|Pequenos e médios agricultores

Leite: se o trabalhador tudo produz, porque é que a ele nada pertence?

Estudo do Observatório de Preços assinala que, em 2022, os produtores de leite foram forçados a vender abaixo do preço de custo enquanto a indústria da transformação e distribuição amealhava lucros. CNA exige alteração da lei.

Manifestação foi convocada por várias associações e cooperativas agrícolas, para demonstrar «a revolta dos produtores face a mais uma descida do preço do leite»
CréditosJosé Coelho / Agência Lusa

Os custos de produção de leite, e a redução do consumo deste produto, foram fundamentais na quebra abrupta do número de productores neste sector: de 8 mil para 3388 em 10 anos (2012 a 2022). Para além da alimentação do gado, custo que disparou ao longo do último ano, mas também a saúde e reprodução animal, energia, mão-de-obra, manutenções e reparações, amortizações, provisões, rendas, entre outros factores que engrossam os custos.

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Quem suga a mais-valia do leite?

Apesar de assumir grande parte dos encargos e dos riscos, a produção fica apenas com 21% da mais-valia criada. A indústria fica com 31% e a distribuição com 48%.

Créditos / Agricultura e Mar

O Ministério da Agricultura inaugurou recentemente e com toda a pompa e circunstância o prometido Observatório de Preços Agroalimentares. Este Observatório deve ser enquadrado nas medidas habituais dos governos, destinadas a dar a ideia que se está a fazer alguma coisa não fazendo coisa alguma. Durante a apresentação do «dito cujo» foi divulgado um «Estudo sobre a cadeia de valor da fileira do Leite UHT». O estudo merece ser lido porque confirma o que já se sabia há muito. À semelhança do que acontece em outras fileiras, são os grandes grupos da transformação e da distribuição a sugarem a valia criada pelos produtores de leite, que são cada vez menos.

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Observatório de Preços não aprofunda trabalho do SIMA, nem resolve desequilíbrios

A CNA diz que o Observatório de Preços Agroalimentar confirma a necessidade de medidas de regulação do mercado e não aprofunda trabalho que era feito pelo Sistema de Informação de Mercados Agrícolas (SIMA).

Créditos / Euro Dicas

Ano e meio após ter sido anunciado pelo Ministério da Agricultura, o observatório de preços foi apresentado esta quarta-feira numa reunião da Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agro-Alimentar (PARCA). A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) valoriza a implementação deste mecanismo, nomeadamente a introdução dos dados relativos aos preços dos bens alimentares no consumidor, uma vez que, revela num comunicado, «expõem muitos dos problemas que a CNA tem vindo a denunciar sobre o funcionamento do mercado», designadamente as «diferenças brutais» entre o preço pago ao produtor e o preço pago pelo consumidor em situações como as dos produtos hortícolas. 

Regista, no entanto, não haver «qualquer aprofundamento» do trabalho que já era feito pelo SIMA. «A CNA espera que as insuficiências existentes na plataforma (ainda com dados em falta) sejam ultrapassadas e que os estudos previstos a nove fileiras sejam publicados brevemente de forma a colocar fim a uma zona nebulosa que existe em relação aos custos e proveitos dos diversos elos da cadeia alimentar», lê-se na nota.

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A PARCA reuniu-se, mas a «injustiça» na cadeia agro-alimentar continua

A denúncia a propósito da reunião da Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agroalimentar (PARCA), esta quarta-feira, partiu da Confederação Nacional da Agricultura, que exige preços justos.

Créditos / Euro Dicas

O Governo «continua a "empurrar com a barriga" a resolução de um problema gravíssimo que tem contribuído para o empobrecimento dos agricultores e dos consumidores, recusando-se a regular o mercado e a enfrentar o poder das grandes cadeias de distribuição e comercialização», critica a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) numa nota enviada ao AbrilAbril

A denúncia surge na sequência da reunião da PARCA, de que o primeiro-ministro aproveitou para falar no debate na Assembleia da República, para a qual a confederação foi munida de propostas «por preços justos aos produtores e preços acessíveis aos consumidores». Entre as medidas reclamadas está a redução do mercado e dos preços de produtos alimentares e factores de produção; criação e operacionalização de mecanismos de garantia de transparência, com a divulgação dos custos e proveitos de cada elo da cadeia, do produtor ao consumidor; adopção de uma lei que proíba as vendas com prejuízos ao longo de toda a cadeia do produtor ao consumidor e o controlo das importações desnecessárias. 

