alternância política democrática, reflectidos num espelho cada vez mais iguais entre si e a servir os interesses da burguesia britânica.

Hoje, contudo, a situação económica, social, e até geopolítica, do Reino Unido é muito diferente de quando o Labour estava no poder. E o país está numa conjuntura extraordinária, porque rara, de grandes convulsões sociais e de mobilização de milhões de trabalhadores. Isto acontece também num momento em que é cada vez mais evidente o afastamento de inúmeros sindicatos do Labour.

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Se o Labour não apoia os trabalhadores, os sindicatos não apoiam o Labour

O Unite, o maior sindicato no Reino Unido, anunciou que vai deixar de apoiar financeiramente o Labour. Já a juventude do Labour prometeu não voltar a fazer campanha por candidatos que furem um piquete de greve.

50 mil funcionários de 58 universidades no Reino Unido cumpriram três dias de greve na semana passada, apoiados por centenas de professores que não deram aulas, em solidariedade, durante esse período, Universidade de Glasgow, Escócia, 1 de Dezembro 2021
Créditos / socialistworker.uk.co

A reformulação do gabinete-sombra do Labour (Partido Trabalhista Britânico), comandada, esta semana, pelo seu actual líder, Keir Stammer, marcou mais um passo na progressiva aproximação à direita do partido. A extinção do cargo de ministro-sombra para os direitos trabalhistas não deixa muitas dúvidas sobre as novas prioridades da direcção do partido: a economia, não os trabalhadores.

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Ken Loach expulso do Partido Trabalhista Britânico

O cineasta Inglês, que em 2016 venceu a segunda Palma de Ouro no Festival de Cannes por Eu, Daniel Blake, foi notificado da sua expulsão do Labour por se recusar a legitimar a purga «de bons amigos e camaradas».

Ken Loach em frente ao cartaz do filme <em>Eu, Daniel Blake</em>, 2016 
Créditos / ctb.org

Conhecido pela sua intervenção social, empenhado na denúncia do capitalismo, da exploração laboral e da pobreza, Ken Loach é um dos mais importantes cineastas Ingleses. A sua penúltima longa-metragem, Eu, Daniel Blake (2016), expõe, nas suas palavras, «a constante humilhação de sobreviver. Se tu não vives furioso com isso, que raio de pessoa és?».

Em Eu, Daniel Blake, Loach retrata a experiência desumanizante de um homem a quem é recusada uma pensão de invalidez, muito embora tenha sido declarado inapto para trabalhar. Através da sua perspectiva vamos conhecendo a míriade de gente abandonada pelo sistema, que vive nas suas frinjas, sobrevivendo de restos. «É grotesto que aceitemos e achemos normal que alguém possa morrer de fome se não aceitar caridade», afirmou Ken Loach, por alturas do lançamento do filme.

O cineasta anuncioua na sua página de Twitter que «o quartel-general do Partido Trabalhista decidiu finalmente que não sou digno de continuar a ser membro do seu partido, já que me recusei a renegar aqueles que têm vindo a ser expulsos. Tenho orgulho em encontrar-me ao lado de bons amigos e camaradas, vítimas desta purga. É, sem dúvida, uma caça às bruxas... O Starmer e a sua clique nunca dirigirão um partido do povo. Somos muitos, eles são poucos. Solidariedade!».

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Eleições no Reino Unido: duas lições e uma especulação infame

Sair da União Europeia não tem de ser necessariamente um processo de recrudescimento nacionalista com negação de direitos fundamentais.

CréditosFonte: Europarlamento

As eleições no Reino Unido passaram e o resultado foi o que se conhece: os Conservadores de Boris Johnson ganharam e o afamado e estafado Brexit poderá (?), por fim, ver a luz do dia.

Primeira lição que é preciso tirar: por mais esotéricos que nos pareçam os candidatos de alguns partidos, não é por a comunicação social mainstream os diabolizar ou ridicularizar, que eles deixam de vencer. De resto, é bastante provável que uma das causas das suas vitórias seja, justamente, aparecerem nos antípodas do mainstream – afinal de contas, convém lembrar que, na maioria dos casos, foi esse mesmo mainstream que roubou direitos e esvaziou os bolsos da maioria dos eleitores, enquanto enchia os bolsos dos grandes grupos económicos. Não obstante, é útil registar que, ao contrário do que se passava no exterior, uma parte da comunicação social do Reino Unido nunca teve pejo de procurar caluniar o Partido Trabalhista (Labour) e, em particular, o seu mais alto dirigente, Jeremy Corbyn.

Prossigamos.

Os indefectíveis acólitos do projecto da integração capitalista europeia, vulgo, União Europeia (UE), chorarão agora pelos cantos, travestidos de cândidos democratas, alguns deles até «de esquerda», estupidificando o povo do Reino Unido e cantando a miséria e a desgraça para as terras de Sua Majestade, enquanto fazem mais umas profissões de fé sobre o «inabalável» futuro da União.

