Nove meses de Governo e abundam os elementos para se começar a fazer um balanço. Hoje, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, foi à Assembleia da República para participar no debate quinzenal. O que pode ser uma oportunidade para questionar o líder do executivo, mais uma vez não aconteceu porque este tentou impor a sua narrativa, refugiou-se em futuros anúncios e deu voltas para nunca responder a perguntas.
À primeira oportunidade, Luís Montenegro procurou direccionar o foco do debate para o lateral, algo que ficou evidente na intervenção do líder da bancada parlamentar do PSD, Hugo Soares. De forma a afastar a discussão do central, o primeiro-ministro procurou acossar o PS, colando-o ao Chega.
Naturalmente que Pedro Nuno Santos, ao ter a palavra, usou a mesma táctica, colando o Chega ao Governo. Usando o fim da manifestação de interesse da lei de imigração, o líder do PS, querendo falar da questão, optou por ter uma abordagem utilitarista ao tópico. «Não vão ser deputados do Chega a trabalhar na construção civil. Quem é que o fará?», questionou o socialista.
Continuando a sua intervenção, o secretário-geral do PS escolheu um tema que também não é o melhor para o seu partido, dado o histórico do ex-governo. Querendo encostar o actual Governo às cordas, Pedro Nuno Santos questionou sobre qual o número de alunos sem professor a pelo menos uma disciplina neste momento e desde o início do ano lectivo.
Aqui, assim como em outros assuntos, a resposta do primeiro-ministro foi incerta, aparentando não dominar o tema. «Havendo dúvidas sobre os números de anos anteriores, para não gerar equívocos, o ministro da Educação decidiu fazer uma auditoria externa para ter o mesmo critério e fazer a comparação» e, mesmo não sabendo, disse ser «inequívoca a diminuição de alunos face ao ano anterior porque com o subsídio aos professores diminui».
No seguimento do debate, Hugo Soares, sabendo ler o papel que lhe chega com a orientação, fez o que lhe compete: impedir que haja uma discussão séria. Entre considerações de valor e pouco mais, o parlamentar social-democrata voltou a encostar o Chega ao PS, sem nunca dizer que o seu Governo negocia com ambos.
Hugo Soares, com a falta de fineza que lhe é característica, aproveitou ainda o momento para anunciar uma medida que irá solucionar os problemas do SNS. Segundo o mesmo, a bancada do PSD vai apresentar «uma iniciativa legislativa justa e equilibrada que pretende corrigir o acesso de imigrantes ao SNS de forma regrada e justa sempre que o país falhe a quem legitimamente precisa dele». Ao contrário do investimento na saúde pública e políticas que reforcem o serviço prestado, o PSD, seguiu o exemplo de outras bancadas, centrando o problema nos imigrantes, o bode expiatório necessário para encobrir a sangria de recursos em marcha para o negócio privado da doença.
Ao que parece, Hugo Soares teve que ser posteriormente desmentido pela assessoria de imprensa do seu partido que diz que afinal a proposta não será para limitar o «acesso de imigrantes» ao SNS como anunciou, mas sim sobre o acesso de estrangeiros em geral. Entende-se a confusão dada a reconhecida capacidade política do parlamentar social-democrata.
À direita, André Ventura parece ter-se lembrado agora do SNS, que até ao momento da aprovação do Orçamento do Estado nunca tinha sido um problema e procurou acusar o Governo de não ter ido tão longe na descida do IRC como era necessário, no sentido de agradar aos milionários do sistema.
Já a Iniciativa Liberal, com Rui Rocha, não acrescentou nada de novo, mais uma vez, recorrendo à velha cassete. «Estagnação socialista», «apatia social-democrata», ou «elevadíssima carga fiscal» foram novamente os chavões utilizados que começam a cansar por nada de novo acrescentar. Na resposta, Luís Montenegro pegou nas unidades de saúde familiar modelo C para descansar os liberais e ilustrar que este Governo está a governar no sentido de agradar os grandes grupos económicos.
À esquerda, Mariana Mortágua tentou confrontar o Governo com as Parcerias Público-Privadas, contestando a concessão sem concurso do terminal de Alcântara, e procurando saber as concessões em vigor. Mais uma vez, o primeiro-ministro disse que «para ser honesto» não sabia, mas reiterou que o sector portuário é um mercado competitivo onde o Governo quer que haja concorrência.
Nesta ronda de perguntas, destacou-se a pergunta do PCP realizada por Paulo Raimundo. O secretário-geral dos comunistas abordou as recentes declarações do secretário-geral
da NATO que sugeriu que parte do dinheiro público destinado à saúde e às pensões e reformas deve ser desviado para a indústria da guerra.
O primeiro-ministro prometeu o impossível: disse que não haverá cortes e que Portugal conseguirá manter os seus compromissos com a aliança atlântica, algo que por um lado demonstra que existe folga orçamental para responder às reivindicações dos vários sectores, mas que não o é em prol da guerra.
Paulo Raimundo ainda questionou o primeiro-ministro sobre a descida do IRC, procurando saber como é que tal vai beneficiar a economia, uma vez que já foi feito antes e só se verificou uma maior acumulação de lucros. Luís Montenegro respondeu a patranha neoliberal que nunca foi comprovada, alegando que a redução de impostos sobre as grandes empresas estimula o investimento, nunca dizendo que não existem dados que comprovem tal narrativa.
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