A estrutura salienta que o «problema não está do lado dos agricultores», recordando «argumentos esgrimidos em praça pública por alguns intervenientes na cadeia», que «vão sacudindo a água do seu capote para as costas dos agricultores», enquanto o Governo «parece alinhar nesta narrativa ao remeter parte da resolução do problema para reuniões a realizar com as confederações agrícolas». 

Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), entre Janeiro de 2021 e Dezembro de 2022, o índice de preços dos factores de produção na agricultura subiu 48,4% e o índice de preços ao produtor subiu 38,6%. «Nestes dois anos de escalada de preços, os produtores não fizeram repercutir nos preços à produção a totalidade do aumento dos custos de produção, serviram sim, inclusive, de almofada para conter a inflação dos bens alimentares», realça a CNA.

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CNA. Mais do que substituir titulares, agricultura precisa de outra política

A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) reage à mudança de nomes no Governo frisando a necessidade de reforçar o Ministério e garantir «outras e melhores» políticas. 

Créditos / Agronegócios

São muitos e agravados os problemas com que se depara o sector agro-florestal e o mundo rural, desde os custos de produção, que, critica a CNA num comunicado, continuam «altíssimos», ao desmantelamento do Ministério da Agricultura, com a passagem das direcções regionais de agricultura e pescas para as comissões de coordenação e desenvolvimento regional (CCDR). A estas queixas junta-se agora a aplicação do Plano Estratégico Nacional da Política Agrícola Comum (PEPAC), que no entender da Confederação comporta «mais exigências e penalizações para os pequenos agricultores».

Neste sentido, e perante a substituição do titular da pasta da Secretaria de Estado da Agricultura, a CNA defende que, mais do que mudanças de nomes, são necessárias mudanças nas políticas para o sector, marcado pela forte quebra de rendimento dos agricultores. 

«Está mais do que na altura de o Governo resolver os problemas que tanto afectam o sector agrícola, de forma a melhorar o rendimento dos agricultores, a aumentar a produção nacional, garantindo alimentos acessíveis à população e a soberania alimentar do País», realça.

No congresso realizado em Novembro passado, a CNA apresentou 12 medidas «urgentes e estruturais» para as exigências manifestadas, nomeadamente o combate aos elevados custos dos factores de produção, a plena concretização do estatuto da agricultura familiar e o combate à concentração da terra e à especulação em torno de usos não agrícolas. 

«A mudança de rostos deve ser, pois, entendida como uma oportunidade para mudar de política e não para, como afirmou o primeiro-ministro, insistir na mesma política», insiste a Confederação, que volta a apelar à integração das florestas e do desenvolvimento rural no Ministério da Agricultura, e que este seja «forte, operativo, com meios e recursos». 

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E não faltam elementos que comprovem a injustiça contestada pela Confederação. O rendimento da actividade agrícola em 2022, em termos reais, por unidade de trabalho ano (UTA), desceu 11,8%, indica o INE. O Eurostat revela que, em Portugal, por cada 100 euros que o consumidor paga pela sua comida, apenas 25 euros vão para o agricultor, que daqui suporta os elevados custos de produção. 

E aqui entra a questão central para a CNA. Como é que se explica que o rendimento dos agricultores baixe, os consumidores percam poder de compra, levando ao maior corte de sempre no consumo de bens alimentares, mas que os lucros da grande distribuição aumentem em valores superiores a 70% nestes dois anos de crise para a maioria dos cidadãos portugueses?

Esta quinta-feira, o grupo Jerónimo Martins, dono do Pingo Doce, anunciou que teve lucros de quase 600 milhões de euros em 2022, numa subida de 27,5% face ao ano anterior. «É por demais evidente que a balança pende mais para um lado do que para outro e por isso são necessárias medidas de facto eficazes para alterar a injustiça desta situação e que não passem pelos habituais cadernos de intenções, pois a experiência tem-nos mostrado que raramente funcionam», insiste a estrutura, que continua a reclamar preços justos aos produtores e acessíveis aos consumidores. 

A separação de funções, «não permitindo que o mesmo grupo económico possa operar ao longo de toda a cadeia alimentar, à semelhança do que acontece no sector da energia e transportes», é outra proposta que a CNA pretende ver implementada, tendo em conta que oito grandes grupos económicos dominam mais de 80% do comércio a retalho dos bens alimentares. «Para além da hegemonia e domínio que já detêm na distribuição e comercialização, vão monopolizando toda a cadeia com alguns a operarem já nas áreas da transformação e da produção», regista.