Segunda lição: o povo nem sempre acerta, é verdade, mas a estratégia de acenar com os espantalhos do cavaleiro do Apocalipse, nem sempre leva a bom porto. Resultou na Irlanda, aquando da repetição do referendo do Tratado de Lisboa, que lá martelou o «Sim», mas como está bom de ver aqui, a hostilidade da cúpula da UE durante este processo só entrincheirou mais o povo britânico na posição que já tinha. Lá diz o nosso povo que «com vinagre não se apanham moscas».

Mas vamos para a frente que, seguindo os ditos populares, atrás vem gente.

Com efeito, a ironia suprema destas eleições que – contra os avisos do próprio Corbyn – muitos venderam como um novo assalto no combate pró e contra o Brexit, o programa do Labour (consultável na íntegra aqui)1 está, possivelmente, mais nos antípodas das orientações da UE, que o dos próprios Conservadores.

Na realidade, ao propor a renacionalização de um conjunto de serviços públicos, aumentos significativos nos salários, redução do horário de trabalho, aposta no transporte público, investimento público em larga escala para resolver na esfera pública problemas da habitação e da saúde, entre outras medidas verdadeiramente progressistas, a mensagem subliminar que, de algum modo, o Labour estava a enviar à cúpula ao leme da UE era: «nós não queremos sair, queremos mesmo é que nos expulsem».

É verdade que nem o Reino Unido é a Grécia (geopoliticamente falando), nem o estar ou não amarrado aos compromissos do Euro é indiferente. É igualmente verdade que a História da social-democracia já nos mostrou que espinha dorsal é coisa que não abunda para aqueles lados (veja-se como agora a oposição interna a Corbyn dentro do próprio Partido Trabalhista o vai tentar destruir). Por isso, é avisado não entrar em grandes especulações ou euforias.

Pese embora tudo isto, é realmente lamentável que o Labour tenha perdido estas eleições, muito menos pelo que venha a ser o desenvolvimento do Brexit, e muito mais pelo que teria de desafiante implementar uma política que – a cumprirem-se as promessas feitas – iria largamente contra os pergaminhos do ideário neo-liberal, algo que teria impacto muito para lá das fronteiras do Reino Unido.

Nessa medida temos que nos ficar pela especulação e não chegar ainda à terceira lição: sair da UE não tem de ser necessariamente um processo de recrudescimento nacionalista com negação de direitos fundamentais, a saída pode corresponder precisamente à constatação da incompatibilidade entre o desenvolvimento económico e social soberanos e o projecto de integração capitalista, militarista e anti-democrático, que é a UE.

Como nota final, convém registar que, em nenhum momento, o Labour disse que iria ignorar o resultado do referendo que levou ao Brexit, mas antes reformular todo o plano para conduzir a uma saída suave e, antes de a concretizar, referendá-la novamente. Dirão alguns que, se os trabalhistas tivessem ganho, provavelmente um novo referendo teria como resultado que, afinal, não havia Brexit nenhum.

Mas esta nem é a linha especulativa mais interessante, porque o que ficaremos todos sem saber é se, estando a ser implementado este programa, a UE não preferiria, afinal, apressar a saída que sempre tentou inviabilizar, até que se tornasse um exercício de humilhação. No fim de contas, se há coisa de que Bruxelas não gosta é de vozes realmente dissonantes.

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O cineasta era membro do Partido Trabalhista desde os anos 60, com alguns interregnos, tendo retomado recentemente a participação activa no partido por causa da liderança de Jeremy Corbyn.

A dedicação de Corbyn, Loach e de muitos outros membros do Labour à causa Palestiniana, contra as agressões do estado Israelita, motivaram uma campanha de difamação das alas mais conservadoras do Partido, com relações próxims com Israel, acusando-os de antisemitismo. Largas dezenas de militantes do Partido Trabalhista foram suspensas ou expulsas, ao mesmo tempo que dezenas de milhar rescindiram a sua militância, em resposta à perseguição, liderada por Keir Starmer, actual líder dos Trabalhistas, a figuras ligadas ao movimento sindical e de boicote a Israel.

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Embora o sindicato vá continuar a pagar as quotas da sua afiliação ao Labour, Sharon Graham, recém-eleita secretária-geral do sindicato Unite, com mais de 1,4 milhões de afiliados, não tem dúvidas de que o resto do «dinheiro do fundo político [usado pelo sindicato para financiar campanhas eleitorais], devia estar a ser melhor utilizado».

«Westminster não é o centro de tudo, há outras formas de fazer com que as coisas aconteçam, marcar o passo» de políticas laborais e sociais, que a direcção do Labour, se quiser, deve acompanhar. O fundo político será agora realocado para grandes campanhas, nacionais, regionais e locais, que beneficiem, directamente, os trabalhadores.

Graham abdicou de participar na convenção do Partido Trabalhista Britânico em Setembro, tendo escolhido dedicar-se, a tempo inteiro, a disputas laborais. «Não sei em que mundo é que eles vivem, mas não é certamente no meu, no que eu vivo as pessoas estão assustadas. Não sabem o que lhes vai acontecer, estão zangadas, em sofrimento, e a ideia de que os políticos não conseguem começar a falar sobre o que fazer é ultrajante».

