Na sequência das eleições legislativas de 6 de outubro, os deputados da Assembleia da República eleitos na ocasião iniciaram os trabalhos parlamentares. Tomou posse o 22.º Governo Constitucional. O Programa do Governo está apresentado e em plena execução.
Deste modo estão criadas todas as condições para o normal desenvolvimento de uma nova legislatura.
Importa agora perceber quais as opções políticas e as iniciativas legislativas que irão consubstanciar os compromissos enunciados pelos partidos, em período pré-eleitoral. Importa também estar atento às decisões políticas do Governo, tanto no quadro do Programa que apresentou à Assembleia da República, como no contexto de uma realidade dinâmica que está muito para além dos documentos formais, tantas vezes carregados de intenções que não passam disto mesmo.
A proteção de pessoas e bens constitui hoje uma exigência que se coloca a todos os Governos, face às múltiplas ameaças e riscos que se perfilam perante as populações, nas mais variadas zonas do mundo. Para garantia da segurança comunitária, enquanto valor civilizacional, a doutrina disponibiliza quadros de referencia identificados como dos domínios do security e do safety, o mesmo é dizer «segurança do património, segurança pessoal, a nível militar, ou até mesmo com a soberania/estabilidade nacional» e «saúde, integridade física, proteção de perigos, ou ausência de riscos provocados por condições inseguras», respetivamente.
Em Portugal o domínio do safety é assumido pelo Sistema Nacional de Proteção Civil (SNPC).
Nos termos definidos pela Lei de Bases da Proteção Civil, este sistema tem como objetivos de missão: prevenir riscos coletivos e a ocorrência de acidente grave ou de catástrofe deles resultante; atenuar os riscos coletivos e limitar os seus efeitos no caso das ocorrências descritas anteriormente; socorrer e assistir pessoas e outros seres vivos em perigo, proteger bens e valores culturais, ambientais e de elevado interesse público; apoiar a reposição da normalidade da vida das pessoas em áreas afetadas por acidente grave ou catástrofe.
«Voltando aos objetivos de ação do 22.º Governo, é urgente equacionar uma medida que tarda, ou seja, proceder a uma avaliação integrada da Lei de Bases da Proteção Civil e do modelo sistémico que desenha»
Não há confusão possível entre sistema e serviço, embora essa confusão seja muitas vezes refletida nas politicas governamentais e no ato legislativo em que estas se suportam. A constatação está expressa na alteração da orgânica da Autoridade Nacional de Proteção Civil, aprovada pelo anterior Governo na fase final do seu mandato. O referido diploma ignora a estrutura do sistema previsto na Lei de Bases, e consagra uma outra orgânica do serviço agora designado Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil.
Voltando aos objetivos de ação do 22.º Governo, é urgente equacionar uma medida que tarda, ou seja, proceder a uma avaliação integrada da Lei de Bases da Proteção Civil e do modelo sistémico que desenha. Para a viabilização deste «caderno de encargos» não deve ser apenas convocado o Governo, mas também, e em particular, a Assembleia da República, uma vez que a Lei de Bases constitui uma sua competência.
Para muitos esta medida não é prioritária. A acentuar esta perigosa conclusão, o relatório do Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, sobre os incêndios florestais ocorridos em Portugal entre 1 de janeiro e 16 de outubro deste ano, sublinha: «Comparando os valores do ano de 2019 com o histórico dos 10 anos anteriores, assinala-se que se registaram menos 46% de incêndios rurais e menos 70% de área ardida relativamente à média anual do período. O ano de 2019 apresenta, até ao dia 15 de outubro, o 2.º valor mais reduzido em número de incêndios, o 2.º valor mais reduzido de área ardida e a 1.ª vez que a redução de área ocorre em dois anos consecutivos, desde 2009».
Puro engano. A vulnerabilidade do nosso território e os riscos que lhe estão associados, impõem menos triunfalismo e mais atenção ao sistema.
Deste modo, alertam-se os senhores deputados e os senhores governantes para a urgência de colocarem a segurança dos portugueses na primeira linha das suas prioridades, não se deixando confundir com resultados de circunstância, sem bases estruturais que os sustentem.
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