«Ao defender uma distribuição justa do valor ao longo da cadeia agro-alimentar, a CNA está a defender rendimentos dignos para os agricultores e alimentos acessíveis e de qualidade para os consumidores, a nossa economia e a soberania alimentar do país», explica a CNA, salientando que «essa tem de ser também uma preocupação central do Governo».

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Relativamente ao estudo sobre a cadeia de valor da fileira do leite, apresentado na reunião da PARCA, revela que, sob pena de ainda precisar de uma análise mais aprofundada, comprova terem existido vendas com prejuízo para os produtores, «numa parte do tempo analisado». 

A Confederação considera que, tendo sido anunciado para gerar maior transparência dentro da cadeia alimentar, o observatório «tem de servir de base à definição de políticas e medidas que conduzam a uma mais justa distribuição do valor dentro da cadeia alimentar», entendendo que, só por si, não resolverá o «grave problema de injustiça e de desequilíbrio existente no mercado alimentar e onde oito grupos económicos dominam 80% do comércio a retalho».

A estrutura reforça a exigência de medidas efectivas de regulação de mercado, que «produzam efeitos reais na distribuição do valor gerado nas várias fileiras» e impeçam «que se continuem a perpetuar injustiças» e insiste na necessidade de se implementar uma lei que proíba vendas com prejuízos ao longo de toda a cadeia e impeça o pagamento aos produtores abaixo dos seus custos de produção.

Com a brutal subida dos factores de produção, os produtores nacionais tiveram uma perda de rendimento de 11,7% em 2022 e as famílias viram o custo do seu cabaz alimentar aumentar exponencialmente, enquanto que as grandes empresas de distribuição e comércio a retalho apresentaram lucros recorde. Da análise apresentada na reunião da PARCA sobre o pacto para a estabilização de preços, a Confederação Nacional da Agricultura admite confirmar-se que as acções de fiscalização «não se têm sustentado numa lógica de custos e proveitos dos intervenientes e, consequentemente, na redução ou aumento das margens de lucro». Desta feita, diz ser «impossível aferir» que parte da redução do preço do cabaz alimentar em 10,14% se deve à redução do IVA e que parte se deve a outros factores, e quais são esses factores. 

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O setor leiteiro é uma indústria que abrange várias fases, desde a produção leiteira, o seu processamento ou transformação e finalmente, a sua distribuição da fábrica até ao retalho. Os produtores de leite estão na base de todo o processo. Investem na terra, no gado e na maquinaria (tratores, máquinas de ordenha, etc.) e asseguram todas as tarefas necessárias para a obtenção do leite. O valor gerado varia com a qualidade do produto, mas a sua realização concreta depende do preço recebido pela indústria dominada por um grande grupo (Lactogal), que, na prática, determina o preço em função do seu interesse. As empresas de transformação de laticínios transformam o leite cru num produto pronto para o consumo, agregando ao processo a produção de outros produtos lácteos. Finalmente, a distribuição representa o elo de ligação entre a indústria e os consumidores.

O «Estudo sobre a cadeia de valor da fileira do Leite UHT», usando dados de 2020 e 2021, elabora a estrutura de custos de cada um dos três setores da cadeia e calcula as respetivas margens de lucro. A vantagem destes estudos reside no caráter insuspeito das fontes, permitindo-nos usar os resultados sem sermos acusados de interpretações enviesadas face ao nosso posicionamento político e ideológico. O primeiro elemento que salta à vista nas conclusões deste estudo são as margens estreitíssimas com que a produção se vê submetida. Na verdade, e conforme o estudo indica, as margens chegam a ser negativas, muito embora o estudo não avance com detalhes sobre a extensão dos períodos e das regiões em que os produtores foram pagos abaixo dos custos de produção. Avançando com uma margem líquida média de 0,6 cêntimos por quilo de leite, o estudo diz que esta margem chegou a atingir um valor negativo de 2,6 cêntimos por quilo. Isto confirma, por um lado, que muitos produtores perderam dinheiro produzindo, e, por outro, que as margens foram em média, durante o período 2020-2021, quase nulas.

«O primeiro elemento que salta à vista nas conclusões deste estudo são as margens estreitíssimas com que a produção se vê submetida. Na verdade, e conforme o estudo indica, as margens chegam a ser negativas (...).»