O Young Labour, juventude do partido em que participam todos os militantes entre os 14 e os 26 anos, publicou um comunicado na sexta-feira a anunciar que não voltará a fazer «campanha, organizar ou angariar votos para candidatos ou deputados que não defendam os trabalhadores, que não respeitem os piquetes de greve ou não defendam o direito à luta laboral».

«Os sindicatos são o alicerce do movimento laboral e estão na linha da frente na defesa dos direitos dos trabalhadores contra patrões corruptos e governos conservadores, que causaram sofrimento a milhões de pessoas». Toda a energia do Young Labour vai ser agora dispendida na luta pela eleição de «candidatos do Labour que, explicitamente, defendam os sindicatos, respeitem os piquetes e representem, inflexivelmente, os direitos dos trabalhadores nos respectivos cargos».

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O boicote à participação de membros do governo sombra de Starmer nos piquetes das greves, desde o Verão passado, caiu muito mal junto dos sindicatos e de militantes mais à esquerda (alguns até impedidos de se solidarizarem com os trabalhadores). A líder de uma das maiores centrais sindicais do Reino Unido, a UNITE, Sharon Graham, disse então: «O Labour precisa ganhar espinha dorsal e apoiar os trabalhadores».

«Não é função dos parlamentares do Labour impedir as pessoas de ir trabalhar, mas é função dos parlamentares do Labour mostrar às pessoas de que lado estamos. Deveríamos ter trabalhado de forma clara, com mais antecedência, sobre como o Labour demonstraria esse apoio, sem necessariamente fazer piquetes», disse um militante fiel à liderança de Starmer. Não é função de militantes do Labour apoiar trabalhadores em greve, estar ao lado de trabalhadores em piquetes. Chegámos a 2023 para isto ser a realidade de um partido criado, ironicamente, pelo movimento sindical.

Estas declarações surgiram na altura da Convenção anual do Labour, em Setembro de 2022. Convenção essa de que a líder da UNITE esteve ausente pelo segundo ano consecutivo. Em entrevista à BBC, Graham disse que este era a oportunidade de Starmer «ser audaz» e estar do lado dos trabalhadores: «É tempo de apresentar uma alternativa, tempo de conduzir a mudança», disse. Como vimos, o Financial Times discordou. E ditou o caminho deste Labour.

E a esquerda britânica?

Isto acontece num momento em que milhões de trabalhadores britânicos estão nas ruas, em greves, mobilizados por sindicatos afectos ao Labour ou independentes do Partido Trabalhista. Segundo a New Statesman, «a escala da actual onda de disputas ainda está muito aquém das décadas de 1980 ou 1970, mas é já é um factor material que impacta o PIB britânico pela primeira vez em quase três décadas».

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Trabalhadores da Amazon em Coventry em greve contra aumento de 57 cêntimos

Os trabalhadores estão prontos para uma «luta de David contra Golias», disse um dirigente sindical a propósito da paralisação desta terça-feira, que se repete esta quinta e na semana de 13 de Março.

Trabalhadores da Amazon em greve no centro de distribuição de Coventry (Inglaterra) 
Créditos / Morning Star

Mais de 350 trabalhadores estiveram ontem em greve no centro de distribuição da Amazon em Coventry, entre as 6h e as 8h e as 18h e as 20h, informou fonte sindical.

A paralisação, que se deve repetir amanhã e de 13 a 17 de Março, segue-se à proposta de aumento salarial de meia libra por hora (57 cêntimos).

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Trabalhadores da Amazon em Coventry avançam para a greve

Rejeitando a proposta de aumento salarial de meia libra por hora, os funcionários decidiram por maioria esmagadora avançar para a primeira greve formal nas instalações da multinacional no Reino Unido.

Instalações da Amazon 
Créditos / Morning Star

A primeira greve que a multinacional norte-americana do retalho – que tem sido acusada de práticas anti-sindicais – enfrenta em território britânico deve ter lugar em Janeiro, anunciou o sindicato GMB, que representa os trabalhadores.

A responsável principal do sindicato, Amanda Gearing, congratulou-se com a «votação histórica», afirmando que os trabalhadores «devem ser aplaudidos pela sua coragem e determinação, e por lutarem por aquilo que é correcto, num ambiente extremamente hostil».

Disse ainda, citada pela Reuters, que «os trabalhadores da Amazon em Coventry fizeram história – serão os primeiros no Reino Unido a participar numa greve formal» na empresa.

A votação, que encerrou esta sexta-feira, contou com a participação de 68% dos trabalhadores, 98% dos quais disseram «sim» à greve, anunciou o GMB.

Desta forma, os trabalhadores rejeitam a proposta de aumento salarial de meia libra (57 cêntimos) por hora, avançada pela multinacional.

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Trabalhadores dormem em tendas junto às instalações da Amazon na Escócia

Há muito que o gigante do retalho é acusado de explorar os seus funcionários e de os submeter as condições laborais miseráveis. O caso recentemente revelado na Escócia volta a apontar o foco para a empresa.

Armazém da Amazon em Dunfermline (Fife, Escócia)
Créditos / theferret.scot

Há alguns dias, o periódico britânico The Courier chegou à fala com um dos trabalhadores acampados junto às instalações da Amazon em Dunfermline, na região escocesa de Fife, onde foram avistadas pelo menos três tendas. Com relutância e sob anonimato, o funcionário acabou por explicar que era mais fácil e barato ficar na tenda do que ir todos os dias para casa, em Perth, a cerca de 50 quilómetros.