Considerando uma produção média de 7 mil quilos de leite por animal e considerando uma exploração com um efetivo total de 100 vacas, isto significa que sobram apenas 4200 euros por ano, depois de deduzidos todos os custos de produção. Este número explica o desaparecimento de milhares de explorações e a concentração do efetivo nacional num número cada vez mais reduzido de mega explorações, algumas com mais de mil vacas.1

O segundo elemento principal que queremos destacar consiste na repartição da mais-valia ao longo da cadeia (ver Figura 1). Os números são eloquentes. Por cada quilo de leite a produção fica com uma margem líquida de 0,6 cêntimos, enquanto que as margens respetivas da transformação e da distribuição são, respetivamente, 0,9 e 1,4 cêntimos. Isto significa que, apesar de assumir grande parte dos encargos e dos riscos, a produção fica apenas com 21% da mais-valia criada, enquanto que a indústria fica com 31% e a distribuição com 48%. São factos que confirmam a profunda injustiça de um sistema que promove a polarização da riqueza e do rendimento nos grandes grupos económicos que por sua vez dominam o poder político perpetuando assim o esbulho que diariamente é feito a quem produz. Acabar com este sistema implica romper com as políticas que promoveram este modelo que está a levar à ruína milhares de pequenos agricultores contribuindo assim para a desertificação do mundo rural.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

  • 1.  Em 1999 existiam 32 994 explorações leiteiras. Em 2021 eram apenas 3388. Hoje serão menos ainda.
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Essas despesas, aliadas a uma prática de extorsão por parte da indústria transformadora do leite e dos grandes distribuidores, que reduzem constantemente os valores pagos pelo leite, tornam a sua produção insustentável.

«Apesar de assumir grande parte dos encargos e dos riscos, a produção fica apenas com 21% da mais-valia criada. A indústria fica com 31% e a distribuição com 48%», salienta o professor universitário Miguel Viegas, num artigo de opinião publicado no AbrilAbril.

Na prática, refere a Confederação Nacional de Agricultura (CNA), em comunicado, o que acontece é que, como os produtores não podem guardar os seus produtos (que são na sua maioria perecíveis) para tentar encontrar melhores preços, e porque não existem alternativas aos canais de escoamento (empresas) que dominam o mercado, «os agricultores são obrigados a vender a sua produção ao preço que os compradores tendem a lhes impor».

Lei tem de proteger os produtores contra a rapina das grandes empresas de distribuição

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Estatísticas confirmam décadas de políticas agrícolas desastrosas

A denúncia é da CNA, para quem as «Estatísticas Agrícolas» relativas ao ano de 2021/22, divulgadas pelo INE, confirmam os «efeitos desastrosos de décadas de más políticas agrícolas».

Agricultor em Torrão, Alcácer do Sal 
CréditosAntónio Cotrim / Agência Lusa

A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) chama a atenção, em comunicado enviado ao AbrilAbril, para os dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística, que confirmam uma «quebra acentuada no rendimento da actividade agrícola (-11,7%), em termos reais, face ao ano anterior, impulsionada pela diminuição do Valor Acrescentado Bruto (-8,7%) e pelo aumento dos custos de produção (+23,7%)».

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Proposta da Comissão Europeia sobre novos OGM «favorece a biopirataria»

A Coordenadora Europeia Via Campesina espera que Parlamento e Conselho Europeu chumbem proposta sobre organismos geneticamente modificados (OGM). É «inaceitável» e «favorece a biopirataria», denuncia.

Créditos / Rádio Campanário

Foi na passada quarta-feira que a Comissão Europeia apresentou uma iniciativa legislativa a fim de criar um novo quadro regulamentar para alguns OGM, mas que a Coordenadora Europeia Via Campesina (ECVC) entende como uma tentativa de «generalizar a biopirataria» e de privatizar «todas as sementes pelas empresas detentoras de patentes, em detrimento dos direitos dos agricultores» sobre as mesmas.

A organização, que representa os pequenos e médios agricultores europeus, exige que Bruxelas rejeite esta proposta «inaceitável». Em relação aos OGM resultantes de «novas técnicas genómicas», sublinha num comunicado, a Comissão Europeia «pretende suprimir a rastreabilidade dessas técnicas e eliminar os requisitos de rotulagem de alimentos derivados» desses organismos, ajudando as empresas de sementes a vender esses produtos «à grande maioria dos consumidores», que opta por não comprar OGM.

Adianta que, auxiliada por uma «verborreia pseudocientífica», a Comissão Europeia propõe regulamentos «tão complexos que são inviáveis». «Ao remover a obrigação de rastreabilidade, aniquila intencionalmente todos os meios de verificação da aplicação desses padrões», explica, acrescentando ainda que a Comissão «mostrou sua verdadeira face ao confiar nas declarações da indústria de sementes».

Segundo a mesma nota, «quando convém aos seus interesses», a indústria afirma que os seus OGM «são indistinguíveis de plantas derivadas de selecção tradicional não patenteável», já «quando não lhe convém», frisa, «usa todo um arsenal de técnicas para identificar os seus genes patenteados e qualquer potencial violação das suas patentes».

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Via Campesina. Lei do Restauro da Natureza deve garantir justiça social

A Lei do Restauro da Natureza deve concentrar-se em mudar o status quo e garantir justiça social, mas faltam-lhe meios adequados para atingir esse objectivo, critica Coordenadora Europeia da Via Campesina.

Créditos / Vida Rural

O movimento de pequenos e médios agricultores europeus apoia os objectivos do Pacto Verde Europeu, mas denuncia, através de comunicado, que «o status quo ferozmente mantido de impulsionamento da industrialização da agricultura e da destruição dos empregos» neste sector pioram as actuais crises.

O alerta prende-se com a Lei de Restauro da Natureza, que será votada a 27 de Junho no Parlamento Europeu, com o objectivo de reparar 30% dos ecossistemas danificados e reduzir em 50% o uso de pesticidas químicos na União Europeia até 2030. Reconhecendo a importância do restauro de ecossistemas, a Coordenadora Europeia da Via Campesina (CEVC) defende que esta é uma «falsa solução» e que a União Europeia devia abster-se de reservar áreas de terra e mar para conservação usando uma abordagem baseada em percentagem.

«É uma falsa solução que carece de compreensão holística e poderia facilitar a financeirização de organismos vivos», salienta, acrescentando que «essa visão ultrapassada, que procura englobar a chamada natureza "selvagem", provou ser ineficaz em 50 anos de investigação científica».

A CEVC, onde se integra a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), alerta para a importância de as políticas europeias serem «ambiciosas» de modo a garantirem «finalmente» uma «mudança real na União Europeia» e defende que a Lei de Restauro da Natureza deve concentrar-se em mudar o dito status quo e «garantir a justiça social para permitir uma transição justa».

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CNA critica «pressa do Governo» em desmantelar direcções regionais

Foi ontem publicado o diploma que reestrutura as CCDR e extingue as direcções regionais de Agricultura e Pescas. CNA diz que Governo fez «orelhas moucas» às preocupações dos agricultores.  

Créditos / Vida Rural

São muitas as críticas da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) à extinção das direcções regionais e integração de alguns serviços nas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR). Alteração quer, denuncia a CNA em comunicado, representa «mais um passo de uma má reforma, que, sob uma suposta égide de descentralização, compromete o desenvolvimento da agricultura e do País».

A estrutura regista a ambição do Governo, de ver o processo na Agricultura concluído em 60 dias, quando na Cultura, por exemplo, o prazo vai até 31 de Março de 2024. «Esta pressa é reveladora da falta de vontade política para o diálogo e confirma o processo de desmantelamento das DRAP [direcções regionais de Agricultura e Pescas], com fragilização evidente do próprio Ministério da Agricultura», constata. 

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Confederação Nacional da Agricultura «não passa cheques em branco» ao Governo

Ao longo das últimas semanas muito se tem falado num acordo entre o Governo e o sector da produção. A CNA não assinou o «Pacto para a Estabilização e Redução de Preços dos Bens Alimentares» por «ausência de um compromisso sério por parte do Governo».

Os agricultores concentraram-se no Largo do Rato, de onde partiram para a Assembleia da República, em Lisboa. 8 de Novembro de 2018
Créditos

De acordo com o comunicado da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), a «ausência de um compromisso sério por parte do Governo em afrontar o poder da grande distribuição» e ausência de respostas estruturais aos problemas da agricultura, são as razões que levaram à «quebra unilateral das negociações pelo Governo» das negociações em torno do Pacto para a Estabilização e Redução dos Bens Alimentares.