Isto passa-se numa altura em que as noites se tornaram muito frias, com as temperaturas a descerem até aos -7 ºC. O trabalhador classificou ainda como «empregador miserável» o gigante do comércio electrónico, que cobra 12 euros diários aos seus funcionários para que estes possam viajar nos seus autocarros.

«Isto passa-se numa altura em que as noites se tornaram muito frias, com as temperaturas a descerem até aos -7 ºC.»

Ao ter conhecimento de que havia trabalhadores a dormir em tendas nas florestas em redor da Amazon, em Dunfermline, o deputado escocês Willie Rennie, que tem reivindicado a melhoria das condições de trabalho na empresa, afirmou: «A Amazon devia ter vergonha por pagar tão pouco aos seus trabalhadores, de tal modo que até têm de acampar no pino do Inverno para conseguir sobreviver».

Rennie, que acusou a Amazon de pagar muito pouco em impostos e de receber milhões de libras do governo escocês, disse ainda ao The Courier que «o mínimo que se lhe exigia era que pagasse um salário digno», acrescentando que «aquilo que a empresa cobra pelo transporte consome uma boa parte do salário semanal, levando a que as pessoas busquem formas cada vez mais desesperadas de fazer com que trabalhar compense».

Uma representante da Amazon nas instalações de Dunfermline – que conta com 1500 trabalhadores fixos e 4000 temporários, contratados para a época do Natal e do Ano Novo – disse que a empresa «paga salários competitivos». «Todos os colaboradores permanentes e temporários da Amazon recebem salários a partir das 7,35 libras (8,7 euros) por hora, independentemente da idade, e a partir de 11 libras (13 euros) por cada hora extraordinária».

«A Amazon explora os trabalhadores»

No final do mês passado, por ocasião da Black Friday («sexta-feira negra», em português), sindicatos e diversas associações manifestaram-se junto aos armazéns da Amazon em Dunfermline em protesto contra a «exploração dos trabalhadores». De acordo com os manifestantes, os funcionários são obrigados a trabalhar «até 60 horas semanais por pouco mais do que o salário mínimo», sob intenso controlo e pressão, e em condições muito deterioradas.

Um porta-voz dos manifestantes disse ao The Courier que a Amazon tem possibilidade de criar condições de trabalho excelentes, mas que não o faz porque «quer mais lucros, a qualquer custo». E isto significa «à custa dos trabalhadores, que não são mais bem tratados do que drones».

«As acusações de más condições de trabalho e assédio moral aos trabalhadores na Amazon têm-se sucedido ao longo dos anos.»

As acusações de más condições de trabalho e assédio moral aos trabalhadores na Amazon têm-se sucedido ao longo dos anos. The Independent refere situações denunciadas pelos trabalhadores como multas por um minuto de atraso após o almoço; quatro dias de trabalho seguidos, sem dormir; a colocação de uma funcionária com cancro da mama num «plano de melhoria de performance», porque – segundo lhe foi dito – a sua «vida pessoal» estava a interferir com o trabalho.

Com base em diversas fontes, a Sputnik indica o caso de trabalhadores que foram despedidos por adoecerem ou por chorarem, bem como condições laborais «prisionais» e locais de trabalho «gelados» ou «tão quentes que os funcionários desmaiam». O ano passado, um sindicato britânico denunciou que as condições de trabalho nos armazéns da Amazon no Reino Unido estavam a tornar os seus funcionários «física e mentalmente» doentes, informa ainda a Sputnik, com base numa reportagem do The Guardian.

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«O facto de serem forçados a fazer greve para ganharem um salário decente numa das empresas mais valiosas devia ser fonte de vergonha para a Amazon», criticou a representante sindical.

Em seu entender, o gigante do retalho tem capacidade para fazer melhor. «Não é tarde para evitar greves e sentar-se à mesa com o GMB para melhorar os salários e as condições», disse Gearing, citada pelo Morning Star.

Hayley Greaves, trabalhador filiado no GMB que trabalha nas instalações de Coventry, no Centro de Inglaterra, disse ao The Guardian: «O custo de vida está a aumentar e estamos mesmo a passar mal. Se conseguirem, as pessoas trabalham 60 horas por semana; se não conseguirem 60 horas, fazem outros trabalhos.»

«Se nos unirmos e nos mantivermos juntos, talvez tenhamos uma hipótese de lutar e alcançar mudanças para todos», acrescentou.

No início deste ano, uma trabalhadora relatou ao periódico, anonimamente, as elevadas pressões exercidas sobre os funcionários, nomeadamente para que classifiquem centenas de artigos por hora.

«Se estás ali há quatro anos e é o teu quarto ou quinto turno da semana, és capaz de não conseguir fazer isso às três da manhã», disse.

Um porta-voz da empresa disse que valorizava o trabalho dos funcionários e que, desde 2018, tinham tido aumentos de 29% no salário mínimo por hora.