Para a CNA, foi o Governo, que, a meio do processo, arredou da mesa das negociações a mesma e os parceiros sociais da Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agroalimentar (PARCA). Objectivo, ao que parece e tudo indica, era fechar um acordo com apenas dois representantes dos sectores envolvidos - a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) e Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED).

A confederação que representa milhares de pequenos e médios agricultores, um tipo de agricultura que perfaz 90% das explorações agrícolas, houve sempre disponibilidade para negociar com o Ministério da Agricultura, tendo mesmo havido uma reunião ainda na passada semana e tendo sido apresentadas propostas relativas ao «funcionamento do mercado».

A CNA afirma que tinha propostas concretas para «a regulação do mercado, promover a justiça na distribuição de valor ao longo da cadeia agroalimentar, defender o rendimento dos agricultores e garantir uma alimentação acessível aos consumidores, medidas que temos reafirmado e tornado públicas» e que da parte do Governo não houve abertura para propostas que colocassem em causa os interesses de quem se tem aproveitado da inflação, ou seja, a grande distribuição.

Já não bastando o Governo ter forçado o fecho de um acordo apenas com a CAP e APED, a CNA considera ainda que houve uma desconsideração pelos organismos oficialmente constituídos como é o caso da PARCA, uma vez que ao criar uma comissão de acompanhamento para um acordo onde se refere os preços dos produtos, esta não está incluída. 

A CNA termina o seu comunicado reafirmando o seu compromisso para continuar a lutar por «medidas justas que possam reduzir o esforço financeiro das famílias com a sua alimentação, com preços justos em toda a fileira, de forma permanente e não por apenas seis meses».

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Segundo a CNA, fica claro que «não era verdade» que um dos vice-presidentes das CCDR teria de ser da área agrícola. Por outro lado, salienta, «é referida a manutenção das unidades orgânicas regionais, mas não está garantida a manutenção dos núcleos de atendimento das actuais DRAP (só no Centro são cerca de 70), pondo em causa os serviços de proximidade junto dos agricultores». 

Ao mesmo tempo, denuncia que «não está garantido que os actuais funcionários das DRAP não sejam desviados para a realização de outras tarefas», daí resultando «prejuízos evidentes para os serviços prestados à agricultura». 

«A forma prevista para a elaboração dos contratos-programa que irão reger a actuação das CCDR em matéria de política pública deixa antever um papel muito pouco relevante para a área da agricultura, defende a Confederação, alertando ainda para o acentuar da «clivagem» entre a definição de políticas agrícolas e políticas florestais. A CNA regista que esta é uma realidade «muito presente» na organização e actuação do actual Governo, com impactos «bastante negativos» no desenvolvimento rural. Neste sentido, insiste na necessidade de um Ministério «forte e único» para a Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, capaz de articular devidamente as políticas agrícolas, florestais e de desenvolvimento rural mais adequadas, «potenciando o contributo da agricultura para a coesão económica e social dos territórios». 

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Reconhece que a lei aborda «importantes elementos-chave», como a necessidade de mais empregos relacionados com a agricultura e as áreas rurais, mas «não contém meios adequados para atingir esse objectivo». Se o conteúdo «permanecer limitado e impreciso», salienta, não só prejudicará a preservação dos ambientes naturais, como vai colocar em risco a própria existência dos camponeses, especialmente dos que praticam a agroecologia.

O movimento de agricultores diz ainda que a lei «é vaga» sobre como irá apoiar o sector agrícola, em especial a Agricultura Familiar, e «não inclui propostas sobre como lidar com o grande agronegócio, nem com as novas tecnologias caras e poluentes que aumentam a dependência de combustíveis fósseis e de materiais raros».  

Defende que o modelo agrícola europeu «pode evoluir preservando o ambiente», mas que é preciso traçar o caminho para uma transição agrícola no sentido de maior sustentabilidade social e ambiental, que responda às crises climáticas, devendo também permitir «a entrada de um grande número de novos agricultores no sector e em todo o continente e promover abordagens territoriais colectivas». Ou seja, mais agricultores familiares com rendimentos mais justos são, segundo a Via Campesina, a chave para a biodiversidade. 

A CECV rejeita as pressões da indústria com vista à adopção de «soluções falsas», como os novos organismos geneticamente modificados (OGM), pesticidas e digitalização, «que servirão apenas para exacerbar os problemas actuais». Defende que os termos da actual Política Agrícola Comum (PAC) e as políticas comerciais europeias «estão cada vez mais voltadas para o livre comércio, o que significa que as condições não estão maduras para uma transição agroecológica e os agricultores não são suficientemente apoiados para se adaptarem». Nesse sentido, frisa, «não basta simplesmente solicitar "características paisagísticas de alta diversidade em terras agrícolas"».