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No passado dia 25 de Janeiro, os trabalhadores da multinacional norte-americana do retalho em Coventry (Centro de Inglaterra) «fizeram história», ao serem os primeiros no Reino Unido «a participar numa greve formal» na empresa, destacou Amanda Gearing, dirigente do GMB, o sindicato que os representa.

Além de aumentos salariais, os trabalhadores denunciam «práticas de gestão autoritárias e longas horas», num ambiente «extremamente hostil» – a Amazon não reconhece o sindicato e tem sido acusada, pelo mundo fora, de práticas anti-sindicais.

Os trabalhadores em luta reivindicam uma remuneração de 15 libras por hora – um aumento de 43%, face aos 5% ou meia libra propostos pela empresa, que alega já ter pago aos trabalhadores um suplemento de 500 libras, no Natal, para fazer frente ao custo de vida.

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Esquerda francesa reage mal à Legião de Honra atribuída a Jeff Bezos

No dia 16 Fevereiro, quinta jornada de mobilização nacional contra a reforma das pensões, Macron atribuiu, em segredo, ao multimilionário norte-americano a Legião de Honra, revelou o semanário Le Point.

Jeff Bezos (iamgem de arquivo) 
CréditosXavier Collin / francetvinfo.fr

A peça do Le Point ontem publicado só é acessível a assinantes, mas outros meios de comunicação confirmaram a informação ali divulgada: o fundador da Amazon, actual director executivo do gigante do retalho electrónico, é Cavaleiro da Legião de Honra.

A condecoração mais importante do Estado francês foi atribuída a Bezos no passado dia 16, «numa cerimónia faustosa mas confidencial», revelam os periódicos com acesso ao Le Point.

Nesse dia, mais de um milhão de pessoas (1,3 milhão) mobilizavam-se pela quinta-vez, desde 19 de Janeiro, contra um projecto que, entre outros aspectos, prolonga a idade legal de reforma dos 62 para os 64 anos.

Os sindicatos denunciam que os franceses vão ser obrigados a trabalhar mais por menos e que a proposta governamental é «brutal, inaceitável e injusta».

Representantes da esquerda recorreram ao Twitter para expressar a sua indignação. «Emmanuel Macron entrega a Legião de Honra a Jeff Bezos, patrão da Amazon, explorador mundial e rei da optimização fiscal», criticou o deputado e secretário nacional do Partido Comunista Francês, Fabien Roussel.

Em seu entender, «a doutrina do presidente» consiste em «castigar todos os franceses e recompensar os multimilionários».

Por seu lado, Leïla Chaibi, deputada ao Parlamento Europeu pelo França Insubmissa, escreveu com ironia: «Bravo, Jeff Bezos!» E acrescentou: «Enquanto nos manifestávamos contra a sua reforma das pensões, Macron condecorou-o em nome de França por fugir aos impostos em milhares de milhões, por destruir o planeta e espiar os trabalhadores», aludindo à jornada de mobilização de 16 de Fevereiro e a várias acusações existentes contra o gigante do retalho.

Entre os membros do França Insubmissa, o deputado à Assembleia Nacional Bastien Lachaud foi outro dos que se referiram à situação, criticando Macron por atribuir a Legião de Honra a Bezos, «campeão da evasão fiscal», «saqueador de empregos e da natureza».

«Mais que nunca, o presidente dos ricos!», escreveu, criticando Macron.

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Em declarações à imprensa, Amanda Gearing diz que a greve «mostra a revolta dos trabalhadores da Amazon em Coventry», que «trabalham para uma das empresas mais ricas do mundo e, ainda assim, têm de trabalhar dia e noite para sobreviver».

Stuart Richards, também delegado sindical do GMB, destacou que «os trabalhadores estão novamente nos piquetes de greve porque uma das empresas mais lucrativas do mundo lhes nega um salário que lhes permita viver».

«É uma luta de David contra Golias e os nossos filiados estão determinados a garantir que termina com o aumento que merecem», disse, citado pelo Morning Star.

A multinacional, fundada em 1994 pelo multimilionário norte-americano Jeff Bezos, afirma que oferece aos trabalhadores «um salário competitivo, benefícios abrangentes e oportunidades para a evolução na carreira».

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Este movimento de trabalhadores no Reino Unido não tem precedentes nas últimas décadas. Os números revelam que o número de trabalhadores sindicalizados tem vindo a aumentar: 1%, isto é, um em cada 10 trabalhadores no Reino Unido é sindicalizado, num total de 6,7 milhões (dados do período 2019-2021). Verdade, nada comparado com os 13 milhões dos governos de Margaret Thatcher. Mas aguardemos pelos dados de 2022 porque deverão ser surpreendentes.

Algumas das greves dos últimos meses são históricas: quer em número de trabalhadores envolvidos, quer em sectores que o fazem pela primeira vez. Dia 1 de Fevereiro, mais de 500 mil estiveram na rua numa mini greve geral concertada entre vários sectores. Todo o mês de Fevereiro estiveram em greve professores do básico, secundário e universitário, trabalhadores da ferrovia e dos transportes urbanos, enfermeiros e correios. Até, pela primeira vez, armazéns de distribuição da Amazon. E os médicos anunciaram três dias de greve em Março avisando que o NHS está «em ruptura».

Enquanto os protestos tomam as ruas, o Governo britânico prepara-se para introduzir legislação por serviços mínimos que restringe o direito à greve – já contestada em carta assinada por várias confederações sindicais europeias, como a espanhola CCOO, a francesa CGT e a alemã DGB, entre outras –, a somar à lei anti-protesto aprovada ainda durante a legislatura de Boris Johnson, e uma nova lei sobre o direito ao voto que obriga a novas formas de identificação.

É, aliás, a estas leis que Jeremy Corbyn se refere na sua coluna no Tribune, o primeiro depoimento mais longo desde que foi boicotado pelo Labour. Corbyn insiste: no custo de vida, na inflação, nos lucros das grandes empresas, no colapso ecológico, na luta dos trabalhadores. Diz que o Labour está a fazer uma purga de militantes de esquerda. E conclui: «No mínimo, a democracia consiste em dar às pessoas espaço para lutar pela redistribuição sem medo de reprovação. É por isso que continuarei a lutar pelos direitos dos membros locais em Islington North e pelos direitos dos trabalhadores nos piquetes. Aqueles que estão no caminho da mudança transformadora querem retirar-nos os nossos direitos democráticos, porque sabem que quando nos unimos, podemos vencer. O maior medo deles é a democracia, porque a democracia é a nossa maior força».

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Reino Unido: democratas «devem opor-se» à limitação de direitos sindicais

Trabalhadores em greve podem ser substituídos por contratados temporariamente. Aquilo que era uma «infracção penal» passa a ser «uma opção para as empresas», frisou o secretário dos Negócios e Energia.

Mick Lynch, secretário-geral do sindicato RMT, denunciou a legislação anti-greve do governo britânico 
Créditos / morningstaronline.co.uk

«Não vamos deixar os sindicatos paralisar a nossa economia», disse Kwasi Kwarteng ao dar conta da alteração legislativa na sua conta de Twitter.

Comentando a medida do governo, Mick Lynch, secretário-geral do sindicato Rail, Maritime and Transport (RMT), sublinhou que se trata do «último passo da repressão sobre a dissidência democrática a que todos os sindicalistas e democratas se devem opor».

«A utilização de trabalho temporário para acabar com as greves não é apenas anti-ética e moralmente repreensível, é totalmente impraticável», frisou Lynch.

«Os trabalhadores das empresas de trabalho temporário (ETT) não terão a habilidade, o treino ou as competências necessárias para conduzir um combóio, fazer trabalhos complexos de manutenção na via, sinalizar comboios ou fazer toda uma série de trabalhos críticos de segurança na rede», alertou o dirigente sindical, referindo-se à área da ferrovia.

«Em vez de tentar reduzir os direitos dos sindicatos, que já são os piores da Europa ocidental, o governo devia libertar a Network Rail e as empresas que operam a ferrovia, para que chegássemos a um acordo», disse, citado pelo Morning Star.  

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Reino Unido: alertas face ao avanço na privatização da saúde pública

Sindicatos, utentes, partidos de esquerda estão a denunciar o «Health and Care Bill» do governo de Boris Johnson, afirmando que se trata de um cavalo de Tróia para aprofundar a privatização da saúde pública.

Protesto contra a privatização do NHS no Reino Unido 
Créditos / keepournhspublic.com

À medida que o projecto da Lei da Saúde e dos Cuidados avança, depois de ter sido apresentado, em Julho, pelo governo conservador britânico, sobe de tom a oposição de vários sectores progressistas e de esquerda, que vêem na «lei do assalto corporativo» ao National Health Service (NHS; serviço nacional de saúde) uma forma de aprofundar a sua privatização e de colocar áreas-chave da saúde pública nas mãos dos privados.

Esta semana, um deputado do Partido Trabalhista exigiu a reversão da privatização do NHS, bem como a supressão do projecto de lei conservador, refere o Peoples Dispatch. Reclamou ainda o financiamento adequado do serviço nacional de saúde, incluindo um aumento salarial de 15% para os seus funcionários.

A grande maioria dos britânicos opõe-se à privatização do serviço nacional de saúde / The Guardian

Organizações como We Own It e Unite the Union, iniciativas e campanhas como Save the NHS e Just Treatment também têm estado activas e a expressar as suas preocupações sobre o projecto de lei, acusando o governo de Johnson de usar a pandemia de Covid-19 para privatizar serviços importantes do NHS.

O governo britânico defende a necessidade de reorganizar o sistema, aproximando os hospitais do apoio social e atribuindo um papel mais formal às empresas privadas na «colaboração» com o serviço público – que já detêm.

Os oponentes afirmam que a referida reorganização – que irá dividir o NHS em 42 unidades integradas, «cada qual com o seu orçamento apertado» – significa um aprofundamento da privatização do sistema, quando, no contexto da pandemia, se exige um maior investimento público.

O projecto de lei, que já foi aprovado na Casa dos Comuns duas vezes em Julho, encontra-se na fase da Comissão, prevendo-se que seja submetido a uma terceira votação em Outubro. De acordo com a fonte, o governo de Boris Johnson quer lançar a «reforma» a todo o vapor em Abril do próximo ano.