A Via Campesina insiste que, apesar de ter como objectivo apoiar a vida selvagem (principalmente polinizadores e aves das terras agrícolas) e os ecossistemas (sobretudo turfeiras), a proposta «não inclui medidas para proteger a Agricultura Familiar e não faz nada para impedir a industrialização da agricultura», salientando que «não se pode combater um sintoma sem abordar as suas causas profundas».

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A Via Campesina, de que faz parte a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), alerta que, com esta proposta, a indústria poderá declarar, «sem medo de ser inspeccionada», que as suas sementes obtidas através de «"novas técnicas genómicas" não são resultado dessas técnicas» e os consumidores «perderão o direito à informação sobre o que comem, bem como o direito de escolher alimentos livres de transgénicos».

Admite que, ao proibir os Estados-membros de impedirem o cultivo destes OGM nos seus territórios, a Comissão Europeia retira aos agricultores o direito de proteger os seus campos da contaminação genética e de cultivar culturas sem OGM. «Os riscos para a saúde, para o meio ambiente e para a agricultura gerados por qualquer manipulação genética artificial deixarão de ser avaliados: agricultores, biodiversidade e consumidores serão cobaias de laboratório», lê-se na nota.

Por outro lado, alerta que a perda da rastreabilidade dos novos OGM e, consequentemente, das patentes dos seus genes, permitirá que as empresas detentoras dessas patentes confisquem todas as sementes disponíveis, «ampliando o alcance dessas patentes aos genes existentes na natureza e a sementes camponesas e tradicionais». A Via Campesina denuncia ainda que a Comissão Europeia nunca avaliou os impactos desta «desregulamentação na lei europeia de patentes e, portanto, nos direitos dos agricultores às sementes e, especialmente, ao sector agrícola livre de OGM, incluindo a agricultura biológica. 

Os pequenos e médios agricultores europeus assumem que, com esta iniciativa, a agricultura camponesa e biológica livre de transgénicos estaria «condenada a desaparecer», apesar da «crescente procura dos consumidores e das inúmeras promessas eleitorais para apoiar seu desenvolvimento», ao mesmo tempo que todo o abastecimento de alimentos ficaria «sob o controle de quatro ou cinco grandes empresas multinacionais de sementes». 

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«Tudo o que os agricultores precisam para produzir ficou muito mais caro», lamenta a CNA: «as notícias são péssimas para os agricultores, sobretudo os pequenos e médios que têm sentido de forma brutal os aumentos dos custos de produção, sem reflexos compensatórios no preço a que vendem a sua produção».

A CNA alerta para os níveis, cada vez maiores, de dependência de Portugal do exterior para alimentar a população, nomeadamente em cereais (80%), para além do «défice da balança comercial dos produtos agrícolas e agro-alimentares se ter agravado em 1.374,5 milhões de euros e atingido o valor mais elevado deste século, -5 222,8 milhões de euros».

Trata-se, segundo a CNA, de uma situação grave do sector, que tem «condenado milhares de agricultores, sobretudo a agricultura familiar, ao empobrecimento e ao desaparecimento», cuja génese assenta «em décadas de más políticas agrícolas».

A CNA, ao mesmo tempo que denuncia a situação de pobreza daqueles que produzem a comida da população, renova a urgência de se inverter a política de «apoio às grandes empresas do agro-negócio que produzem para exportar e de colocar no mercado externo a salvação para as carências do país».

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«A actual legislação (Decreto-Lei n.º 166/2013), no que respeita às vendas com prejuízo, não protege os agricultores, é muito insuficiente e até perversa, deixando os produtores de alimentos à mercê do crescente domínio e abuso dos elos mais fortes na cadeia agroalimentar».

Face à realidade vivida no sector, a CNA defende a necessidade de «inverter o processo de formação de preço, que até agora se faz da distribuição para a produção, deixando migalhas para os agricultores».

É preciso «uma lei justa», que inverta o ónus da definição do preço, directamente a partir da produção, «e que as operações de compra e venda tenham em conta os custos de cada elo, colocando sobre o comprador a responsabilidade de pagar ao elo imediatamente anterior – e em particular ao agricultor – um preço superior aos custos de produção».

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