«Esta não é a receita de que necessitamos»

Numa declaração proferida na terça-feira, Jacalyn Williams, responsável da área da Saúde do sindicato Unite the Union, sublinhou que o «NHS é a nossa maior conquista e, depois de uma década de subfinanciamento e de lidar com a pandemia de Covid-19, esta lei não é a receita de que necessitamos». Disse ainda que a lei é um cavalo de Tróia, que vai trazer maior privatização, clientelismo, austeridade, e dará carta branca para «atropelar e vender o NHS».

Por seu lado, a organização Just Treatment afirmou que o projecto de lei vai conduzir o serviço público para um estilo à americana, onde os lucros são postos à frente da saúde, e destacando que lucrar com a saúde das pessoas contraria os princípios do NHS. O organismo lembrou ainda que, entre os muitos poderes que as empresas privadas passarão a ter, está o de decidir aquilo que os trabalhadores ganham, o que significará cortes para enfermeiros e médicos sobrecarregados.

De acordo com as estimativas do Unite the Union, o nível de privatização do NHS em 2018-19 variou entre 7% e 22%, e mesmo o valor mais baixo representou a transferência de 9,2 mil milhões de libras (10,7 mil milhões de euros) do orçamento do NHS para os bolsos dos privados.

Imagem da campanha contra o projecto de lei do governo britânico na área da Saúde / campanha We Own It

«Os utentes e os trabalhadores não querem mais poder corporativo no NHS»

Robert Griffiths, secretário-geral do Partido Comunista Britânico, também criticou a «proliferação de cuidados de saúde privados, a transferência de serviços do NHS para empresas guiadas pelo lucro, a drenagem de recursos do NHS para Inciativas de Financiamento Privado (PFI) e a duplicação dos pagamentos a entidades privadas desde 2010», informa o Peoples Dispatch.

Segundo um inquérito realizado pela campanha We Own It (é nosso) e pela Survation, 76% dos inquiridos disseram que desejavam ver o NHS «restabelecido como um serviço totalmente público», frente a apenas 15% que aceitaram a colaboração privada com a saúde pública.

«Os utentes e os trabalhadores não querem mais poder corporativo no nosso NHS – queremos mais financiamento, uma voz democrática sobre o modo como funciona, apoio adequado aos trabalhadores e o fim dos planos de privatização», afirmou a Just Treatment numa declaração da sua campanha contra o projecto de lei de Boris Johnson.

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Por seu lado, a secretária do Congresso dos Sindicatos (TUC), Frances O'Grady, disse que a medida do governo é uma «receita para o desastre».

«A utilização de trabalhadores de ETT para tentar quebrar as greves colocaria estes trabalhadores numa posição tremenda, agravaria os conflitos e envenenaria as relações laborais», alertou.

O governo quer minar o «direito fundamental à greve», destacou O'Grady, lembrando ainda que a medida constitui uma ameaça à segurança pública, uma vez que pôr trabalhadores não treinados em determinadas funções pode colocá-los em risco a eles e aos utentes dos serviços.

«Numa altura em que milhões lutam para chegar ao fim do mês, o governo ataca a capacidade dos trabalhadores para reivindicar salários mais altos», disse O’Grady.

Neoliberais a atacar direitos dos trabalhadores e com discurso para dividir as camadas populares

Na sua página online, o governo britânico afirma que, a partir de ontem, as empresas afectadas por greves «podem recorrer a funcionários temporários e qualificados, com pouca antecedência, para preencher postos essenciais».

O secretário britânico dos Negócios e Energia justificou a medida à luz «da acção sindical militante que ameaça paralisar serviços públicos essenciais», acrescentando que tinha agido com rapidez para «revogar estas restrições onerosas, ao estilo dos anos 70».

As «pessoas honestas e trabalhadoras podem prosseguir com as suas vidas», ou seja, sem ter pela frente os incómodos das consequências da luta dos trabalhadores por melhores condições de trabalho e melhores salários, para denunciar o aumento do custo de vida ou a má gestão governamental dos recursos públicos.

Para Kwarteng, esta quinta-feira trouxe boas notícias «à nossa sociedade e à nossa economia».

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Centenas perdem o emprego no esquema «despede e recontrata» da British Gas

«30 anos de serviço leal não contam para nada», disse um engenheiro da British Gas, a maior empresa de energia do Reino Unido. Centenas ficaram sem trabalho ao não aceitarem piores condições.

Trabalhadores em luta contra o esquema de «despedimento e recontratação» da British Gas 
Créditos / The Guardian

Estima-se que entre 300 e 400 funcionários da British Gas tenham perdido o posto de trabalho na quarta-feira passada, depois de se recusarem a alinhar no esquema de «despedimento e recontratação» que lhes foi imposto pela empresa.

No passado dia 1 de Abril, o maior fornecedor de energia do Reino Unido entregou cartas de despedimento a cerca de mil dos seus engenheiros, que instalam e reparam caldeiras e sistemas de calefacção para os nove milhões de clientes da empresa.

Os trabalhadores tinham duas semanas para decidir se saíam para regressarem assinando novos contratos, que implicavam uma redução salarial e mais horas de trabalho, com turnos também aos fins-de-semana e feriados – de borla.

De acordo com The Guardian, o polémico esquema de «despedimento e recontratação» é legal, e a maioria dos sindicatos aceitou o agravamento das condições laborais, sendo que, até terça-feira, centenas de funcionários assinaram os novos contratos.

Luta contra o despedimento colectivo e «coerção»

O sindicato GMB destacou-se na oposição ao «esquema», ao longo de uma luta de nove meses travada contra a administração da empresa, e levou a cabo mais de 40 dias de greve, em protesto contra o «despedimento colectivo» e o «tratamento vergonhoso» dos trabalhadores, acusando o fornecedor de fazer «bullying» sobre os funcionários.

Andy Prendergast, dirigente do GMB, denunciou que muitos dos 8000 engenheiros aceitaram as novas condições «sob coerção», e sublinhou que o tratamento «chocante» dos funcionários provocou danos na sua moral.

A dona da British Gas, Centrica, anunciou os planos de emagrecimento no Verão passado, alegando para tal a perda de mais de três quartos do seu valor de mercado nos últimos cinco anos, os efeitos da pandemia e a necessidade de proteger a qualidade do serviço e milhares de postos de trabalho.

No entanto, muitos dos engenheiros visados não se mostraram convencidos com esta argumentação, tendo denunciado nas redes sociais o «esquema» e o modo como foram tratados depois de anos e anos de serviço, e expressando a recusa em aceitar piores condições de trabalho: «Não vou assinar um contrato inferior», escreveu no Twitter um dos engenheiros da British Gas que ficaram sem trabalho.

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A medida já andava a ser comentada da imprensa desde o mês passado, na sequência das greves com forte impacto no sector dos transportes. Precisamente o secretário dos Transportes, Grant Shapps, mostrou-se determinado a fazer frente ao que chamou o poder dos dirigentes sindicais, que acusou de manter «o país refém».

Em tom igualmente populista ao de Kwarteng e querendo gerar divisão no seio das camadas atingidas pelo efeito bumerangue das sanções contra a Rússia e pelas políticas neoliberais do executivo conservador, Shapps também pôs de um lado os maus dos grevistas, que têm o poder de perturbar o funcionamento do país, e as coitadas das pessoas trabalhadoras, que, agora, com esta legislação quebra-greves, já vão poder continuar a fazer as suas vidas.

Que as coitadas das pessoas honestas e trabalhadoras podem continuar a ser roubadas e que os trabalhadores lutam por direitos – já não foi coisa que o secretário tenha dito.

A legislação passa a ter efeito em Inglaterra, País de Gales e Escócia.

Quando uma acção de luta promovida por um sindicato é considerada ilegal, o limite pelos «danos» que podiam ser imputados à estrutura sindical estava fixado em 250 mil libras; agora passou para um milhão de libras.

É outra das alterações promovidas pelo governo conservador, enquanto os media se entretêm com «prognósticos, apostas e pontos de interrogação» sobre Sunak e Truss.

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E o que é que Corbyn vai fazer? Terá espaço para avançar a solo? Quererá fazê-lo, rompendo com o Labour, partido onde está desde sempre? Ou quer apenas ser a voz da razão à esquerda manietado por forças internas do partido? Reduzir-se-á a uma espécie de Manuel Alegre a quem ninguém cala, denunciando os desvios ideológicos dos Trabalhistas, aqui e ali, em artigos que, então, até o Guardian quererá publicar em nome da pluralidade?

As sondagens mais recentes da Yougov revelam um apoio inegável da população às greves. «O apoio à greve está fortemente correlacionado com a contribuição percebida dos trabalhadores para a sociedade e se estes são mal pagos, mas não com a perturbação causada pela greve». A maioria apoia sem hesitações a greve dos enfermeiros, dos condutores de ambulância, dos bombeiros, dos professores e dos trabalhadores dos correios. Mas as opiniões dividem-se com os ferroviários, os trabalhadores do metro, os trabalhadores do handling de aeroporto, entre outros. Ainda assim, sempre em disputas cerradas entre aprovação e condenação, e mesmo com a bateria de comentariado mediático contra algumas dessas greves, nomeadamente na ferrovia. É consensual entre os inquiridos que todos estes trabalhadores são mal pagos ou têm salários abaixo do que deveriam receber.

A actual discussão sobre o Labour parece dizer-nos que a única saída política para a crise económica e social do Reino Unido é a vitória confortável e silenciosa de Keir Starmer. Se ela trai o movimento sindical nas ruas, se ela trai milhões de trabalhadores em luta, se ela trai os britânicos à espera de uma mudança de política face aos Conservadores – é já irrelevante: sabemos que trai.

Mas com uma população que apoia maioritariamente as greves e os protestos; que sente hoje, na pele, depois de todos os sacrifícios, e em todas as frentes dos serviços sociais e da economia, o resultado de mais de 13 anos de políticas de austeridade e de mais de 20 anos de privatização dos serviços públicos; uma população farta do status quo e pronta a mobilizar politicamente, sem uma organização que potencie essa luta contra a desigualdade, por direitos e pela justiça social – importa saber o que fará disto a esquerda britânica.

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